Se há um problema castrador do desenvolvimento da nossa economia e da manutenção do estado social é a política salarial em Portugal. Paga-se mal a quem trabalha e trabalhar não é garante de uma vida digna.

O panorama é o seguinte: de acordo com o INE, o salário médio líquido dos trabalhadores por conta de outrem (privado) é de 1025 euros (909€ em 2014), o salário mínimo é de 760€ (485€ em 2014) e 60% dos jovens (20 aos 30 anos) auferem um salário inferior a mil euros líquidos por mês.

Este é um problema que nos impede de atingir o potencial de crescimento da economia porque não retemos nem atraímos os profissionais com melhores qualificações, as empresas com maior valor acrescentado e a receita de impostos que nos permita (com a mesma carga fiscal) ter um estado social mais forte e melhores condições para que a economia cresça.

Porquê que isto acontece? É devido à carga fiscal? O que a Comissão Europeia e o Eurostat afirmam é que a carga fiscal sobre o trabalho, tanto em sentido amplo (com contribuições para a Segurança Social) como estrito (só impostos) está abaixo da média da zona euro. Aliás, quase metade dos agregados familiares não pagam IRS porque não têm remunerações passíveis de pagar imposto. O estado português mesmo que tivesse uma carga fiscal mais alta que a média da zona euro, nunca teria receitas equivalentes a outros estados com salários mais altos, logo, com maior potencial de receita fiscal. O estado português ao comprar uma máquina de TAC paga o mesmo preço que o estado alemão, mas recebe por cada trabalhador menos de receita fiscal. Este problema impede ter melhores serviços públicos e coloca a pressão fiscal na outra metade dos trabalhadores que têm salários médios ou acima da média.

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Existem baixos salários porque a economia não tem um perfil produtivo que comporte salários mais altos? Não é o que dizem os números pois o peso dos salários no PIB continua abaixo da média da zona euro segundo o Eurostat. A produtividade é baixa mas justifica mesmo assim salários mais altos.

Não existem soluções milagrosas e imediatas, mas há, a meu ver, medidas que podem inverter esta situação. O governo tem três instrumentos: salário mínimo, política salarial na função pública e política fiscal.

Subir o salário mínimo é uma urgência. Nos últimos 6 anos subiu 40% mas continua a um nível que não garante a dignidade de quem trabalha. O governo comprometeu-se e tem cumprido com a meta de chegar aos 900€ em 2026. No entanto, a recente crise inflacionária justifica uma meta mais ambiciosa.

Outro instrumento é a política salarial na função pública. O estado deve dar o exemplo com os seus trabalhadores. Apesar dos recentes aumentos (os maiores em 20 anos) e do acordo de Rendimentos e Competitividade que estabelece um aumento anual de 4,6 a 5,1%, o que é facto é que a política salarial não atrai os mais qualificados nem compara bem com os salários reais pré crise de 2008. Este é outro instrumento que, para além de todos os outros efeitos positivos, estimula a subida de salários no privado.

Por fim, a política fiscal e de incentivos. Urge acabar com todos os apoios à contratação que não impliquem um salário acima da média nacional. Não é justificável que uma multinacional receba apoios públicos para a contratação de trabalhadores com salários baixos. Este ano, o governo lançou um incentivo à contratação de jovens que implica que estes tenham pelo menos o salário médio nacional, no entanto, urge criar mais políticas semelhantes e acabar com as restantes. Este ano, o governo lançou um incentivo à contratação de jovens que implica que estes tenham pelo menos o salário médio nacional, no entanto, urge criar mais políticas semelhantes e acabar com as restantes. É preciso sindicatos mais fortes, mais contratação coletiva e o fim dos estágios não remunerados (como anunciado pelo governo).

Portugal tem neste momento falta de mão de obra em alguns setores, um nível de emprego alto, desemprego baixo, um crescimento do PIB acima da média europeia há vários anos (exceto durante a pandemia), por isso, para que este sucesso económico seja sentido pelo povo, importa não nos contentarmos com a existência de emprego mas sim de emprego bem remunerado. Se queremos um desenvolvimento sustentado é a hora de o estado rever as metas de aumentos salariais no setor público e as empresas (que são livres na sua política salarial) valorizarem os seus trabalhadores devolvendo-lhes uma fatia maior da riqueza que geram.

Urge acabar com a pobreza de quem trabalha.