Está de fato, camisa e gravata. Imagem de um señor. A mesma que passava quando calçava chuteiras e prendia a camisola dentro dos calções. Impecável. É assim a pessoa de Emilio Butragueño. O futebolista, no relvado, também o era. E a prová-lo estão os 14 anos de carreira feitos sem ver um cartão vermelho. “Com este corpo, ia fazer mal a quem?”, perguntou. E o Observador respondeu — à Dinamarca, a quem marcou quatro golos num Mundial.
Isso foi em 1986, nos oitavos de final da Copa que o México acolheu. Emilio Butragueño tinha 23 anos. Nesta quinta-feira, em 2014, o hoje diretor das Relações Institucionais e da Escola Universitária do Real Madrid, com 50 anos, esteve na Universidade Europeia, em Lisboa, para falar sobre competências profissionais no desporto. E não só.
El Buitre — o abutre, como a alcunha espanhola o batizou –, só impôs uma regra: a conversa não poderia tocar no Mundial que, até domingo, ainda fará a bola rolar no Brasil. De resto, houve um pouco de tudo. A começar e a terminar em Don Alfredo, por supuesto. O senhor Di Stéfano, que faleceu na última segunda-feira e que, como treinador, foi buscar Butragueño às reservas do Real Madrid e lhe deu a estreia na primeira equipa, em 1984. “Acelera-me o coração”, admite, ao pensar no dia em que, aos 20 anos, a lenda o chamou para entrar em campo e marcar dois golos ao Cádiz.
Foram os primeiros entre 107 que fez em 463 partidas com os merengues. Sobre ele, Alfredo di Stéfano chegou a dizer que tinha “o golo no corpo”. Uma visão “muito generosa”, avaliou Butragueño, que marcaria outros 26 golos nos 69 jogos que cumpriu com a seleção espanhola. Pelo meio, chegou aos oitavos de final de dois Mundiais consecutivos — o de 1986 e o de 1990. “É o momento crítico da carreira de um jogador”, defendeu. “Tens de estar em forma, jogar bem e esperar que o treinador de chame”, resumiu, antes de classificar como “extremamente maravilhoso” a altura em que, no relvado de um Mundial, se ouve o hino nacional a tocar.
Tão maravilhoso quanto o póker que, no Mundial do México, em 1986, deixou em campo frente à Dinamarca de Michael Laudrup — já agora, num só jogo marcou os mesmos golos que Portugal fez no Mundial de 2014. “Tive sorte. Nem num treino era normal marcar quatro golos. Foi um dos dias mais importantes da minha carreira, pela repercussão internacional que teve”, admitiu.
A mesma que faltou à Quinta del Buitre, alcunha, inspirada no avançado, que foi colocada ao grupo de cinco jogadores (além de Butragueño, eram Sanchíz, Michel, Pardez e Vásquez) saídos da cantera do Real Madrid que, entre o final da década de 80 e o início da de 90, só não conseguiram conquistar uma Liga dos Campeões. De resto, venceram seis ligas espanholas (entre 1985 e 1990, de forma consecutiva) e duas Taças UEFA (também seguidas, em 1985 e 1986). Foi este o rasto que o abutre ajudou a deixar no clube meregue.