O arquiteto Eduardo Souto Moura lamentou nesta terça-feira a falta de projetos em Portugal, que tem levado à migração de jovens arquitetos portugueses para outros países, admitindo que ele próprio gostava mais de estar a trabalhar em iniciativas nacionais. “Prefiro trabalhar no meu país, onde conheço melhor os meios, a geografia, os materiais, e as pessoas, porque a arquitetura é resolução de problemas, e quando estamos mais próximos é mais fácil”, afirmou Souto Moura em declarações à Lusa, do Brasil.
Souto Moura, que está em Brasília para participar em um encontro de Arquitetos e Urbanistas do Distrito Federal, prevê que muitos escritórios de arquitetura ainda poderão fechar nos próximos anos em Portugal, caso não haja novos investimentos. “O que vai acontecer é que os escritórios vão fechar em Portugal. Os cursos são bons, mas servem hoje para formar pessoas que depois migram”, lamenta o vencedor do prémio Pritzker de 2011 – considerado o Nobel da Arquitetura -, ressaltando a importância de inversões estatais na área de construção civil, para fazer a economia “mexer”.
O arquiteto defende serem precisos bancos que fomentem a construção e “vontade de investimento”, quer público, quer privado, e destacou que a construção civil é uma área com grande “inércia”, na qual a crise a princípio pode demorar a chegar, mas que também é uma das últimas a conseguir sair dela. “Há luz no fim do túnel, mas não é um decreto-lei que muda isso. No fundo precisa que as pessoas voltem a ter um estado de conforto e otimismo para investir”, defendeu.
Aos jovens portugueses que não optam por buscar trabalho no Brasil, o arquiteto aconselha que busquem cidades alternativas, fora das grandes metrópoles, principalmente na região central do Brasil, onde há cidades com recursos financeiros, mas ainda carentes em obras de infraestrutura. “Os portugueses têm de mudar a mentalidade, não podem chegar em São Paulo e Rio de Janeiro, que já estão cheias de novos arquitetos a buscar trabalho. Têm de estar dispostos a deslocar-se para cidades do interior”, sugeriu.
Apesar de lamentar a perda dessa mão de obra, o arquiteto tenta matizar o momento atual com o ganho cultural promovido pela experiência de se trabalhar noutra cultura, recordando os grandes arquitetos que trabalharam fora dos seus países de origem, entre eles Oscar Niemeyer, que se auto-exilou em França durante a ditadura brasileira, e a italiana Lina Bo Bardi, que se radicou no Brasil, fugindo dos efeitos da II Guerra Mundial. “A arquitetura é sempre fruto de cruzamento de culturas. Temos que ser otimistas e tirar partido desse cruzamento de informação”, defendeu.
Entre os projetos liderados por Souto Moura que estão hoje em andamento figuram estações de metro e o arranjo de uma praça em Nápoles, na Itália, projeto feito em parceria com Siza Vieira; projetos de habitação em Marselha e Bordéus, em França; e um pequeno museu em homenagem ao escritor Thomas Berger, na Austrália.
O seu preferido, no entanto, no qual tem se debruçado em busca de novas soluções, é a Barragem de Foz Tua, na região do Alto Douro Vinhateiro, norte de Portugal, que precisa ser compatibilizada com a paisagem, listada como património mundial pela Unesco.
“Os próprios produtores de vinho do Porto percebem a importância de que os fios passem pelas partes mais baixas de sua propriedade, para que haja menos impacto visual. É um sentido de cidadania diante da paisagem, um conceito completamente novo”, celebrou Souto Moura, que estuda atualmente uma rota alternativa para que os fios da hidroelétrica não prejudiquem a paisagem.