A educação é um dos pilares mais importantes do Estado Social, aquele onde se suportam os mecanismos que procuram dar a todos os cidadãos as ferramentas necessárias para a busca, em liberdade, da realização pessoal e profissional, reduzindo ao mínimo possível o peso do contexto em que nasceram. Por outro lado, tem sido também, pelo menos nos últimos anos em Portugal, um dos sectores mais conservadores da Administração Pública, onde qualquer vislumbre de reforma estrutural provoca reacções pavlovianas de forma generalizada, conduzindo geralmente à inacção dos governantes por receio das mesmas, quando não é simplesmente por falta de ideias.
Será este um dos motivos pelos quais se sente que, apesar de ter tido um grande desempenho até meados da década passada, a educação em Portugal vive hoje um período de crise, com o qual os anteriores governos socialistas lidaram de forma incompetente, tendo até, em muitos casos, piorado a situação. Em 2024, temos ainda em Portugal escolas sem condições dignas, alunos sem aulas a várias disciplinas durante demasiado tempo, uma carreira docente que não é atractiva, e uma tendência de queda dos resultados dos nossos alunos nas avaliações internacionais.
Mas eis que, finalmente, se vislumbra neste país um Ministério da Educação aparentemente reformista, que expressa vontade de resolver os problemas, sejam os mais urgentes, sejam os de longo prazo, para os quais é preciso coragem, visão e arrojo. A geometria parlamentar não é favorável à concretização de grandes reformas, mas as ideias existem e têm pendor liberal, baseando-se no que de melhor se faz na Europa, e vão sendo apresentadas sem receios nem calculismos, o que é de congratular. No entanto, para conseguir implementá-las, a equipa da 24 de Julho precisará do maior apoio possível na Assembleia da República, esperando-se que os parlamentares liberais contribuam para que as anunciadas reformas, e outras que sigam a mesma orientação, avancem e sejam efectivamente aplicadas e bem sucedidas.
A Iniciativa Liberal ainda não governa, mas acredito que procurará, sempre que possível e com a proactividade que dela se espera, contribuir para liberalizar Portugal e, neste caso, liberalizar e reformar o nosso sistema educativo. A descentralização dos processos e o reforço real da autonomia das escolas, com os devidos mecanismos de prestação de contas, nomeadamente no processo de contratação e valorização dos professores, são eixos fundamentais da proposta liberal para a educação e são ideias às quais o ministro Fernando Alexandre já mostrou bastante abertura.
Em relação a este particular, os receios que logo se levantam sobre o poder que é dado aos directores das escolas podem ser mitigados dando mais poder a um conselho geral que, representando toda a comunidade escolar e local, acompanhe e escrutine a direcção da escola ou agrupamento, garantindo que o melhor para os alunos estará sempre em primeiro lugar.
A consideração das creches como parte integrante do sistema educativo, e não como um mero apoio social às famílias, é também um avanço, indo ao encontro das conclusões do Nobel James Heckman, que nos indicam que quanto mais cedo for feito o investimento educativo nas crianças, principalmente nas provenientes de contextos mais desfavorecidos, maior será o retorno futuro.
Também o regresso às avaliações nacionais nos finais dos ciclos lectivos, a intenção de promover uma cultura de dados que permita uma contínua avaliação do desempenho do nosso sistema educativo e a possibilidade de intervir com maior conhecimento de causa ou o fundamental e tão aguardado plano de recuperação de aprendizagens são, todas, medidas no sentido certo.
Posto isto, este não é um governo liberal. E se nos temas supra referidos há uma sintonia com a Iniciativa Liberal, poderá haver, no momento da concretização no terreno, lentidão ou hesitações em avançar, situações em que um empurrão político dos liberais pode fazer a diferença. Por outro lado, haverá sempre novos caminhos a trilhar que levem mais além, com ainda mais ambição, a transformação do sistema educativo português. Portanto, os liberais não deverão isentar-se de os expor e propor ao Governo.
A liberdade de escolha precisa de ser efectiva para todas as famílias e não apenas para quem pode pagar a escola que quiser, ou para quem pode viver nas zonas servidas pelas melhores escolas públicas. O sistema actual trouxe-nos à segregação sócio-económica que o próprio Secretário de Estado Alexandre Homem Cristo demonstrou existir, num estudo da SEDES de 2021, dentro do conjunto das escolas públicas dos grandes centros urbanos. E é neste cenário que se verifica uma cada vez maior procura pelo ensino privado por parte das famílias portuguesas e uma cada vez maior disparidade de resultados entre escolas privadas e escolas públicas.
É preciso trazer mais competitividade às escolas públicas, inserindo-as num ambiente concorrencial saudável e assente em regras claras e iguais para todas as que nele participem, aberto a prestadores privados, sociais e cooperativos, em que o financiamento acompanha o aluno e não a escola. Tentando aqui desfazer alguns mitos: adoptando sistemas de livre escolha bem desenhados, com as precauções devidas e regras claras; com mais autonomia, acompanhada dos devidos mecanismos de prestação de contas e responsabilização, não permitindo às escolas a selecção dos seus alunos; e com financiamento reforçado para alunos com necessidades educativas especiais ou com acção social escolar – a evidência empírica disponível aponta não só para melhorias dos resultados dos alunos em geral, mas acima de tudo dos alunos mais desfavorecidos. O estatuto sócio-económico dos colegas é um factor determinante no sucesso académico dos alunos, pelo que um sistema que potencie o acesso dos alunos mais desfavorecidos às escolas que escolherem, baseados em informação esclarecedora sobre a oferta disponível, resultará numa distribuição mais equilibrada e menos segregada dos alunos e numa melhoria generalizada da qualidade das escolas e dos resultados escolares. Seria assim possível dar a todos o acesso a uma maior e mais plural oferta pedagógica, com mais qualidade, tornando o nosso sistema educativo em geral mais equitativo, mais inovador e virado para o futuro.
Em tudo isto, a Iniciativa Liberal deve marcar a posição, estar do lado da solução e fazer a pressão necessária para que as reformas não fiquem a meio do caminho. Com um Governo manifestamente aberto às ideias liberais para a educação, temos uma oportunidade única para ver aplicadas as soluções que o sector precisa para que os nossos alunos consigam voar mais alto e voltar à tendência crescente dos resultados que se viu até 2015, ambicionando até os lugares de topo a nível internacional.