Exmo Senhor
Ministro do Ensino Superior

Queria começar por lhe agradecer o vigor com que decidiu, da sua cabeça, onde é que as pessoas podem estudar. A decisão de eliminar vagas nas universidades e Lisboa e Porto por Decreto (ia escrever com minúscula, mas essas reservo-as para os meses do ano) é de uma sagacidade impressionante. Como grande estadista que é – só lhe falta o bigode para se comparar aos melhores – decidiu sozinho, sem consultar reitores, professores, alunos. E fez bem porque essa gente ia acabar por ser um empecilho e o nosso destino em qualquer caso já estava traçado por si, que sabe muito melhor o que é melhor para nós. É a vida pelo plano. Todos ficamos mais seguros sabendo que a sua mão forte nos guia. Poderíamos ser tentados a querer fazer a nossa vida como quiséssemos. Obviamente isto não iria correr bem. Essa ideia de ser preciso criar atractivos para que as pessoas se desloquem e fixem noutros pontos que não Lisboa e Porto, e cada um tomar as suas opções em função dos oportunidades que ali são criadas nunca iria dar certo. Para já porque assim temos mais liberdade. Não precisamos de pensar no assunto e basta seguir a sua esclarecida indicação.

É como naquele caso dos medicamentos, o INFARMED. Passavam a vida a queixar-se que o mercado de trabalho precisava de mais mobilidade. Os Senhores (já lhe disse das minúsculas?) chegam e dão mobilidade àquela gente toda, repare no conceito disruptivo, sem perderem o emprego. Não é para todos. Agora mobilizam-se para o Porto, amanhã para Vila Real de Santo António, e assim por diante. Andam a conhecer o país de acordo com o superior desígnio de sua Excelência e do Grande Líder e ainda se queixam. Há gente muito ingrata.

Pela minha parte só lhe agradeço a decisão e gostaria de sugerir outras que, na mesma linha, poderão contribuir para o mesmo fim, a bem da Nação.

Podia, também por decreto, desculpe, Decreto, passar todas as maternidades para o interior. É consabido que o número de nascimentos é ainda mais diminuto no interior que no resto do país. Mas se só houver maternidades no interior do país o assunto fica resolvido: a menos que pensem ter os filhos em casa, é fazer a trouxa. Se também as consultas de gravidez só puderem ser feitas no interior, é natural que os casais jovens se mudem para lá e talvez depois já não queiram voltar, que fazer as malas sempre é coisa que cansa, ainda por cima com crianças e fraldas e tudo.

Aliás essa coisa de voltar também não percebo porque é que há de ser deixada à decisão individual. Afinal todos sabemos os perigos do individualismo. Era muito melhor se cada família pedisse uma licença para comprar casa numa determinada área. Dirigíamos o requerimento a Vossa Excelência, que depois de conferenciar com o Grande Líder, verificava se de acordo com o Plano que Vossas Excelências têm para a Nação aquela família deveria viver em Vila Nova da Baronia ou em Carrazeda de Ansiães.

Até porque em Carrazeda de Ansiães estariam certamente próximos de uma maternidade. Logo que Vossa Excelência concedesse à família autorização para ter filhos e a mesma fosse concedida poderia começar a povoar o interior. E ao menos tinham garantia de que os filhos podiam frequentar o ensino superior ao pé de casa. É verdade que não há Universidade em Carrazeda de Ansiães, mas há um politécnico, que é quase a mesma coisa. E mesmo que não houvesse. Por este andar, quando os miúdos tiverem idade já os ATL’s estão a dar diplomas de curso superior.

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