Cinco. Foram cinco os recados deixados por Francisco Assis a António Costa, horas antes de os socialistas reunirem a direção alargada do partido, onde Assis não estará. O eurodeputado pronunciou-se pela primeira vez sobre a derrota do PS nas eleições legislativas e não deixou de reconhecer que o resultado tinha sido magro. Ainda assim, Assis fez questão de apelar à unidade do partido, defendeu que o PS não deve ceder à “chantagem” de BE e CDU e sublinhou a importância acrescida das eleições presidenciais. Fechou à porta à corrida para a liderança do PS? Para já, sim. Depois das presidenciais, não há garantias que o faça. Um a um, os recados de Assis.

1 ) PS “ficou aquém dos objetivos expectáveis”

Francisco Assis não escondeu a desilusão pela derrota do PS nestas eleições e pelo facto de Bloco e CDU terem reforçado o seu peso no Parlamento. Mesmo celebrando a perda da maioria absoluta pela coligação, o socialista não deixou de reconhecer a derrota.

“A coligação de direita ganhou as eleições mas perdeu a maioria absoluta; o PS, subindo ligeiramente, ficou aquém dos objetivos expectáveis e a extrema-esquerda parlamentar reforçou a sua expressão”, sublinhou o eurodeputado socialista em comunicado enviado às redações.

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Em 2011, Francisco Assis perdeu a corrida pela liderança do partido para António José Seguro. Três anos depois, Seguro chamou-o para cabeça de lista de umas europeias que acabaram por sorrir ao PS, mas “poucochinho”. Para António Costa, no entanto, o resultado foi demasiado curto e, por isso, decidiu avançar para a liderança. O objetivo era conseguir a maioria absoluta nas legislativas. Assis ficou com Seguro, mas Seguro perdeu. Um ano depois, Costa também.

2)  Os socialistas devem “evitar a tribalização do partido”

Posto isto, Francisco Assis acredita que o partido deve estar mais unido do que nunca e, por isso, deixou um aviso claro à navegação: guardem as espingardas, pelo menos para já.

“Neste momento tão difícil, exige-se a todos os militantes – e em especial aos seus dirigentes – que mantenham a serenidade e a elevação imprescindíveis à realização de uma indispensável discussão acerca do nosso presente e do nosso futuro”, começou por escrever Assis.

Mas o eurodeputado não se ficou por aqui e foi ainda mais longe: “Teremos que evitar a tribalização do partido, a sua transformação num espaço de confronto de claques, a consagração da disputa personalizada em detrimento de uma séria reflexão de que não deveremos prescindir”.

3) Acordos à esquerda? Esqueçam, diz Assis

Este é um ponto importante. Mesmo defendendo que o PS “deve assumir com clareza a liderança da oposição ao governo de direita”, Assis deixa claro que isso não pode significar “uma indisponibilidade de princípio para a viabilização dos instrumentos imprescindíveis à governação do país”.

Ou seja, o Orçamento do Estado não pode, como chegou a defender António Costa durante a campanha eleitoral, ser chumbado sem serem sequer conhecidas as bases desse documento. E o PS não deve excluir-se dessa negociação, insiste Assis. “Abre-se, assim, uma possibilidade real para a realização de um diálogo útil entre o Governo e a principal força da oposição, sem pôr em causa a identidade nem de um nem de outro”, escreve.

E os desafios de Catarina Martins e Jerónimo de Sousa para que o PS se junte à esquerda para derrubar Passos Coelho? Esqueçam, diz Assis. “Um grande partido como o PS não pode, em nenhuma circunstância, colocar-se numa situação de fragilidade perante as chantagens e as ameaças de outras forças partidárias à sua esquerda ou à sua direita”.

Defensor de primeira hora de um PS voltado ao centro – Assis chegou mesmo a abandonar o congresso de consagração de Costa por entre críticas aos “discursos de fantasia de esquerda” -, o eurodeputado voltou agora a dizer que os socialistas não devem demitir-se do diálogo com a coligação de direita e afastou a hipótese de acordos com BE e CDU.

4) Presidenciais são prioridade – e para ganhar

Depois da derrota nas eleições legislativas, para Assis, as presidenciais são agora de importância vital. E foi isso que fez questão de recordar: “Não podemos perder de vista que temos eleições presidenciais dentro de três meses e é agora ainda mais importante garantir a eleição de um Presidente da República oriundo do nosso espaço político”.

O recado do socialista ganha ainda mais peso depois das sondagens terem colocado Marcelo Rebelo de Sousa como superfavorito. Depois de São Bento, os socialistas arriscam-se a perder também Belém. Por isso, na perspetiva de Francisco Assis, todas as energias políticas dos socialistas “devem ser canalizadas para esse objetivo” presidencial “e não devem ser gastas em disputas internas fora de tempo”.

Tudo indica que a vontade de António Costa é marcar o congresso extraordinário apenas para depois das presidenciais. Até lá, apoiar quem?

Sampaio da Nóvoa já está no terreno e partiu com o apoio informal de António Costa e da direção do PS. Maria de Belém assumiu publicamente a vontade de se candidatar e tem apoio de seguristas (e não só). No Largo do Rato circula a hipótese de o PS não apoiar nenhum candidato na primeira volta. As palavras de Assis parecem contrariar essa tese, mas ainda é cedo para dizer o que PS vai fazer.

5) Discussão sobre a liderança? Só depois das presidenciais

Também aqui, Assis não deixou grande espaço para dúvidas sobre em que momento deve ser discutida a liderança do partido. “Considero extemporânea qualquer discussão sobre a liderança do PS [antes das presidenciais]”.

Se entre alguns seguristas, como Eurico Brilhante Dias, a ideia é avançar já para o congresso e discutir a liderança do partido, para Francisco Assis essa questão não se coloca.

Isso significa que o eurodeputado fecha por completo a porta à ideia de avançar para a principal cadeira do Largo do Rato? Longe disso. Francisco Assis limitou-se a atirar para depois das presidenciais essa questão.

Resta é saber em que condições se vai apresentar António Costa nesse congresso: como líder de um partido que perdeu as legislativas mas ganhou as presidenciais, ou como líder de um partido que perdeu São Bento e Belém, depois de o seu antecessor ter vencido duas eleições.