Os 100 anos da Revolução de Outubro, na Rússia, que representou a tomada de poder pelos bolcheviques e que levaria à criação da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), celebraram-se esta terça-feira, dia 7. O PCP organizou um grande comício no Coliseu dos Recreios, em Lisboa, para assinalar a data. Jerónimo de Sousa disse, em cima do palco, que o mundo estava pior agora, sem o socialismo e sem a União Soviética.

Já antes, no Diário de Notícias, tinha escrito que a Revolução de Outubro “determinou grandes conquistas e avanços civilizacionais e libertadores para os trabalhadores e para os povos”. Mas não foram só os comunistas que aplaudiram a data. No PS, também houve deputados que não quiseram deixar passar em branco. Um deles, Tiago Barbosa Ribeiro, não se poupou nos elogios àquela que foi a primeira revolução comunista marxista do século XX: “A ‘mãe’ das revoluções” que é hoje “património das esquerdas”, escreveu.

“Entre alocuções apologéticas e críticas anti-comunistas, há espaço para uma celebração simbólica e afetiva no campo das esquerdas – porque a Revolução é património das esquerdas – e há também espaço para uma fervilhante reflexividade em muitas iniciativas académicas e culturais que tenho visto ao longo dos últimos dias. É bom que assim seja. A Revolução de Outubro, a ‘mãe’ das revoluções, foi objetivamente o acontecimento mais marcante do século XX. O seu impacto mudou a geopolítica da Humanidade. Foi um ‘game changer’ tão grande como a Revolução Francesa, em relação à qual falar do ‘grande terror’ parece – porque é – um anacronismo face ao que significou no curso da história”, escreveu o deputado socialista e presidente da concelhia do PS Porto.

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E continua, falando dos “acasos” e do contexto histórico pouco preparado da Rússia para receber aquela revolução, que acabou por “criar ondas de choque que perduraram e ainda perduram”, e enumerando os “ses” que podiam ter mudado o curso da história. “Não é possível postular como teria sido se Lenine não tivesse desaparecido precocemente ou se Trostky não tivesse sido assassinado. Talvez o PCUS não tivesse feito a ‘desestalinização’ no seu famoso XX Congresso nem fosse necessário, mais tarde, derrubar uma Cortina de Ferro. Mas também não teríamos tido o Exército Vermelho a dar um contributo decisivo para a derrota dos nazis, só para dar um exemplo, nem tão pouco existiria uma URSS a exercer força gravitacional para o desenvolvimento dos Estados Sociais no Ocidente ou para a emancipação das velhas colónias europeias”, escreve, para resumir que “a Revolução de Outubro é uma das chaves do século XX e uma das marcas mais poderosas da história do movimento operário”, que deve por isso ser “celebrada”.

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Questionado pelo Observador sobre a aproximação ao entendimento comunista da revolução, o deputado socialista desvaloriza sublinhando que se trata apenas de “um apontamento histórico”. “É assim que é entendido pela historiografia seja de que quadrante for. Foi um acontecimento que mudou o curso da história e que, à época, foi disruptivo”, diz.

Num registo diferente, também o deputado João Soares assinalou a data num post na sua página de Facebook, onde nota “os aspetos positivos” do “sonho utópico” pelo qual muitos milhares de pessoas deram a vida, mas onde lembra também que “deu origem a um poder totalitário”.

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Posted by João Soares on Tuesday, November 7, 2017

“A Revolução Bolchevique na Rússia, depois na URSS, deu origem a um poder totalitário, que se manteve até à perestroika. Há que reconhecer que deu, também, origem a um equilíbrio com o capitalismo que teve aspetos positivos. Como aliás o saldo, social, educativo, cultural, e científico, do comunismo no poder, também teve aspetos positivos. O comunismo foi, sobretudo depois da Revolução Soviética, um ideal, e um sonho utópico, pelo qual muitos milhares de mulheres e homens deram a vida. E o melhor das suas vidas. Também em combates, muitas vezes heróicos. Que merecem respeito, e uma memória, séria, e digna”, escreve.

Não querendo comentar as posições dos colegas da bancada, o deputado socialista Jorge Lacão afirma ao Observador que “não faz sentido elogiar os contornos da revolução sem referir a sua componente trágica”, ainda que reconheça o “registo histórico incontornável” da Revolução de Outubro, que significou uma “alteração profunda no enquadramento geoestratégico da Europa e do mundo e na conceção ideológica da luta dos trabalhadores”.

Também o deputado Ascenso Simões diz que a revolução bolchevique é indiscutivelmente uma “marca relevante para os movimentos socialistas e comunistas” e um “marco muito importante” na história mundial, mas que representou uma passagem muito “abrupta” de um regime “feudal” para um “regime socialista ‘esquisito’, que não tinha em conta as condições económicas em que se vivia”, e que deu depois origem ao “totalitarismo, de pensamento único e com restrições de liberdade”.

Tal como Francisco Assis que se afasta da celebração feita por Tiago Barbosa Ribeiro da revolução russa. Num artigo de opinião no Público, o eurodeputado socialista recorda os avisos de Léon Blum. O socialista marxista lutou, vencido, contra a corrente pró-leninista que acabou por vingar no movimento da internacional socialista. Para Blum, a ditadura iniciada com Lénine, “não é (era) simplesmente uma ditadura temporária de modo a permitir a conclusão dos últimos trabalhos de edificação de uma nova sociedade. A vossa ditadura é um sistema de governo estável, habitual segundo o vosso espírito e ao abrigo do qual vós pretendeis organizar todo o vosso trabalho. É esse o sistema de Moscovo”.

Assis, que no passado entrou em polémica com o Barbosa Ribeiro, sublinha:

“No próprio momento da sua concretização a Revolução Soviética afasta-se irreversivelmente de todos os seus antecedentes históricos acima referenciados. A confiscação de todo o poder por parte de uma vanguarda partidária anula qualquer perspetiva de debate pluralista, impede a afirmação de um qualquer modelo de constitucionalismo democrático.”