A banca é um dos setores em que impera a necessidade de evolução para sobreviver no mundo da transformação digital. Os bancos tradicionais enfrentam grandes desafios e estão cada vez mais vulneráveis no contexto competitivo que se está a instalar no setor. A entrada de novos players digitais faz com que se torne crucial repensarem o seu modelo de negócio, indo ao encontro de novas e inovadoras estratégias, que possam acrescentar valor aos seus clientes, e que sejam facilmente potenciadas através da tecnologia.
As vulnerabilidades inerentes ao modelo bancário universal estão a tornar-se mais severas à medida que um conjunto de circunstâncias e inovações continuam a afetar o ambiente de mercado. O relatório Reshaping retail banks: Enhancing banking for the next digital age, da Mckinsey, vem realçar vários aspetos do atual contexto, nomeadamente, a alteração da vantagem competitiva de escala proporcionada pelas agências bancárias para a vantagem através da inovação; as “Cyber Threats” crescentes e cada vez mais complexas, agravadas pelo contexto geopolítico atual, podendo resultar em impactos relevantes no valor económico e reputação dos bancos tradicionais; e o desejo dos consumidores de terem acesso a uma oferta digital mais ampla, com experiências personalizadas e de qualidade superior.
Neste contexto, e sendo a capacidade de antecipação um imperativo para o sucesso dos negócios, apontamos quatro tendências que estão a impactar o ecossistema da banca e dos serviços financeiros, e que certamente vão moldar o futuro do setor:
1 Bancos a operar como empresas de tecnologia
Voltando ao relatório da Mckinsey, a gravidade dos desafios que se colocam ao modelo tradicional de banco universal e os imperativos estratégicos implícitos variam de acordo com a região, sendo que na Europa, América do Norte e Ásia desenvolvida o imperativo é a adoção de novas tecnologias e a integração adequada das mesmas. Os bancos que não se reinventarem dificilmente conseguirão responder às constantes novas necessidades do mercado.
A mesma Mckinsey afirma que, as novas instituições bancárias líderes serão aquelas que se posicionem como empresas de tecnologia, com recursos avançados de dados, um modelo operacional ágil, reinventado e adequado ao propósito da organização. No entanto, operar como uma empresa de tecnologia requer mais do que apenas adotar algumas tecnologias digitais. Envolve uma mudança fundamental no modelo de negócios e cultura organizacional do banco.
Desde logo, os bancos precisam de adotar uma abordagem mais ágil e iterativa para o desenvolvimento de soluções aplicacionais de suporte ao negócio, permitindo-lhes testar e lançar rapidamente novos produtos e serviços. Isto requer a adoção de tecnologias “low code”, a quebra de silos tradicionais impostos pelos sistemas “legacy” e a criação de equipas multidisciplinares que possam colaborar e inovar com mais eficácia.
Operar como uma empresa de tecnologia significa também acelerar o processo de transformação organizativa e tecnológica das instituições financeiras. Deste modo, é necessário reposicionar o papel da função das equipas de TI, no sentido de injetar uma maior eficiência operativa e flexibilidade da sua atuação na relação com as unidades de negócio, permitindo, assim, promover em simultâneo a concentração de competências, a racionalização de meios, a otimização de estruturas e o alinhamento de procedimentos, de modo a incrementar os seus níveis de agilidade, adaptabilidade e rapidez de resposta às necessidades de mudança impostas pelo negócio onde atuam. Acresce o facto de tudo isto ter de ser realizado com elevados parâmetros de segurança, qualidade e com custos controlados.
Finalmente, para operar como uma empresa de tecnologia, os bancos precisam de fomentar uma cultura de inovação e experimentação, onde o fracasso é aceite como parte do processo de criação. Isso significa criar um ambiente seguro onde os colaboradores possam experimentar novas ideias e correr riscos calculados sem medo de falhar.
2 Cibersegurança e conformidade são prioridades
Com o aumento exponencial do volume de informação produzida, associado à crescente utilização da tecnologia por via da digitalização dos processos, aumentaram os riscos associados a falhas operacionais e a ataques externos às instituições financeiras. Adicionalmente, o atual contexto geopolítico, com uma guerra em curso, obriga as instituições financeiras a encarar o tema da cibersegurança como uma prioridade absoluta, já que as ameaças cresceram em volume e severidade. Perante isto, o papel das entidades reguladoras das instituições financeiras, nacionais ou globais, tem vindo a fortalecer-se através da produção de guidelines e legislação, contendo regras de conformidade dos sistemas de informação a serem observadas, sob o risco de grave penalização.
Para se protegerem de ameaças cibernéticas e garantirem a conformidade perante os reguladores, os bancos devem investir de forma crescente em medidas de segurança cibernética. Entre elas, auditorias de prevenção periódicas, avaliações de vulnerabilidades para identificar e corrigir as mesmas, assim como a implementação de sistemas de deteção e prevenção de intrusões.
Adicionalmente, a adoção de soluções de cloud garante às organizações níveis de monitorização, de segurança e conformidade difíceis de igualar numa infraestrutura on premises. Permitem aos bancos armazenar e processar dados em ambientes altamente seguros e redundantes, minimizando o risco de perda e roubo de informação. No entanto, os bancos devem garantir que as soluções de cloud sejam configuradas corretamente, que medidas de segurança adequadas sejam implementadas, e que a solução seja gerida de forma eficaz para garantir que todos os dados sejam protegidos de forma correta.
Não menos importante será a sensibilização e a educação dos seus colaboradores, bem como dos seus clientes, através de ações de formação e partilha de boas práticas, para que todos estejam cientes das ameaças e como mitigá-las, tudo isto com modelos de governação sólidos. Só assim poderão ajudar a organização a prevenir e evitar ameaças externas.
Em resumo, dados os riscos crescentes envolvidos e a conformidade exigida pelas entidades regulamentares, a cibersegurança é e continuará a ser uma prioridade máxima para as instituições bancárias, que se materializa em investimento em tecnologia, processos e formação, para se protegerem a elas próprias e protegerem os seus clientes de ataques cibernéticos.
3 O foco na experiência dos consumidores
Ao fortalecerem uma cultura de dados na organização, tirando partido da vasta informação armazenada que possuem, e ao aplicar tecnologias de Inteligência Artificial e Machine Learning sobre esses mesmos dados, os bancos conseguem retirar insights, personalizar a sua oferta e criar propostas de valor relevantes para os seus clientes. Mais do que o acesso a serviços diferenciadores, os consumidores digitais estão a valorizar a experiência, principalmente potenciada pelos dispositivos móveis e aplicações.
Este é um caminho que está a ser feito pelas instituições bancárias e que vai continuar a ter necessidade de sofisticação, principalmente na parte da personalização e interação com os clientes, que, ao mesmo tempo que se torna mais digital, necessita de ser cada vez mais humanizada.
Muitas entidades bancárias já entenderam este desafio e estão a investir neste campo, com o objetivo de aperfeiçoar a experiência digital rumo à excecionalidade. Não obstante a experiência digital melhorada, a conjugação perfeita entre os vários canais será o principal fator de competitividade entres os bancos.
4 A sustentabilidade como imperativo
Sendo a banca um setor com impacto direto sobre os cidadãos, a sustentabilidade tem de estar no centro da sua transformação, seja pela sua ação enquanto agente económico, seja por via de medidas aplicadas internamente ou por imposição dos próprios clientes.
Para começar, os bancos têm a capacidade de influenciar positivamente a sustentabilidade através de atividades de investimento e financiamento. Eles podem discriminar positivamente e incentivar empresas a adotarem práticas sustentáveis através da concessão de empréstimos e financiamentos, e podem também investir em projetos que promovam a sustentabilidade, a redução da pegada ecológica e a eficiência energética.
Além disso, os bancos também têm a responsabilidade de minimizar seu próprio impacto ambiental e social, adotando práticas sustentáveis nas suas próprias operações e processos. A adoção de tecnologias como a cloud, virtualização de servidores, posto de trabalho remoto, inteligência artificial e computação quântica são exemplos de como se podem transformar internamente para se tornarem mais “verdes” e irem ao encontro desta necessidade. Também a transição de datacenters para fornecedores de cloud pública contribui para a redução do impacto ambiental negativo, permitindo às organizações aumentarem a sua flexibilidade e escalabilidade, bem como reduzir a sua a pegada ecológica.
Cada vez mais são os próprios consumidores/cidadãos a premiar ou penalizar as organizações. Este mindset é predominante nas camadas jovens, levando-as a escolher os produtos/serviços das organizações que vão ao encontro dos seus valores e que revelem um verdadeiro compromisso com a sustentabilidade, o planeta, o futuro e com os demais.
Em conclusão, a sustentabilidade é um imperativo para os bancos, não apenas pelas suas próprias ações e práticas sustentáveis que aplicam sobre os seus clientes, colaboradores e sobre a sua própria operação, mas também pelo poder que têm em influenciar positivamente a sustentabilidade através da sua atividade enquanto agente de investimento e concessão de crédito. O sucesso de cada banco será certamente impactado pela forma como integrará a sustentabilidade na sua missão, nos seus valores e na forma como atua num mercado concorrencial.