Mais de metade dos cidadãos com limitações físicas questionados pela DECO não tem o problema oficialmente reconhecido, um em cada quatro tem dificuldade em aceder ao local de trabalho e a muitos dizem ter falta dinheiro para adaptar a casa.

Segundo um inquérito da Associação Portuguesa para a Defesa do Consumidor (DECO), divulgado esta terça-feira, muitos destes cidadãos não conseguem ter uma vida plena porque o dinheiro é pouco para suprir as dificuldades, há pouca ajuda e as barreiras arquitetónicas na via pública e nos transportes ainda são uma realidade.

Mais de um quarto (27%) dos inquiridos com deficiência sente dificuldade em aceder ao local de trabalho, a mesma percentagem dos que já sentiram na pele a discriminação no trabalho.

Entre fevereiro e março últimos, a DECO enviou a uma parte da população um questionário sobre o tema. Com a ajuda de associações do setor, fez chegar o questionário a cidadãos com deficiência motora e sensorial (visual e auditiva). No total, obteve 2.854 respostas válidas.

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Em resposta à DECO, a presidente da direção nacional da Associação Portuguesa de Deficientes (APD) diz que “a dificuldade de acesso ao mercado de trabalho continua a ser uma realidade”, que “não existe sensibilização da entidade patronal para olhar para as pessoas com deficiência como trabalhadores iguais a quaisquer outros” e que “as empresas e os postos de trabalho não estão adaptados”.

Mas é necessário também uma via pública e transportes coletivos adaptados, porque senão chegar ao trabalho torna-se um desígnio impossível: “Parece uma questão irreal, mas não é. Quem consegue aceder ao mercado de trabalho e ter uma vida económica minimamente independente terá de adquirir uma viatura própria, porque depender dos transportes públicos é impensável”, recorda Ana Luísa Sezudo.

A maioria das pessoas questionadas pela DECO lembram que o caminho para a eliminação das barreiras arquitetónicas tem sido lento e que as dificuldades começam, desde logo, no prédio onde se habita.

Mais de 40% dos inquiridos com deficiência grave relatam a dificuldade, ou mesmo impossibilidade, em vencer sucessivas barreiras arquitetónicas”, segundo a Defesa do Consumidor.

Cerca de um terço revela sentir a necessidade de equipamentos ou de infraestruturas específicas para auxiliar a mobilidade. Banheira e casa de banho adaptadas, elevador ou mecanismos de elevação, corrimões e rampas são as infraestruturas mais urgentes e, nalguns casos, um sistema de chamada de emergência.

A falta de dinheiro é a principal razão apontada para uma habitação pouco cómoda para alguém com limitações motoras. As características arquitetónicas da própria casa e o espaço diminuto são outros motivos apontados”, sublinha o estudo.

“Cerca de 45% asseguram ser difícil suportar as despesas diárias relacionadas com a sua condição. Apenas três em dez portugueses nesta situação declaram não enfrentar dificuldades”, afirma a DECO, que destaca igualmente a resposta da responsável da APD sobre esta matéria: “Recebemos cartas e telefonemas completamente desesperados. Existem pessoas a viver com 200 euros”.

As deslocações e a mobilidade no interior de hospitais, de edifícios públicos de supermercados e de centros comerciais podem tornar-se verdadeiros calvários ou revelar-se mesmo impraticáveis.

“Um terço indica as paragens de autocarro e o próprio interior dos veículos como inacessíveis. As estações de comboio e de metropolitano apresentam a mesma lacuna, de acordo com 25% destes cidadãos”, refere a Defesa do Consumidor, recordando que, na verdade, os transportes públicos não estão incluídos na legislação das barreiras arquitetónicas.

A norma comunitária existente defende que a frota de transportes tem de se ir adaptando gradualmente.

O respeito e a sensibilidade perante a fragilidade de um deficiente motor são atitudes nem sempre cultivadas em Portugal.

“Os vizinhos são mais sensíveis à situação de quem tem mais dificuldade em deslocar-se, e disponibilizam-se mais vezes para ajudar. Mas, mesmo assim, mais de um terço dos inquiridos com deficiência sente que essa ajuda não é constante”, refere o estudo.

A maioria dos deficientes motores não possui cartão identificativo para poder estacionar nos lugares reservados e, para mais de um terço dos inquiridos com limitações, é muito frequente o lugar estar ocupado.

Outro problema identificado por um quarto dos que responderam ao estudo é a falta de adaptação das casas de banho em edifícios públicos, mas também em restaurantes e em lojas.

Desenvolver e manter uma atividade profissional é muito difícil, ou mesmo impossível, para cerca de 45% dos inquiridos. Existe uma percentagem considerável com deficiência grave que não consegue realizar, sem precisar de ajuda, tarefas tão básicas como tomar banho ou preparar uma refeição.

O estudo da DECO aponta ainda uma incongruência entre a deficiência declarada e a reconhecida oficialmente.

“Entre os inquiridos que consideram ter alguma limitação motora, apenas metade são oficialmente reconhecidos como pessoas com deficiência. Esta proporção sobe para dois terços entre os portadores de deficiência grave”, refere o documento.

A presidente da APD não tem dúvidas: “Existe um grande desconhecimento, não só da sociedade, mas muitas vezes da própria população com deficiência. Com muita frequência, as pessoas tentam fazer as diligências necessárias, mas a desinformação é muito grande nos serviços da Segurança Social e das Finanças e nos centros de saúde”.