Por volta do ano 700 antes de Cristo, o estado chinês detinha um forte monopólio sobre toda a exploração, indústria, distribuição e comercialização do sal, monopólio cuja estrutura foi ficando tão grande e tão disfuncional que eventualmente se tornou-se corrupta, ao ponto de deixar de funcionar. Acabou por ser melhor comprar sal no mercado negro pois era mais puro (menos “cortado”), de melhor qualidade e mais regular.

A pimenta, outro elemento comum das nossas mesas, foi em tempos um grande bem do comércio marítimo mundial, equivalente aos ativos financeiros de hoje. Partiam rumo ao mar navios com a intenção de trazer de volta para Europa este bem tão precioso, valioso e procurado. Poderiam estar vários navios em simultâneo no mar neste tipo de missão comercial, mas de empreendimentos concorrentes. Após o regresso, ao chegar ao respetivo porto e com as cargas de pimenta para desembarcar, é que se ficava a saber o valor de mercado da pimenta, pois se os outros carregamentos também tinham levado a bom porto a sua odisseia, haveria então mais oferta. Mas se ao chegar, fossem os únicos com uma boa carga, a sua mercadoria era valorizada e especial.

No passado recente das cidades de todo o mundo, os elevadores podem ter ajudado a criar bairros “maus” ou bairros pobres. Antes da sua existência havia prédios onde todas a classes habitavam, ruas completas em termos sociais e até em termos de económicos (economia local). O rés de chão era um piso de serviço, o segundo e terceiro andar era para a classes mais ricas e os pisos de cima para os mais pobres. Os elevadores, inovação técnica e tecnológica, tiveram talvez, um efeito inesperado. Com elevadores funcionais, os andares de cima passaram também a alojar os mais ricos, já que deixou de ser cansativo habitar neles por causa da dificuldade na utilização das escadas. Isto criou zonas inteiras só para os mais pobres, provavelmente sem elevadores e ruas ou bairros inteiros para os ricos, com elevadores em todos os prédios.

A história está cheia de magníficos exemplos de episódios em que políticas implantadas revelam efeitos contrários ou inesperados. Na França e nos Países Baixos, por volta de 1800, introduziu-se um imposto sobre janelas, imposto “temporário” que durou mais de cem anos. Em Israel, nos anos noventa, uma creche instaurou uma penalização em dinheiro, cobrável aos pais que chegassem tarde para levantar os seus filhos (depois da hora estipulada pela creche). No primeiro caso começou a tapar-se as janelas das casas e a qualidade de vida e saúde dos cidadãos piorou significativamente e no outro caso grande parte dos pais pagaram com agrado a tal penalização e passaram a levantar as suas crianças mais perto da hora do jantar.

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Num memorável episódio da serie americana Seinfeld, George Constanza faz uma coisa inesperada. Ao perceber, num momento de clareza, que tudo o que tem feito na vida até aquele momento não tem resultado da melhor forma, decide inverter todas as suas decisões e atitudes e começa a fazer precisamente o oposto do que tinha feito até aquele momento. Após a tomada desta decisão, levanta-se da mesa que partilha com o seu amigo e apresenta-se a uma senhora sentada ao balcão do diner onde ele se encontrava dizendo “olá, o meu nome é George, sou careca, desempregado e vivo com a minha mãe”. A senhora acha graça e inicia-se um convívio entre os dois.

Tal como no monopólio mal sucedido do sal e no imposto sobre as janelas, por vezes determinadas intenções, regras, políticas ou práticas acabam por ter o efeito inverso ou acabam por criar distorções que acarretam resultados inesperados. Tal como nas odisseias da pimenta, o valor ou resultado final só era sabido à chegada, por melhor que fosse o plano. E por fim, tal como no imposto sobre as janelas, na penalização das creches ou na inovação tecnológica do elevador, o efeito conseguido foi o oposto ou pelo menos inesperado. Assim, o que sucede muitas vezes na vida, em especial nos ramos da política e da economia, é que se querem alcançar determinados resultados pensando que os caminhos para esse resultado são lineares. Não se pensa que as coisas podem ser “não-lineares” e os “efeitos compostos”, bons ou maus, tendem a acontecer no não linear. Não se pensa na complexidade das interações, nos efeitos multiplicativos ou inesperados.

No ano de 1929, mesmo antes da mais dramática crise financeira da história moderna, um famoso economista americano, Irving Fisher, afirmou que a bolsa americana, o stock market, teria atingido um planalto estável e permanente e que seria pouco provável um stock market crash. A crise financeira de 2008 foi também invisível para muitos antes de ela se instalar, mas o período que se seguiu viu uma quantidade significativa de livros publicados sobre crises financeiras.

Os eventos com impactos altamente negativos são normalmente eventos escondidos, raramente visíveis antes de acontecerem, mesmo nos olhos de especialistas. São no entanto muito claros e óbvios, após sucederem (olhando para trás). Quando algo acontece que faz com que um objetivo não seja alcançado, a culpa nunca é do caminho traçado ou do autor do desenho do caminho, a culpa é normalmente atribuída a alguma “crise” ou fator externo imprevisível e inesperado.

Por outro lado, a grande maioria dos acontecimentos positivos, podem, até ser simplesmente fruto do acaso, algo tão simples como estar presente no momento em que circunstâncias são favoráveis ou no momento em que vários fatores se alinham para se poder obter um bom desfecho. Imaginem por exemplo um barco que tivesse chegado à Europa com pimenta num momento em que mais nenhum chegou, por motivos alheios ao próprio. Nestes processos, o risco pode ser calculado mas a incerteza não, a única maneira de lidar com a incerteza é de sabermos que esse risco escondido está sempre presente. Muitas vezes, para alcançar um bom resultado a melhor forma pode ser por “via negativa”, ou seja, não acrescentando, mas sim retirando, ou, até mesmo fazendo o contrário do que se pode pensar. Para terminar, quando se ouve um político ou um economista ou um ministro anunciar um resultado ao mesmo tempo do que a medida há que ter reserva!