“Portugal condenado pela União Europeia por atraso”….no pagamento disto, na transposição daquilo, na aplicação daqueloutro. São notícias e notícias com este lead.

Mas há ainda as outras como “Portugal condenado” por violação da liberdade de expressão, ou pela situação das prisões em termos de direitos humanos.

Do oito aos 80 onde pode estar escondida muita corrupção.

Corrupção pelas corporações que ganham milhões devido ao atraso na transposição desta ou daquela norma (ao fim e ao cabo a atualização daquela vírgula do século passado, corrupção na contratação de grandes sociedades que fazem as leis à medida dos seus clientes, atuais e futuros…).

Enfim, podemos sempre imaginar tudo, ou ainda, simplesmente, levar-nos a recuperar a frase de César relativamente à sua mulher. O ser e o parecer ser!

Já que é preciso parecer que se faz, então anunciemos medidas num curto prazo de tempo, bombásticas, transversais, fantásticas, inovadoras, daquelas em que não se percebe como ainda ninguém pensou!

E, assim, façamo-lo, como qualquer Aladino, sem ouvir ninguém, sem dialogar, sem perceber a realidade. Do cimo da nossa torre, seja a do castelo ou a de marfim: sempre no isolamento total, sem contactar com quem se governa, ou aqueles para quem se governa e proclame-se, de ciência feita, uma medida, qual “bala de prata”, que resolverá todos os problemas.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Vem tudo isto a propósito daquela Portaria 185/2024/1 que a Senhora Ministra da Justiça, no dia 14 de agosto deste ano decidiu publicar uma portaria (uma declaração) urbi et orbi!

Só que esta é objetivamente impraticável e é suficientemente ambígua para iniciar um conflito que certamente dará muito trabalho, nomeadamente de “fiscalização” da administração. Mesmo a quem a não integra por definição e lei.

Aparentemente terá bastado um mês para explicar isso à Senhora Ministra. Depois da inquietação, sobressalto e perguntas de alguns eleitos não executivos dos Municípios, a que a Associação Nacional de Assembleias Municipais (ANAM), a Associação Nacional de Freguesias (ANAFRE) e Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) deram voz, foi há dias publicada uma alteração daquela Portaria, relativamente à sua entrada em vigor, que passou dos 30 dias para 180 dias. O que era tão urgente, que impedira de ouvir e de escutar previamente, ir-se-á agora arrastar por seis meses.

E bem.

Não é bonito mudar as regras a meio do jogo, iludir regras conhecidas e cumpridas de há muito como as previstas para o mesmo fim no Estatuto dos Eleitos Locais, alterando de supetão quadros normativos estabelecidos com a Democracia e desde então apropriados e cumpridos.

Alertamos para a dificuldade de encontrar cidadãos interessados na vida pública tal a parafernália de leis, portarias e despachos que é preciso cumprir. Teríamos preferido respeitar princípios e valores, mesmo através de declarações de compromisso individual aquando da posse para as funções eletivas e executivas.

Com regras excessivas, com mecanismos de permanente exposição, só restará mesmo um dia entregar ao privado o restante do que é público.

Ora, a nosso ver porque já existe lei objetiva e subjetiva bastante, esta forma de legislar indicia um profundo desrespeito pelos eleitos locais, além de lançar sobre todos, sem exceção, o labéu ignominioso de agente de corrupção, abrindo pasto para o populismo.

A ANAM está de consciência tranquila. Protocolou e fez trabalho com entidades reconhecidas como a Transparência Internacional ou o Observatório de Economia e Gestão de Fraude (OBGEF). Publicou, em conjunto com a Associação dos Trabalhadores da Administração Local (ATAM), dois guias acerca do Mecanismo Nacional Anticorrupção (MENAC), prefaciados por Joana Marques Vidal e Elisa Ferreira. Disponibilizou-se, sem resposta, junto da Senhora Ministra para dar a sua contribuição nesta discussão.

Fica assim justificada a ponderação de ficarmos, como diz o nosso Povo, na certeza de nem tanto ao mar nem tanto à terra, e fica também justificada a razão de ser fundadora da ANAM – dar a perspetiva dos parlamentos locais, uma visão próxima da realidade e com o saber alargado e não de casta!

A realidade é sempre mais complexa!