Lisboa está com dificuldades para se manter apresentável. E não me estou a referir aos graffiti (reparo até que tem havido um grande esforço a limpar alguns bairros), nem ao lixo na rua, nem à vasta quantidade de publicidade e branding, em neon e perspex, que está condenada a chocar com qualquer coisa Manuelina-Pombalina-RaulLina que não tenha sido construída no ano passado.

O problema são os turistas.

Estejam ou não os lisboetas contentes com o recente tsunami de turismo, não é fácil habituarmo-nos a tantas mudanças na cidade e em tão pouco tempo. Os passeios estão cheios de pessoas em férias. Ora, pessoas em férias têm o aspecto de estarem em férias, e dão a Lisboa o aspecto de um destino turístico de praia, em vez da fascinante cidade antiga, cheia de pessoas e coisas interessantes, que Lisboa é.

Para começar, temos as mochilas, de todos os tamanhos, que gritam “Cá estou eu!!!! Sou Turista!!!” Há as mochilas minúsculas, que funcionam como carteira e como alvo fácil para os carteiristas, e há as mochilas gigantes, que parecem carapaças de tartaruga e podem atirar ao chão duas ou três pessoas no passeio se por acaso o ocupante da carapaça espirrar.

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Chapéus há muitos. O que define o turista não é só o facto de usar quase sempre “baseball caps”, os quais nunca deram bom aspecto a ninguém na história do mundo. É o mero facto de usar chapéu. Tanto quanto uma mochila grita “turista!!”, também gritam os chapéus… e, já agora, as sandálias com meias, as camisas havaianas, a roupa khaki de out-door, os vestidos estampados com flores gigantes, os sacos de praia, os sarongues, os biquinis, e os chinelos. E a coroar tudo isso, aqueles narizes, ombros e costas com a cor das lagostas cozidas, que só de olhar quase nos fazem sentir doridos no lugar da pessoa.

Mas o problema dos turistas não é só a maneira como se vestem. É também o modo como interagem com a cidade. Há aqueles que vão pelo caminho a berrar um ao outro factos óbvios, com o ar de quem não está a perceber nada, incluindo o facto de nós entendermos tudo o que dizem. Há os que aparecem vestidos de khaki e que não sorriem, porque não estão inteiramente satisfeitos com a consciência ecológica do país. Há casais que empurram carrinhos de bebé pela calçada sob 40ºC, com os bebés a fritar lá dentro, enquanto eles se queixam de que Lisboa não é amiga das famílias. Há gangues de mulheres jovens que caminham lado ao lado nos passeios estreitos, como se fossem um muro, cada qual, depois de ter passado alguns dias online antes das férias, a tentar exceder as amigas no conhecimento dos melhores bares da cidade. Há bandos de homens que se estão nas tintas para tudo o que é melhor, e que só querem encontrar a cerveja mais barata. Há os que falam muito alto e devagar em inglês, para serem entendidos pelos nativos. E já vi um homem gordo, sem camisa nem t-shirt, de calções de natação e cerveja na mão, a passear estranhamente em Alcântara, como se estivesse ao lado da piscina.

E depois há dos outros, os que se portam bem, mas que mesmo assim ainda têm um aspecto que não condiz com nada de Manuelino-Pombalino-RaulLino, incluindo as coisas construídas no ano passado, por que parecem demais que estão em férias.

lisboalandiaaaa

Pessoas em férias nunca têm bom aspecto. Estão demasiadas relaxadas. Há demasiada carne branquíssima ou rosa choque à mostra, as roupas são sempre muito estampadas, e os chapéus dão-lhes um ar palerma.

Britânicos, Irlandeses, Americanos, Alemães, Dinamarqueses, Suecos, Holandeses, Franceses. Todos na mesma onda. Os italianos e os espanhóis são os únicos que escapam ao “ar de turista”. Talvez porque saibam como é viver num parque temático.

Não estou à espera que os nossos turistas se vistam com fatos e vestidos, e finjam que estão a caminho do escritório. De qualquer modo, Lisboa já não é aquela cidade de há uns anos, quando era impensável sair de casa a não ser vestido para uma cerimónia com o presidente da república… e graças a Deus que isso mudou.

