Em Portugal, o acesso ao ensino superior é predominantemente baseado nas notas de entrada e nos exames nacionais. Contudo, esta abordagem ignora outros méritos e esforços significativos, como a dedicação ao desporto, à música e às artes. Esta falta de reconhecimento é particularmente injusta para os alunos-atletas, que enfrentam desafios adicionais para conciliar a vida académica com a prática desportiva de alto nível.

A obesidade é um problema crescente em Portugal, acarretando custos significativos para o Serviço Nacional de Saúde (SNS). Um estudo da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa, concluído em 2021, estima que o custo direto da obesidade seja de cerca de 1,2 mil milhões de euros por ano, aproximadamente 0,6% do PIB e 6% das despesas de saúde em Portugal. Além disso, um relatório de 2019 da OCDE indica que 10% da despesa em saúde em Portugal é dedicada ao tratamento de doenças relacionadas com o excesso de peso, um valor significativamente acima da média dos países da OCDE. Estima-se que, entre 2020 e 2050, o excesso de peso e as doenças associadas possam reduzir a esperança média de vida e a saúde dos portugueses.

Promover o desporto entre os jovens e incentivá-lo através de medidas de admissão no ensino superior é uma solução eficaz para reduzir esses custos futuros e melhorar a saúde pública a longo prazo.

Como pai de dois filhos dedicados à música e ao desporto federado, sinto esta injustiça de forma mais próxima. Apesar dos excelentes desempenhos académicos, a carga de treino e a dedicação às suas modalidades desportivas representam um esforço considerável. Por exemplo, um atleta de andebol que treina e compete regularmente tem de conciliar esses compromissos com os estudos, ao contrário de alunos que se dedicam exclusivamente à vertente académica. Esta situação cria uma disparidade significativa e uma iniquidade no acesso ao ensino superior.

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Em países como o Reino Unido, bolsas de mérito desportivo são comuns. Em Portugal, o facto de serem atletas federados e terem participado em seleções regionais ou nacionais não tem impacto positivo na sua candidatura ao ensino superior, pelo contrário. Os atletas e seus pais precisam encontrar soluções para competir academicamente, pois só os resultados académicos são considerados.

Atualmente, apenas os atletas que participam em competições internacionais obtêm o estatuto de alta competição, que lhes concede acesso diferenciado ao ensino superior. Esta distinção é limitada e beneficia apenas uma pequena parcela de atletas. É crucial expandir os critérios de avaliação para incluir todos os atletas destacados nas suas modalidades.

Tomando como exemplo o desporto, à carga adicional de treinos e jogos, somam-se os horários tardios e as deslocações para estágios exigindo um esforço adicional academicamente e uma gestão de tempo que não são valorizados no momento de avaliação para o acesso à universidade. A carga de esforço dos alunos-atletas federados é significativamente superior à dos alunos sem atividades extracurriculares exigentes, e os direitos dessas crianças não estão a ser devidamente protegidos pelo Estado.

Sugiro que Portugal adote um sistema semelhante ao de outros países, integrando o mérito desportivo e outras atividades extracurriculares no processo de admissão ao ensino superior. A introdução de pontos adicionais na nota de candidatura para o ensino superior, para estudantes com histórico comprovado em desporto federado ou outras atividades, como música e artes, seria benéfica. Esta abordagem incentivaria a prática de exercício físico e reduziria o sedentarismo, além de motivar os alunos a destacarem-se em diversas áreas.

A Universidade de Oxford concede pontos adicionais aos candidatos pelas atividades extracurriculares, assim como a Universidade de Toronto. Estes exemplos internacionais mostram que valorizar uma formação integral dos estudantes é possível e benéfico. Adotar estas medidas promoveria a equidade e incentivaria os jovens a participarem em atividades que contribuem para o seu desenvolvimento integral.

Aos números preocupantes da obesidade em Portugal, anteriormente referidos, acresce o facto de existir, cada vez mais, uma parte significativa de pais que promovem o “não fazer desporto” por dois motivos. Um deles é o receio de terem de abdicar dos seus fins-de-semana livres, enquanto a outro é a preocupação de que isso possa prejudicar os estudos. No entanto, dados comprovam que o desporto ou a música contribuem diretamente para o sucesso escolar. Urge que o estado não ignore esta realidade; pelo contrário, deve intervir de forma decisiva para promover a atividade física, especialmente nas escolas, tornando-a obrigatória com horários alargados e competições escolares.

Além disso, o papel das autarquias no apoio aos clubes desportivos locais é crucial. O Estado deve reconhecer o esforço dos atletas no seu percurso académico e garantir o acompanhamento adequado de profissionais de saúde. É igualmente importante reconhecer o esforço significativo que muitos treinadores e dirigentes fazem, muitas vezes recebendo pouco ou nada nos clubes desportivos. Ser treinador de um clube deveria imediatamente proporcionar acesso a um escalão de IRS mais vantajoso, ou outros benefícios fiscais, estatuto este que seria aplicado aos escalões de formação.

É fundamental adotar uma visão de longo prazo para o sucesso desportivo e académico, de modo a formarmos adultos saudáveis e reduzir os gastos com o tratamento de doenças crónicas. Da mesma forma, devemos seguir o exemplo do desporto no apoio às artes e à música, pois essas atividades extracurriculares melhoram a nossa cultura e promovem uma saúde mental melhor. Como disse Winston Churchill: “Cortar na Cultura? Nem pensar! Afinal, para que estamos a travar esta guerra?”

Torna-se emergente reconhecer o percurso dos alunos em Portugal. Valorizar o esforço dos estudantes assegura uma educação mais inclusiva e justa e destaca o impacto positivo destas atividades extracurriculares no desenvolvimento pessoal e na saúde pública. Reformar o sistema educativo para garantir que todos os alunos tenham uma oportunidade justa de acesso ao ensino superior, refletindo o seu esforço, é fundamental.

Ao incentivar estilos de vida ativos desde a infância, o Estado promove a saúde física e mental das crianças, prevenindo futuros problemas de saúde e bem-estar social. Investir no desporto e na cultura prepara os jovens para se tornarem adultos equilibrados e saudáveis, assegurando um retorno significativo no desenvolvimento de uma sociedade mais capacitada e resiliente. Reconhecer o esforço dos alunos nas suas atividades extracurriculares, atribuindo um peso extra na média de entrada no ensino superior, é uma necessidade educativa.