“Fiz porque me apeteceu, é um bom princípio”, resume Luís Paixão Martins, de 62 anos, especialista em relações públicas. Assim nasceu o News Museum, um novo museu da vila de Sintra, com inauguração agendada para o dia 25 de abril.

Ainda em fase experimental, o espaço tem recebido visitas de jornalistas e políticos, numa abertura suave que serve para divulgar a iniciativa e afinar pormenores.

“Estou no fim da minha carreira profissional, isto é também o legado de uma vida ligada ao jornalismo, à informação e à comunicação”, contextualiza o mesmo responsável, fazendo notar que não se trata de um museu sobre jornais e jornalistas, apenas.

O News Museum é um espaço de entretenimento sobre jornalismo, marketing, relações públicas e os principais acontecimentos da história recente de Portugal. Será dirigido por Rodrigo Moita de Deus, publicitário, ex-jornalista e um dos autores do blogue 31 da Armada.

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Situado num imóvel da Câmara de Sintra, arrendado por 20 anos, ocupa três pisos e está dividido em 25 módulos temáticos. A instalação demorou cerca de seis meses. O nome em inglês e os textos bilingues português-inglês apontam para os turistas, ainda que os estudantes do secundário e do ensino superior sejam os destinatários principais. O preço da entrada não está definido e o número esperado de visitantes também não.

Inicialmente pensado para o Terreiro do Paço, num espaço do ministério da Defesa, o News Museum acabou por se instalar no centro da vila de Sintra, no mesmo edifício que até 2014 albergou o Museu do Brinquedo. “Não temos tratamento especial, pagamos renda, mas fico contente por estar aqui, desde o início defini que o museu tinha que ficar numa centralidade turística”, pormenoriza Luís Paixão Martins, que preside à associação Acta Diurna, promotora e financiadora do projeto.

“É um museu sobre notícias, que são a matéria-prima não só do jornalismo”, clarifica Luís Paixão Martins. “A visão que apresentamos é a de pessoas da comunicação e não de jornalistas. Os fenómenos são visto de fora para dentro e não de dentro para fora, por isso, não é um museu da produção jornalística.”

Quem já lá esteve por estes dias foram os vereadores e o presidente da Câmara de Sintra, Basílio Horta. No final da semana passada, também o ministro da Cultura fez uma visita, a título informal.

João Soares, que já teve Luís Paixão Martins como consultor em campanhas eleitorais, classifica o News Museum como “uma iniciativa interessantíssima” e compara-o ao Newseum norte-americano, que abriu há sete anos.

João Soares visitou esta quinta-feira o News Museum, projeto de Luís Paixão Martins (à esq.)

João Soares visitou o News Museum, projeto de Luís Paixão Martins (à esq.)

“Já tive o privilégio de estar no Newseum, em Washington, que é deslumbrante, e talvez esse museu tenha inspirado o Luís Paixão Martins”, declarou João Soares ao Observador. O espaço é moderno e despojado, com cores claras e constantes estímulos sonoros e visuais, a ponto de dispersarem a atenção dos visitantes – o que pode ser interpretado como um reflexo do discurso mediático que pretende retratar.

Um dos módulos principais chama-se “iArena”. É uma sala interativa, com 67 metros quadrados de ecrã, do chão ao teto, quase em 360 graus. Ali surge uma animação com capas de jornais, vídeos e fotografias sobre os últimos 120 anos da história portuguesa, do regicídio à eleição de Marcelo Rebelo de Sousa, passando pelo 25 de abril de 1974.

Espaço "iArena" com ecrãs táteis conta 120 anos da história portuguesa

Espaço “iArena” com ecrãs táteis conta 120 anos da história portuguesa

O mesmo módulo apresenta vários ecrãs táteis. Um com livros digitalizados, outro sobre o jornalismo no Bairro Alto, onde até há poucas décadas se situavam quase todas as redações (sobra A Bola e, desde há dois anos, o Observador), e outro ecrã ainda sobre as aparições de Fátima.

