O Orçamento do Estado para este ano cumpriu com mais de metade das medidas dos acordos com os partidos de esquerda. Está lá a reposição dos salários dos funcionários públicos até ao final do ano, a redução do IVA na restauração, a devolução de parte da sobretaxa de IRS e a atualização das pensões. Mas muito ficou por fazer e acabou por ser empurrado para 2017.

E não demora nada a que o Governo que comemora agora 100 dias de existência tenha de discutir estes assuntos. Uns mais fáceis de negociar à esquerda do que outros. Uns mais fáceis de passar em Bruxelas do que outros. Estas são as mudanças que se avizinham, mas só para o próximo ano.

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Esta é talvez a medida mais fácil de cumprir uma vez que já está em letra de lei. O compromisso para acabar com a sobretaxa de IRS ficou firmado na lei que foi aprovada no final do ano com o apoio do PCP e do BE e terá assim reflexo no Orçamento para o próximo ano.

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A estimativa do anterior Governo dizia que a sobretaxa de IRS valia aos cofres do Estado 760 milhões de euros. Com as alterações de António Costa esta fica a valer menos 430 milhões. As variações nos salários podem fazer mudar esta estimativa, mas quando deixar de existir em 2017, será uma perda de cerca de 350 milhões de euros.

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Depois da reposição dos salários dos funcionários públicos, é promessa do Governo valorizar os ordenados. O primeiro-ministro remeteu para 2017. Mas sem garantias. Disse recentemente numa entrevista ao Expresso que “os aumentos existirão na atualização de vencimentos que, espero, possam surgir a partir de 2017”. A existir este pode ser um aumento relevante, quer para os funcionários, que têm ordenados com cortes desde 2010, quer para as contas do Estado. Aliás, foi a primeira grande medida de austeridade. Isto porque cortar nos salários dos funcionários significa uma poupança direta na despesa pública.

Esta promessa ficou no entanto escrita nas propostas de alteração ao Orçamento do Estado que o PS entregou no Parlamento. Os socialistas querem “progressivamente” eliminar a partir de 2017 algumas restrições aos salários e vencimentos da função pública, desde a atualização salarial, às promoções, aos prémios de desempenho e gestão ou outras valorizações que estão congeladas. Em causa pode estar ainda o pagamento de horas extraordinárias ou o pagamento de trabalho suplementar e noturno. São tudo medidas que o PS promete que “serão progressivamente eliminadas a partir de 2017”, como noticiou o Observador, mas que não refere especificamente quais.

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Era dado assente que o alívio do IRS através das mexidas nos escalões seria uma medida para aplicar assim que o Governo tivesse conhecimento aprofundado dos dados da receita fiscal. Mas o Executivo, tendo em conta os valores orçamentais, chutou esta medida para 2017. PCP e Bloco aceitaram o adiamento, mas pressionam para que não passe do próximo ano.

É a medida com maior peso orçamental que ficou por fazer nos acordos de esquerda. Mas será mesmo em 2017? Numa das sessões de esclarecimento sobre o Orçamento do Estado, o ministro Mário Centeno foi vago em comprometer-se com uma data. Nunca falou em 2017 e disse que esta mexida seria “gradual”.

O que quer isto dizer? O ministro disse que o alívio fiscal no IRS já estava a ser feito através da sobretaxa, logo que era preciso ter atenção à “margem orçamental”. Ou seja, para o ano, o fim da sobretaxa já tem um peso orçamental de perda de receita de cerca de 350 milhões de euros. Terá o Governo margem para mais?

Poderá não ser fácil de concretizar, mas também não será fácil não responder às exigências dos partidos da esquerda.

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Esteve para ser uma realidade já neste Orçamento do Estado, mas caiu às mãos da Comissão Europeia. Os partidos da esquerda não são adeptos da medida que vale às contas públicas uma descida das receitas contributivas de cerca de 135 milhões de euros. Era uma medida que permitia aumentar o rendimento disponível das famílias mais pobres, uma vez que o alívio fiscal direto que existiu, com a descida da sobretaxa de IRS não afetou a maioria destes agregados familiares, uma vez que a maioria está isenta de IRS.

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A gratuitidade progressiva dos manuais escolares é uma guerra antiga dos partidos da esquerda e foi uma das propostas de alteração do PCP ao Orçamento do Estado para este ano. Mas sem certeza que avance já este ano, o que significaria não ter impacto no ano letivo 2016/2017. Os comunistas querem que os manuais escolares sejam progressivamente gratuitos, tendo em conta os rendimentos das famílias. Mas tendo em conta o impacto da medida, deverá apenas ficar para o próximo ano.