“Páre, páre, páre! Dá para voltar atrás?”

O destino era o Mercado Modelo, ícone de Salvador. Depois eu ia subir no Elevador Lacerda, que liga a zona baixa à cidade alta, e procurar no Pelourinho os portugueses que chegaram para ver o Alemanha-Portugal desta segunda-feira. A sugestão tinha sido do taxista, primeiro ir à zona do porto e depois subir, porque eu ia directamente ao local “que parece mesmo Lisboa”.

No caminho, uns pinos laranja e brancos roubavam uma faixa à Avenida Contorno. A linha branca da berma era precisa para servir de linha lateral a um improvisado campo de futebol. O jogo era no parque de estacionamento na zona do Viaduto do Canela. Por baixo do viaduto a “torcida” gritava e apludia.

Quando saí do táxi o árbitro, Ronaldo, apitou para o intervalo. Ronaldo, outro que não o árbitro, aproveitava o tempo morto para, atrás de um dos pilares do viaduto, vestir os calções de jogo. Pedrinho também. Vieram da Vila Brandão, e jogavam a seguir, defendendo as cores da equipa “Menino da Vila”. A descansar estavam as equipas do Furacão e do Ratueira. O Ratueira jogava em casa, é o clube dos moradores do bairro do Canela.

De máquina fotográfica ao peito, Everson ia registando os momentos dos jogos. “Tem 10 anos que não funciona nenhum tipo de evento aqui. Aí eu resolvi fazer um campeonato, para motivar a comunidade”. Everson mora no Canela, já deu aulas de Jiu-Jitsu a crianças, “para ajudar a integrar”, e agora meteu-se na aventura do torneio de futebol. Não pertence a nenhuma associação ou organização, “tenho mesmo gosto em ajudar a comunidade”.

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Ronaldo, o árbitro, logo após dizer que “não é complicado apitar aqui não, tem alguns contactos, mas basta só não deixar partir para a violência”, apita para o início da segunda parte.

O Furacão reduziu logo nos primeiros minutos, depois de ter saído para o intervalo a perder por 2-0. Muitas vezes a bola saiu do campo e foi para a estrada. Algum jogador saiu também, atravessou a Avenida e depois voltou para o terreno de jogo, feito de terra batida e algum cascalho preto. O, muito improvisado, estádio tem até nome: Arena Maracascalho.

O torneio tem a duração de três, quatro meses e todos os domingos há cinco jogos. São dez equipas. “Há três meses eu organizei um outro torneio, só de um dia, e foi um sucesso. Então decidimos avançar com esse, de ponto corrido, dez times, e está correndo muito bem. É o futebol a unir as pessoas”. Com o Campeonato do Mundo aí, Everson admite que a acção ganhou outra relevância, “a Copa foi uma das influências. Enquanto eles jogam lá a gente joga aqui!”.

Eles jogam, e outros torcem. Um muro que fica por trás de uma das balizas serve de bancada. Toda a gente “toma chope” e dá indicações. É a festa do futebol, num parque de estacionamento.

Ah, o Ratueira ganhou o jogo, 3-1. Ronaldo e Pedrinho entraram em campo a seguir para defenderem as cores do “Menino da Vila”.