Estas fotografias têm quase duzentos anos. Já muito foi dito sobre quem as produziu: uma das mais famosas pioneiras fotógrafas inglesas, Julia Margaret Cameron, (1815-1879), tia-avó de Virginia Woolf e de Vanessa Bell, uma auto-didacta, que descobriu tarde a sua vocação. Aos 48 recebeu de presente a sua primeira máquina fotográfica, tinha já onze filhos (cinco dos quais adoptados), estas circunstâncias não a impediram de nos deixar uma vasta centena de retratos vintage que podem ser visto na National Portrait Gallery, a qual por estes dias lhe dedica uma exposição intitulada  “Portraits to Dream In”.

Percorro as salas de National Portrait recentemente remodeladas, fascinada e numa ânsia de tentar perscrutar estes rostos, existências, almas.

Comento com uma amiga que veio de Portugal e me acompanha ao lado: não achas que  estas pessoas sabiam muito mais o que era a existência do que nós hoje sabemos? Ela concorda.

A vida era um assunto sério. Pode haver aqui encenação, mas não há artifício, fingimentos, um esforço para se ser outro. A vida seria mais dura? Com certeza. Sorrisos para a câmara não se faziam.

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Os retratos são íntimos, alguns mesmo sentimentais, tendo ela alcançado retratos vívidos e psicologicamente ricos que são atemporais.

No centro está sempre um rosto, que a fotógrafa conhece há anos, os fotografados são seus familiares ou amigos e ela vai experimentando olhares diferentes sobre eles.

Apesar de ser uma mulher que empunha a câmara e que notoriamente prefere o mundo das mulheres e das crianças ao dos homens, aqui numericamente menos retratados, as suas mulheres têm feições curiosamente pouco femininas, angulares, a roçar o andrógino.

A lente de Julia Margaret Cameron devolve-nos o mundo vitoriano e representa na área fotográfica o que  foi a estética pré-rafaelita, tendo ela própria sido uma musa dos pintores pré-rafaelitas. Mas as suas fotografias são muito melhores do que as pinturas pré-rafaelitas.

Efusiva e excêntrica associada a Carlyle, Herschel, Ruskin, Rossetti e Tennyson, Julia Margaret Cameron foi reconhecida em vida, ganhando a admiração dos seus mais eminentes contemporâneos. Caracteristicamente vitoriana no seu intenso idealismo, Cameron procurou retratar as emoções mais nobres, as figuras mitológicas e os heróis da antiguidade greco-romana que mais a impressionavam.

Como o título da exposição indica, Portraits to Dream In”, estes retratos não servem apenas para serem vistos, mas para nos perdermos nas suas profundezas, e para deles emergirmos com novas perceções e cintilações de mundos que se apagaram. Esta exposição oferece um refúgio, um singular momento para sonhar.