O país encantou-se com a ideia da Linha de Alta Velocidade. Mas como em quase todas as grandes obras públicas feitas nos últimos anos em Portugal, no meio destas megalomanias ficam esquecidos os milhares de cidadãos que só pedem serviços mínimos previsíveis e confiáveis.
Disse-nos o ex-ministro das infraestruturas e agora candidato a primeiro-ministro Pedro Nuno Santos que o investimento na Linha de Alta Velocidade – que apesar de ter início apenas em 2024, já custou aos Portugueses mais de 3M€ em estudos – vai permitir fazer o trajecto entre Porto – Lisboa em cerca de 1 hora e 15 minutos. O que seria uma agradável notícia, caso não fosse a degradação crescente dos serviços ferroviários, vulgo a CP. Vejamos então:
Segundo o relatório da Autoridade da Mobilidade e dos Transportes, em 2022 o número de comboios urbanos suprimidos em Lisboa mais do que duplicou face a 2021, agravando-se também a pontualidade em praticamente todos os serviços entre 2019 a 2022. Só nos primeiros sete meses de 2023, os trabalhadores da CP usaram do direito à greve por 111 vezes (em média, 16 greves por mês), o que resultou em trinta e um mil comboios suprimidos (em média 148 por dia) e vinte e quatro mil atrasados ( em média 115 por dia).
Não será preciso ir muito mais além para compreender o gravíssimo problema que Portugal enfrenta na oferta pública de transporte ferroviário. A linha férrea é um serviço do qual dependem e confiam dezenas de milhar de portugueses para cumprir os seus horários de trabalho, dar prossecução aos seus estudos, ou simplesmente para dar um passeio ao fim de semana – um serviço que tem como único propósito a garantia de transporte seguro, fiável e económico mas que nem isso tem conseguido assegurar.
Mas o facto impressionantemente caricato é que em 2022 a CP teve “lucros” pela primeira vez na sua história! Esse lucro, apesar de proveniente da intervenção directa do Estado, através do pagamento de uma compensação devida, ao abrigo do seu contrato de serviço público, poderia eventualmente resultar numa melhoria expressiva da sua oferta e dos seus serviços. A verdade é que, como vimos, o ano de 2023 foi, provavelmente, o pior ano de sempre nos serviços da CP, com sucessivas greves, supressões e deficiências no serviço. Esse “lucro” serviu apenas a
Pedro Nuno, que pode encontrar mais um elemento para acrescentar à narrativa do governo: está tudo bem, apesar de nada estar bem.
Há duas reflexões que devemos retirar deste problema:
O primeiro será sobre a gestão pública da linha férrea, nomeadamente no que toca ao serviço de transporte de passageiros, que precisa urgentemente de um amplo debate e de uma reestruturação profunda desde a sua base. O modus operandi deste governo foi o de apelar ao uso dos meios colectivos de transporte de forma quase coerciva, taxando de forma abusiva e muitas vezes desumana a circulação de viaturas próprias, sem qualquer preocupação na manutenção desses mesmos transportes colectivos. É essencial, numa primeira análise, garantir à CP uma verdadeira autonomia administrativa para que, através de uma gestão competente, possa resolver os seus problemas de forma autónoma. Por outro lado, repensar o monopólio de oferta pública existente e considerar os exemplos de outros países da Europa, como por exemplo o sistema ferroviário Holandês ou Alemão onde a existência e concorrência da oferta privada confiável, previsível e de baixo custo impõe à oferta pública a manutenção desses mesmos parâmetros de qualidade.
O segundo, é que a continuidade destes problemas revela-se clarificadora da incapacidade de Pedro Nuno e do PS em resolver os problemas essenciais do país. Pedro Nuno foi ministro das Infraestruturas durante quatro anos, e não só foi incapaz de proceder a uma reestruturação séria da oferta pública da linha, como é o principal protagonista da falta de resposta às reivindicações dos trabalhadores da ferrovia e portanto, o principal responsável pelas sucessivas e contínuas greves dos comboios. É ele o principal culpado pela desestabilização da vida das pessoas que dependem do transporte ferroviário. E é a ele, a quem o PS reconhece competência para liderar o país e resolver os problemas que este ajudou a criar.
Os políticos têm um passado. E os Lesados da CP, no dia 10 de Março não se irão esquecer do passado do PS.