Foi em Cascais que, a 25 de junho de 1944, nasceu Ricardo Espírito Santo Silva Salgado. No sangue carrega o selo da banca. É bisneto de José Maria do Espírito Santo Silva, o fundador do Banco Espírito Santo, e neto de Ricardo Espírito Santo Silva, o banqueiro do Estado Novo e patrono das artes em Portugal.
Foi na Lapa, zona nobre da capital, que Ricardo Salgado passou os primeiros anos de vida. Passou pela escola pública e pelo Liceu Pedro Nunes. Entra no Instituto Superior de Ciências Económicas e Financeiras, actual ISEG, da Universidade Técnica de Lisboa, em 1969 e saiu de lá economista. Cumpriu o dever militar na Marinha Portuguesa e só depois se juntou ao Banco Espírito Santo e Comercial de Lisboa (BESCL), em 1972. Até que rebentou a Revolução de 25 de Abril de 1974. O banco da família, bem como a seguradora Tranquilidade, foram nacionalizados. Ricardo Salgado sai do país.
Primeiro, a partir do Brasil, participou na reconstrução do Grupo Espírito Santo, depois, na Suíça, continuou a obra até regressar novamente à pátria para investir. Com o tio, Manuel Ricardo Espírito Santo, ajuda a reconstruir, na década de 1980, o grupo financeiro.
Em 1986, é criado o Banco Internacional de Crédito (BIC), quando ainda não eram permitidas as reprivatizações. Mais tarde, o banco é absorvido pelo BES. Foi, aliás, esta instituição financeira que marcou o regresso da família aos negócios. Com a ajuda dos franceses do Crédit Agrícole, em 1989, o Grupo Espírito Santo comprou em privatização a Companhia de Seguros Tranquilidade e, entre 1991 e 1992, ainda em parceria com os investidores franceses, recuperou o Banco Espírito Santo.
Desde essa altura Ricardo Salgado tem sido o presidente executivo do banco. Mas não só. Desde presidente da comissão executiva e vice-presidente do conselho de administração do BES, a membro do conselho superior do Grupo, acumulando funções com as de presidente do conselho de administração do Espírito Santo Financial Group (sedeado em Luxemburgo) e do Banco Espírito Santo de Investimento (BESI). Foi também Ricardo Salgado que internacionalizou o banco e o levou até Africa, Brasil e Espanha.
Ao longo da sua gestão, muitos lhe reconheceram mérito. Em entrevista ao Público, de 2010, Jacinto Nunes, ex-governador do Banco de Portugal, reconheceu que “sem grandes rasgos, ele tem feito uma gestão segura e ponderada”. Também Joe Berardo disse, na altura, ter “grande consideração” por Ricardo Salgado. “É um banqueiro que é também um homem de negócios, que compreende muito bem os clientes quando estão apertados e percebe que as coisas não correm sempre como se espera.”
Em 2011, um perfil publicado no Diário Económico mostrava um Espírito Santo atípico, que não frequenta os sítios da “beautiful people”. Terá gosto por neve e ski e paixão por barcos pequenos de regatas. Neste perfil, mostra-se um banqueiro pouco elitista que tem simpatia pelos fracos e oprimidos. Em termos políticos, o jornal descreve Ricardo Salgado como um diplomata, com a secreta missão de ajudar a construir o país. Um banqueiro do regime, sempre disponível para colaborar com os governos.
Quando o país foi sujeito ao resgate da troika, o BES foi o único dos único entre os três maiores bancos privados portugueses, em 2012, a aumentar capital recorrendo apenas aos acionistas e ao mercado de capitais e não ao balão de oxigénio que os credores internacionais e o Estado tinham destinado para a banca.
É casado com Maria João Calçada Bastos, de quem tem três filhos, Ricardo, Catarina e José. Líder de um clã poderoso que se mantém há quatro gerações, mas que ainda assim não é imune a controvérsias públicas. Em 2013, a polémica estalou quando se soube que Ricardo Salgado tinha efetuado três retificações à declaração de imposto sobre o rendimento das pessoas singulares (IRS) relativa a 2011, o que resultou num pagamento adicional ao fisco de 4,3 milhões de euros.
A mais recente relaciona-se com as irregularidades detetadas numa das “holdings” do grupo, a Espírito Santo Internacional (ESI), nomeadamente com a notícia de que existia um buraco contabilístico de 1,3 mil milhões de euros. Em entrevista ao Jornal de Negócios, Ricardo Salgado disse desconhecer a situação, mas o contabilista garantiu, em entrevista ao Expresso, que o banqueiro sabia de tudo.
Terão sido as irregularidades nas contas a precipitar a saída do banqueiro e a motivar mudanças na gestão do Banco Espírito Santo. Ricardo Salgado deixa a presidência executiva do banco, dias antes de completar 70 anos.