Parece que o serviço militar obrigatório (SMO) teima em ser a pedra no sapato que não sai das discussões do espaço público. Este é um assunto que chegou e permaneceu, sem que se tenha alcançado lugar proveitoso algum.

Contudo, finalmente ouvimos o que pensa o Governo sobre este assunto, após um mês de ter tomado posse, na voz do seu Ministro da Defesa, Nuno Melo, com quem a Ministra da Administração Interna, Margarida Blasco, concordou. Basicamente, segundo estes responsáveis políticos, o SMO passaria a estar pensado para os jovens que cometessem pequenos delitos, numa espécie de centro educacional que serviria para recuperar as competências cidadãs perdidas no mundo exterior.

À primeira vista, esta ideia parece bastante aceitável. Talvez porque, de certo modo, politicamente correta, algo que alegadamente Nuno Melo não gosta de ser. Retiramos da sociedade civil, pelo menos por algum tempo, os encarados como delinquentes, protegendo as pessoas dos seus perigos, ao mesmo tempo que lhes damos formação para se tornarem melhores pessoas. Todavia, porque será, então, que variados setores da sociedade, de políticos a jornalistas e ao próprio setor militar, terão reagido contrariamente a esta proposta ou, no mínimo, sugestão?

A verdade é que existem vários pontos que podemos criticar sobre esta medida. Em primeiro lugar, o serviço militar não pode ser encarado como um castigo, nem é impondo-o como uma punição que este incorporará novos recursos humanos capazes de o promover e defender dignamente. Este era, de resto, o problema desde o início da discussão, quando se chegou a falar de um SMO alargado para os jovens. Sem motivações – remuneratórias, de reconhecimento público, etc. – que levem estes indivíduos a experimentarem e a permanecerem no serviço militar, nunca conseguiremos suprir as necessidades que o mesmo está agora a apresentar.

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Ninguém quer impedir o debate sobre se, quando e como se pode implementar o SMO. Numa democracia madura nenhum tema é tabu. Não obstante, não se pode introduzi-lo de maneira avulsa, arbitrária ou totalitária, representando-o como uma censura, um mal necessário. Na contemporaneidade passamos por conflitos bélicos e políticos que são, acima de tudo, problemas civilizacionais e de escassez de uma cidadania profunda, onde a capacidade de compreendermos empaticamente o outro diminui e os militares são usados como peças para cumprimento de vontades despóticas. Numa democracia como a portuguesa, que se pretende plena, o SMO deve ser uma produção cidadã necessária para defesa da justiça e da soberania de um povo.

Contudo, também não se pode achar que os comportamentos cidadãos somente são conseguidos no serviço militar. Este não é uma casa de correção, que tem de limpar aquilo que as outras instituições não conseguiram e de ficar com as pessoas que essas instituições não desejam para si. Não, a cidadania está em todo o lado, desde a família à escola, passando pelo trabalho, pelo lazer, pela religião, pelos coletivos de cariz social, artístico ou político, entre outros. É através da agregação da sociedade que conseguimos que os jovens aprendam a perceber-se e a perceber o outro.

Mais uma vez, antes de tudo, é preciso dignificar a carreira militar e torná-la atrativa para que haja quem queira nela enveredar. Da mesma forma que não obrigamos as pessoas a serem professores ou médicos, mesmo admitindo a sua escassez, não podemos obrigar ninguém a ser militar, sob pena de não reunirmos os melhores, mas aqueles assim-assim que um dia o Estado decidiu aprisionar, não valorizando nem a missão militar (representando-a como austera) nem o resto da sociedade e suas instituições (interpretando-as como incapazes de formar os cidadãos).