O antigo diretor do Serviço de Informações de Segurança (SIS) Rui Pereira afirmou que “sempre procurou estabelecer a fronteira entre o que era permitido e o que era proibido” aos serviços de informações.

“Essa fronteira é muito necessária para que os funcionários [das secretas] se sintam confortáveis na sua missão”, declarou o professor universitário e ex-ministro da Administração Interna.

Rui Pereira falava, como testemunha, no julgamento do caso das secretas, que levou ao banco dos réus o ex-diretor do Serviço de Informações Estratégicas de Defesa (SIED) Jorge Silva Carvalho e outros arguidos, por acesso indevido à faturação detalhada do telemóvel do jornalista Nuno Simas, que, no verão de 2010, relatou o clima de mal-estar no SIED.

O ex-ministro, também antigo secretário-geral do Serviço de Informações da República Portuguesa (SIRP), disse que a preocupação em delimitar essa fronteira o levou a que colocasse sempre “magistrados qualificados” à frente dos serviços.

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Questionado sobre se interesses superiores do Estado podem levar as secretas a ultrapassar os limites da legalidade, Rui Pereira disse que é possível justificar essa atuação em caso de “legítima defesa” ou de “estado de necessidade”.

“Para despistar uma ameaça terrorista, seria admissível fazer uma escuta, mas os serviços [de informações] não dispõem de mecanismos”, argumentou.

Em abstrato, Rui Pereira considerou ainda que os serviços de informações podem realizar “ações encobertas”, desde que dessa atuação não resulte a prática de crimes ou a atribuição de um “estatuto de impunidade”, como ocorre na investigação criminal.

O coletivo de juízes, presidido por Rosa Brandão, ouviu ainda como testemunha o atual diretor do SIS, Neiva da Cruz, que se refugiou no segredo de Estado para quase nada dizer sobre manual de procedimentos, formação dos agentes, fontes e ‘modus operandi’ dos serviços de informações.

“Existem vários manuais, mas são matéria classificada”, “conheço, mas não posso falar”, “sobre operações também não falo” foram algumas das respostas da testemunha que limitam, assim, a produção de prova em julgamento.

Neiva da Cruz afastou, contudo, a ideia de que os serviços acedem à faturação detalhada dos telemóveis das pessoas, ao desabafar que “isso não é possível”, tendo admitido, também de uma forma evasiva, que os serviços dispõem de material técnico para fins previstos na lei, mas não para escutas ambientais.

A próxima audiência de julgamento está marcada para segunda-feira de manhã.