Os dois juízes-conselheiros do Tribunal Constitucional a quem eram apontadas falhas nas declarações de rendimentos — noticiadas esta quinta-feira pela revista Sábado — negam a existência de qualquer irregularidade. O juiz Gonçalo Almeida Ribeiro — tal como o Observador escreveu na manhã desta quinta-feira — não declarou contas bancárias porque apenas tem uma conta à ordem que não chega ao valor a partir do qual a lei exige que seja declarado. Já o juiz Lino Ribeiro diz que vai suprir a “omissão”, explicando que só não declarou rendimentos porque apenas auferiu o vencimento de magistrado, que era público.
No comunicado divulgado pelo TC, Gonçalo Almeida Ribeiro — que também enviou um texto ao Observador, publicado na íntegra no final deste artigo — começa por explicar que a lei do Controle Público da Riqueza dos Titulares dos Cargos Políticos, “estabelece que da declaração de rendimentos e património deve constar ‘a descrição (…) desde que superior a 50 salários mínimos, [de] contas bancárias à ordem e direitos de crédito.'” Uma vez que “o salário mínimo está fixado em 530 euros”, a lei prevê a “declaração de contas à ordem apenas de valor superior a 26.500 euros.” Ora, explica o juiz, “sucede que a única conta bancária de que sou titular é uma conta à ordem que fica aquém desse valor. Não há, pois, qualquer omissão irregular ou desrespeito pela lei na minha declaração. Esta observa escrupulosamente todas as exigências legais.”
Já o juiz Lino Ribeiro explica que, “sendo magistrado de carreira”, apenas aufere “como rendimento do trabalho dependente, o vencimento de juiz, cujo montante é, para efeitos de transparência, público.” O conselheiro explica que “por esse motivo, não foi preenchido o campo correspondente”. No entanto, admite que irá retificar essa falha, explicando que essa é uma “omissão que naturalmente será suprida.”
A Sábado tinha noticiado esta quarta-feira que Lino Rodrigues Ribeiro, juiz do Tribunal Constitucional desde 2013, não tinha apresentado qualquer rendimento de trabalho (dependente ou independente) ou de capital na declaração entregue. Em 2012, o ex-magistrado do Supremo Tribunal Administrativo tinha apresentado a primeira (e única) declaração de rendimento sem identificar os rendimentos auferidos nesse ano, elencando apenas os 20 imóveis e os dois veículos que detém. Segundo a revista também Gonçalo Almeida Ribeiro, recém-eleito juiz do Tribunal Constitucional, não tinha identificado qualquer conta bancária como titular, declarando apenas os rendimentos provenientes do trabalho independente e dependente. No caso de Lino Ribeiro houve mesmo uma falha, no de Gonçalo Ribeiro, não.
A questão ganhava especial relevância num momento em que o país aguarda com atenção o desfecho do enredo sobre as declarações de rendimentos dos novos administradores da Caixa Geral de Depósitos. Os juízes vêm assim justificar o porquês das alegadas falhas nas declarações, os gestores da CGD, por sua vez, continuam em silêncio.
Gonçalo Almeida Ribeiro enviou também um texto ao Observador, que intitulou de “O rigor de um juiz o Tribunal Constitucional“, onde volta a esclarecer os termos que o envolvem e que aqui publicamos na íntegra:
“Tendo tomado conhecimento do texto publicado em 16.11.16 pelos jornalistas Octávio Lousada Oliveira e Maria Henrique Espada, com o título «Juízes do Constitucional Omitem Rendimentos e Contas», no site da revista Sábado, e com o texto mais extenso publicado no dia seguinte (17.11.16) na edição impressa da mesma revista, com o título «As Omissões dos Juízes do Tribunal Constitucional», não posso deixar, em defesa quer do meu bom nome e reputação, quer do interesse público na probidade da imprensa, de prestar os seguintes esclarecimentos.
Nos referidos textos afirma-se que eu não cumpri as «exigências de transparência que a lei determina», porque a declaração de rendimentos e património e cargos sociais dos titulares de cargos políticos e equiparados que entreguei quando assumi funções de juiz do Tribunal Constitucional omite informação acerca das contas bancárias de que sou titular.
A notícia produziu de imediato um volumoso ruído mediático, de que é exemplo um texto na edição de 17.11.16 do jornal Público, com o título «Há Dois Juízes do Tribunal Constitucional com Declarações em Falta», em que se afirma que «a omissão de Gonçalo Almeida Ribeiro não respeita os trâmites legais previstos».
A lei relativa ao «Controle Público da Riqueza dos Titulares dos Cargos Políticos», estabelece, no seu artigo 1.º, al. b), que da declaração de rendimentos e património deve constar «a descrição (…) desde que superior a 50 salários mínimos, [de] contas bancárias à ordem e direitos de crédito.»
Também o formulário da declaração, preenchido por todos os titulares de cargos políticos e equiparados — nomeadamente o Presidente da República, o Primeiro-Ministro, os Membros do Governos e, claro, os juízes do Tribunal Constitucional — contém, no seu capítulo II, com a epígrafe «Ativo Patrimonial», um espaço identificado pela letra «E», dedicado à declaração de «contas bancárias à ordem e direitos de crédito, de valor superior a 50 salários mínimos».
O salário mínimo está fixado em 530 euros, pelo que a lei prevê a declaração de contas à ordem apenas de valor superior a 26.500 euros.
Sucede que a única conta bancária de que sou titular é uma conta à ordem que fica aquém desse valor, o que é de resto perfeitamente compreensível, se se atender aos restantes elementos constantes da minha declaração, divulgados — aliás, com imprecisões que revelam falta de rigor no tratamento de informação delicada — nos textos da revista Sábado. Não há, pois, qualquer omissão irregular ou desrespeito pela lei na minha declaração. Pelo contrário, esta observa rigorosamente as exigências legais.
O Gabinete de Relações Externas e Assessoria de Imprensa do Tribunal Constitucional comunicou ao primeiro autor, o jornalista Octávio Lousada Oliveira, os termos em que a lei de controle público da riqueza dos titulares dos cargos políticos exige a declaração de contas bancárias.
A revista Sábado insistiu, apesar desse esclarecimento, em manter a notícia a meu respeito, promovendo na comunicação social a disseminação da ideia falsa de que eu não teria cumprido a lei.”