“Do ponto de vista da comunicação, e como marca, Fátima é um fenómeno”, explica Luís Paixão Martins, durante uma visita guiada. “Tal como temos uma sala sobre futebol, em que aparece o Eusébio e o Cristiano Ronaldo, decidimos dedicar algum espaço a Fátima”, acrescenta. “Futebol e Fátima são dois elementos valorizados pelos portugueses.”

Uma primeira visita

Mas comecemos pelo princípio. Junto à porta, na rua, sobre um estrado que será a esplanada da cafetaria do museu, está Eça de Queirós sentado numa cadeira de metal. Estátua verde, em plástico, remete imediatamente para a de Fernando Pessoa, no Chiado, da autoria de Lagoa Henriques. Eça tem na mão a réplica de um telemóvel e no ecrã aparece a rede social Twitter, como se o escritor e jornalista estivesse hoje em despique eletrónico com Ramalho Ortigão.

Eça de Queirós segura um "smartphone" junto à porta do museu

Eça de Queirós segura um “smartphone” junto à porta do museu

Lá dentro, no piso térreo, um globo rodeado por frases inscritas na parede sobre liberdade de imprensa: Camus, Obama, Orwell, Marx, Gandhi. Os visitantes podem mexer em quatro computadores tablet em que surgem relatórios da Freedom House sobre a liberdade de expressão no mundo.

Junto ao elevador que conduz ao início da visita, no terceiro piso, um painel com ilustrações e vídeos fala sobre os jornalistas “mais famosos do planeta”: Tintin e Clark Kent (o Super-Homem). No interior, ouve-se um discurso do presidente francês François Hollande sobre terrorismo e democracia, e ao fim de 37 segundos cronometrados chega-se ao terceiro piso.

Enquanto se sobe, um friso nas paredes, visível através dos vidros transparentes do elevador, exibe uma cronologia sobre o aparecimento de órgãos de comunicação social: começa com a Acta Diurna (69 a.C., na Roma Antiga), inclui a Gazeta de Lisboa (1715), o Financial Times (1888), a New Yorker (1925), a CBS (1941), o Jornal do Fundão (1946), o Expresso (1970), o Observador (2014), entre muitos outros.

Uma vitrine expõe réplicas das roupas utilizadas pelas apresentadoras dos telejornais da RTP nos anos 80, como Dina Aguiar e Judite Sousa. E ao lado, a sala sobre jornalismo de guerra, inspirada no livro A Verdade da Guerra, de José Rodrigues dos Santos, recorda a invasão do Kuwait pelo Iraque, em 1990.

No espaço “Duelos Mediáticos” surgem gravações dos célebres debates de 1975 entre Mário Soares e Álvaro Cunhal, e de 1960 entre Richard Nixon e J. F. Kennedy. A rivalidade de Steve Jobs e Bill Gates e de José Lobo Antunes e José Saramago é também explicada.

Já na sala sobre propaganda destaca-se uma reprodução do busto de António Ferro, o homem que dirigiu a propaganda do Estado Novo. E por perto, na área dedicada à ética, é exibido o Código Deontológico dos Jornalistas portugueses.

Com algum humor, e a pensar no entretenimento dos visitantes, o módulo sobre futebol mostra imagens de Eusébio e Ronaldo, e expõe frases de José Mourinho, comparando-as com máximas de Maquiavel.

Os jornalistas Cândido de Oliveira, Edite Soeiro, Carlos Pinto Coelho, Cáceres Monteiro, Mário Castrim, Tolentino de Nóbrega e Oscar Mascarenhas, entre tantos outros, são homenageados com fotografias, vídeos e depoimentos gravados.

De alto a baixo, o edifício é atravessado por uma estrutura metálica intitulada “Torre de Babel”, onde dezenas de ecrãs de televisão estão sintonizados em canais de notícias. Ao lado, uma projeção de títulos de notícias, em tempo-real.

Um dispositivo de realidade virtual, outro com perguntas formuladas por Manuela Moura Guedes, e espaços reservados a objetos históricos, cedidos pela RTP, como gravadores, microfones, câmaras e projetores, são outros dos motivos de interesse.

A inauguração, daqui a pouco mais de um mês, deverá contar com a presença do presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa.