Fomos surpreendidos com a medida implícita no programa do governo para 2020 que pretende terminar com as reprovações de alunos ate ao fim do ensino básico. Estima-se que esta medida irá poupar aos cofres do estado cerca de 250 milhões de euros, visto que é estimado que cada um dos 50 mil alunos que, em média, reprova todos os anos, custe cerca de 5 mil euros ao estado. Mas, quanto custará esta medida no futuro?

Numa primeira instância, é custoso perceber que as decisões que regem o programa de governo versam sobre a actualidade, mais do que o futuro. Esta medida em concreto só pode existir num programa que verse o presente financeiro do país e não a visão de futuro que deveria pautar a todos os que governam.

Esta medida irá ter fortes repercussões nas vidas dos agora estudantes, bem como na vida do nosso país num futuro a médio prazo.

Por um lado, os estudantes são empurrados para o fim do ensino básico sem o critério basilar do ensino: o prevalecer do mérito em oposição ao facilitismo desgovernado e à comparação de todos de olhos fechados. Não estou com isto a defender o método de ensino geral que, muitas das vezes, não permite distinguir, também ele, o mérito individual. No entanto, estará mais perto disso do que a proposta em causa.

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Por outro lado, ao terminar a ideia de reprovação no final do ano, termina, também, a percepção implícita de que um determinado nível de trabalho e de critério é necessário para poder avançar na escada do ensino. Esta medida é um assumir a escola como parte obrigatória da vida e todos bem sabemos o que sentimos ao ser obrigados a alguma coisa. Não é por ser obrigatória ou não, mas o dever de cumprir e atingir objectivos é fulcral na obtenção de metas e na motivação de quem trabalha e quando me permitem trabalhar para obter, o obrigatório esbate-se na minha dedicação. Assim, iremos premiar os medíocres e dificultar o crescimento dos aplicados. Desengane-se quem acha que, de forma natural, quem é bom continuará a sê-lo e quem é mau terá incentivo. Várias desigualdades de aprendizagem vão ser criadas pois passarão todos, independentemente da sua postura, evolução, conhecimento, trabalho, mérito.

No entanto, esta medida não termina com o insucesso escolar, apenas o esconde. É um sacudir do problema para debaixo do tapete, mas ele irá aparecer mais à frente. Mais, isto só mostra que quem gere o ensino em Portugal acha o sucesso escolar é medido pelo reprovar ou passar de ano, o que é falso. Sucesso escolar é aprender e saber utilizar as aprendizagens. Passar por passar irá ficar caro no mercado de trabalho e no contributo activo de cada indivíduo para a sociedade onde se insere. Uma vez mais, a escola não significa tudo e claro que todos são aptos a dar o seu contributo na comunidade e a acrescentar valor à mesma. Mas, como referem todos os indicadores, a formação está na base das sociedades evoluídas e diferenciadas, gerando mais emprego e desenvolvimento. O fim das reprovações, ao colocar em causa a motivação central da aprendizagem obrigatória, coloca em causa a percepção de importância do desenvolvimento pessoal e do enriquecimento do conhecimento. Mas acrescento mais dúvidas quanto à visão da sociedade no futuro. Como será encarado por quem emprega estas pessoas que passaram administrativamente? Haverá suficientes pessoas formadas para as necessidades do país? Não estaremos a criar mais pessoas não universitárias, quando o objectivo era aumentá-las? Qual o valor que iremos todos pagar enquanto sociedade pela perda de qualidade de quem formamos?

Não, não é suposto que as crianças sejam condicionadas na sua aprendizagem onde lhes é exigido que deixem de ser crianças para apenas se focarem nas notas escolares como prova de inteligência. Não, de todo! Não é suposto que as notas finais sejam os únicos critérios de avaliação da prestação de um aluno que ao longo do ano trabalhou, vendo a sua prestação reduzida para o resultado de duas ou três provas. Não. Não é esperado que todos sejam Einsteins ou Hawkins pois é na diferença e na sua promoção que residem muitas das aprendizagens essenciais. O problema é que poderíamos ter mais Einsteins ou Hawkins e podemos estar a travar-lhes a motivação para o serem.

No entanto, da mesma forma que não é bom para a percepção de esforço do aluno que a matéria que lhe é leccionada lhe seja muito fácil, pedindo aqui a elasticidade possível dos professores para as diferentes fases de aprendizagem de cada aluno, não pode então ser suposto que um aluno, apenas por o ser, veja o objectivo de um ano de aprendizagem e trabalho ser alcançado no início do ano com uma passagem de ano por decreto. Passar de ano é o objectivo de cada aluno, ponto. É, se tudo estiver certo, o condicionamento que o faz querer aprender, dedicar-se, desenvolver-se, estudar e demonstrar o que vai interiorizando da forma como o professor achar mais adequada.

Por isto, é importante não permitir que as reprovações terminem de forma a possibilitar a manutenção do incentivo à aprendizagem e ao desenvolvimento dos indivíduos, tão essencial a um mundo mais desenvolvido com pessoas mais preparadas.