Apesar de se falar de trabalho remoto desde os anos 90, foi em 2020 que se verificou uma maior adoção deste modelo, o que não só comprovou o seu sucesso, como permitiu salvar negócios e postos de trabalho. Contudo, os resultados decorrentes deste modelo não têm sido consistentes, estando o seu impacto positivo interligado com outros fatores, como a adoção de metodologias de trabalho ágeis. De facto, estudos mostram que empresas que implementam pelo menos duas práticas Agile têm 40% mais probabilidade de ter um aumento de produtividade em equipas remotas do que as empresas que não o fazem. Esta é uma lição importante, numa altura em que muitas empresas olham para um futuro em que cada vez mais equipas trabalham remotamente ou em modelos híbridos, dividindo o seu tempo entre casa e escritório.
A revolução Agile surgiu no contexto de desenvolvimento de software, muito antes de alguma vez termos ouvido falar da Covid-19. O valor das metodologias associadas a este movimento era inegável, mas o termo foi excessivamente utilizado e mal interpretado por muitas organizações, que acolheram a terminologia e alguns processos, mas não os seus principais alicerces.
A metodologia Agile é uma abordagem centrada na equipa, que exige constante iteração e dá prioridade à rapidez, autonomia e colaboração. Para os líderes do Agile, a tarefa mais importante é definir o resultado desejado, de forma clara, e dar autonomia às equipas para alcançar esse resultado. A empresa londrina de espaços inteligentes de escritório Habit Action acrescenta ainda que adotar a metodologia é “trabalhar dentro das diretrizes (da tarefa), mas sem limitações (de como se consegue isso)”.
Quando as restrições da Covid-19 foram impostas, as empresas com equipas Agile estavam prontas. Os seus alicerces – a autonomia, a colaboração, a colocalização, os breves pontos de situação diários (“stand-ups”), a tomada de decisões rápidas, entre outros – já tinham sido interiorizados e implementados, pelo que as equipas foram capazes de se adaptar rapidamente para o modo de crise, estabelecer novos protocolos de trabalho, redefinir as prioridades e ajudar outros membros das suas organizações.
Neste processo, aprendemos algo muito importante: que as equipas Agile podiam ter sucesso, mesmo quando os seus membros colaboravam remotamente, desde que todos estivessem na mesma “sala” virtual e continuassem a fazer tudo o que que já faziam quando estavam frente a frente – comunicar, colaborar e iterar.
O foco em resultados, no output e não no input, é outra convicção de uma equipa e organização Agile que sustentou o sucesso de um modelo de trabalho remoto. A monitorização da produtividade e do impacto do trabalho desenvolvido é feita através de momentos bem definidos ao longo de Sprints, e a cultura data-driven garante que os sucessos são mensuráveis. Existe um espaço para a tentativa e erro, e os mecanismos de avaliação e liderança suportam um ambiente construtivo em que se valoriza menos o número de horas investido em frente ao computador e mais a capacidade de experimentar e atingir resultados ambiciosos.
As equipas não Agile não tinham estes hábitos de trabalho, nem se moviam neste tipo de cultura. Nem sempre tinham uma visão comum sobre quais eram as prioridades e como estas mudariam de dia para dia (por vezes de hora para hora); nem sempre tinham as formas diárias de se alinhar sobre o progresso, questões e soluções; e em muitos casos, nem sequer tinham uma cultura de trabalho de equipa.
Passado um ano de teletrabalho, o que vai acontecer quando regressarmos?
Ninguém sabe quem, ou quantos, “voltarão” ao modelo de trabalho pré-Covid quando nos for dada luz verde para o fazer. Estudos revelam que muitas pessoas não regressarão a 100% à rotina diária de cinco dias por semana no escritório. Escolherão, com a bênção da sua liderança, trabalhar em formato híbrido: estar no escritório alguns dias; trabalhar noutro local nos restantes.
É por isso que o Agile é tão essencial e que foi importante ver que as equipas que adotaram esta metodologia funcionam, mesmo não estando fisicamente no mesmo espaço, mas, em alternativa, em “salas” virtuais no Teams, Zoom ou Slack.
O sucesso de longo prazo do trabalho híbrido deverá assentar em estratégias que permitam que equipas coesas trabalhem remotamente em simultâneo, ou seja, ora todos em modo presencial, ora todos remotamente. O trabalho híbrido não funcionará se as pessoas com quem precisarmos de colaborar estiverem no escritório nos dias em que nós estivermos fora, nem se alguns membros da equipa estiverem fisicamente na mesma sala e outros em videochamada. Aqueles que estiverem em chamada não receberão o feedback da mesma forma como os que estão sentados na sala e esta dualidade colocará os “ausentes” em desvantagem.
Finalmente, o trabalho híbrido não funcionará se os líderes e gestores de topo estiverem rotineiramente no escritório, porque todos os outros sentirão pressão para estar onde os chefes estão. Ou seja, haverá pressão – intencional ou não – para que todos regressem ao escritório.
A metodologia Agile surge, então, como parte da solução. As verdadeiras equipas Agile são multifuncionais e altamente autónomas. Nos dias em que decidirem estar em localização remota, muito pouco, ou nada, as deve impedir. São responsáveis e avaliadas com base no sucesso das suas tarefas e pela sua produtividade, pelo que não há necessidade de estarem fisicamente com as suas lideranças. Na realidade, os líderes Agile veem-nos nos seus espaços de trabalho digitais se precisarem de fazer algum ponto de situação.
Como esta história irá acabar vai depender, claro, de uma liderança forte e confiante. A metodologia Agile é um meio para atingir um fim. Cabe à liderança, especialmente nestes tempos de distração, quando as equipas estão fisicamente separadas, definir esse fim: fornecer uma visão comum para a qual trabalhar e garantir que todos compreendem concretamente o que se espera delas. Depois, libertá-los.
Se o trabalho híbrido é o futuro, a metodologia Agile é a chave para esse futuro.