O mercado de ativos digitais na Europa tem sido caracterizado por uma regulação não harmonizada entre países e essencialmente focada em matérias relativas à prevenção do branqueamento de capitais e financiamento ao terrorismo – Portugal não tem sido exceção.

Porém, o ano passado a Comissão Europeia criou o MiCA (Markets in Crypto-Assets), que visa estabelecer um ambiente regulatório único e abrangente na União Europeia para a atividade de ativos digitais, com foco na transparência, proteção dos clientes e estabilidade financeira.

Na prática, através do MiCA, os operadores do setor de ativos digitais com atividade na União Europeia passarão a ter de adotar standards de funcionamento elevados, equiparados aos do sector financeiro. Tais standards incluem, em acréscimo ao combate ao branqueamento de capitais, temáticas de governo, conduta de mercado, segregação de ativos de clientes, subcontratação, conflito de interesses e gestão de risco, entre outras.

O MiCA será de implementação obrigatória em todos os países da União Europeia até final de 2024 e deverá ter um efeito disruptivo, redefinindo o mercado de ativos digitais nesta zona geográfica, quer do lado dos operadores, quer do lado dos clientes, incorporando níveis adequados de integridade do mercado e dos seus participantes.

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Por um lado, antecipa-se que um número elevado de operadores não tenha condições de acomodar o esforço e custo regulatório requerido para a introdução e manutenção do MiCA, tendo por isso de abandonar o mercado. Por outro lado, um setor mais robusto, assente numa regulação ampla, fará atrair novos clientes, incluindo individuais, de perfil bancário, com vontade de alargar o leque de investimentos aos ativos digitais, mas que, até à data, não o fizeram por não sentirem segurança para tal.

Os resultados da implementação em Portugal do MiCA serão em linha com o que se perspetiva para o resto da Europa, com a saída de operadores menos estruturados e a consolidação de um mercado de players que privilegiam uma regulação ampla, tornando assim o mercado de ativos digitais em Portugal mais seguro, resiliente e atrativo.

O legislador e os reguladores locais, neste último caso o Banco de Portugal e a CMVM (Comissão de Mercado de Valores Mobiliários), têm vindo a liderar a transposição e operacionalização prática do MiCA para a esfera nacional. Em complemento ao MiCA, está já em vigor em Portugal desde 2021, reforçado no início de 2023 por orientações específicas, o enquadramento em matérias de branqueamento de capitais, alinhado pelas melhores práticas mundiais, bem como em matérias fiscais, com a aplicação de uma taxa de 28% sobre as mais-valias em ativos digitais efetuadas no espaço de um ano.

O enquadramento regulamentar e fiscal apropriado em Portugal, em conjunto com o ambiente acolhedor para inovação e tecnologia, incluindo em projetos de blockchain, assim como a preocupação com o reforço contínuo dos níveis de literacia nestas matérias, permite ter confiança no desenvolvimento e consolidação do setor de ativos digitais em Portugal, de forma a assegurar um elevado grau de adoção destes ativos e da tecnologia sobre a qual os mesmos operam.