Mas esta cidade é um centro vivo de artes, negócios e ciência… um facto desconhecido para a maior parte dos turistas. Por isso, precisamos que quem aqui vive e trabalha se sinta em casa, e não fora do lugar num campo de férias. Bastava que os turistas diminuíssem um pouco os sinais do “OLÁ, ESTOU EM FÉRIAS!!!”. Ajudaria os Lisboetas a sentirem que não são apenas os empregados do célebre parque temático “Lisboalândia”.

Não seria possível pôr uns cartazes no aeroporto avisar que Lisboa não é uma praia e que devem vestir-se a condizer com uma capital europeia?

(texto original inglês traduzido pela autora)

Would you please get dressed?

Lisbon is struggling to look pretty at the moment. It’s not the graffiti (and I notice there has been a big effort to clean up some districts). It’s not the rubbish. It’s not the overabundance of advertising, neon and perspex branding material that clashes with anything Manuelino, Pombalino, Raul Lino, or anything-ino unless it was built last year.

It’s the tourists.

Whether Lisboetas are welcoming the tourism boom or not, I think everyone is struggling to come to terms what has happened to their beautiful city. The pavements are crowded with people on holiday and people on holiday look like they’re on holiday, giving Lisbon the feel of a holiday resort, instead of a beautiful ancient city, a capital city thriving against the odds, a city full of interesting people and things.

There are the rucksacks, of all shapes and sizes that shout “Here I Am!!! I’m A Tourist!!” There are the tiny ones that double as a handbag and an easily accessible container for pickpockets, all the way up to the huge tortoise shell mobile homes that can knock three people off a pavement if the wearer sneezes.

Then it’s the hats. It’s not that most of them are baseball caps and baseball caps never looked good on a single human being ever. It’s the mere fact of wearing a hat. As much as rucksack screams “tourist!”, so does a hat. So do the socks and sandals, the Hawaiian shirts, the khaki mountain gear, the floaty flowery dresses, the beach bags, the sarongs, the bikini tops, the flip flops.

So do the fluorescent lobster coloured noses, backs and shoulders that make us all feel a bit ill.

It’s not just how people dress, but how they interact with the city. There are those who goes round shouting blindingly obvious facts to each other with their total failure to understand almost anything, including that we understand everything they are saying. There are the ones dressed in safari gear, doing their “I do not smile because I am unimpressed at your ecological record”. Young families arguing with each other while they struggle to cope with white-blond babies frying in their pushchairs, who don’t want to be wheeled round a city on terribly bumpy pavements on a blazing hot day, just waiting to complain to someone that Lisbon is not “young family friendly”. There are the gangs of young women who walk five abreast on the pavement, having spent days online before they arrived in a bid to outdo each other in knowledge of the best bars in town. There are gangs of young men who con’t care, as long as there’s cheap beer. There are those many who shout very slowly in English to make themselves understood. I have already spotted my first shirtless beer-gutted man of the year, with his fat top half uncovered by any hint of a string vest, his bottom half in swimming shorts, carrying an open bottle of beer in his hand at 10 in the morning, in Alcântara, weirdly.

And there are all the rest, who are perfectly good, nicely behaved people… but who still look awful, clashing with anything Manuelino, Pombalino, Raul Lino, or anything-ino, even if it was built last year, because they look like they are on holiday.

People on holiday never look good. They’re too laid back. There’s bright white or fluorescent pink flesh everywhere, ugly printed clothes and stupid hats. All of which wouldn’t matter so much, if this weren’t a city where people live and work and don’t want to feel like they’ve been transported overnight to Albufeira.

Britons, Irish,  Americans, Germans, Danes, Swedes, Dutch, French. They’re all as bad as each other. It is only the Italians and the Spanish who tend not to do the “holiday look” so much. They know how it is, already, to live in tourist theme parks.

It’s not that I want people to dress up in suits and pretend they’re going to the office. Anyway, it’s not as if Lisbon is still as it was years ago when it would be unthinkable to leave the house having not dressed up sufficiently to meet the president… and thank god for that.

But this city is a thriving centre for the arts and business and science that so many of those tourists don’t even imagine that it is.  For that, don’t we need Lisboetas who feel at home? Lisboetas who aren’t feeling pushed out? For the sake of the good temper of all Lisboetas, I would just like the tourists to tone the “tourist look” down a bit, to make Lisboetas feel less like staff at the theme park “Lisboalândia”.

Can’t we put up some signs at the airport?