Jogar para não deixar fugir o líder e jogar para se aproximar dele. As duas tarefas implicam o mesmo, ganhar. Mas são distintas. E não o são apenas pelas mexidas que provocam numa classificação, num campeonato que dá pontos em troca de resultados e ordena as equipas consoante o que vão fazendo no relvado. Porque o futebol, já se sabe, não é jogado só com os pés: o que está dentro da cabeça importa, e muito. E vestir o equipamento, calçar as chuteiras, ir aquecer e entrar num jogo para manter uma distância é bem diferente do que jogar para a encurtar para um ponto.

E isto, a bem ou a mal, entrou nas cabeças de todos os jogadores que, no Funchal, equiparam de camisola rosa e tinham dragão como alcunha. Porque ali, no estádio do Nacional da Madeira, esses jogadores talvez já estivesse alinhados no túnel, com o relvado à vista, quando aos ouvidos lhe chegou uma notícia — o Benfica acabara de perder em Vila do Conde e, de repente, o líder que antes fugia a quatro pontos podia, dali a hora e meia, ficar apenas a um de distância. E na cabeça isto pesa, ou podia pesar.

Nacional da Madeira: Gottardi; João Aurélio, Rui Correia, Zainadine Junior e Sequeira; Ali Ghazal, Saleh Gomaa e Christian; Luís Aurélio, Wyllian e Lucas João.

FC Porto: Helton; Danilo, Maicon, Ivan Marcano e Alex Sandro; Casemiro, Hector Herrera e Evandro; Tello, Brahimi e Aboubakar.

Mas só havia uma maneira de o descobrir e essa, para os dragões, só podia ser uma: ter a bola. Tê-la, passá-la até mais não, levá-la a passear no relvado e fazer com os tropeçasse o menor número de vezes possível em pés madeirenses. O FC Porto conseguiu fazê-lo, embora com mais calma que o habitual. Ao invés da pressa que às vezes aparece em quem corre para chegar perto do líder, notava-se a cautela de quem pretendia fazer as coisas bem de mais. Os dragões tinham muita bola, sim, mas a velocidade a passá-la não era muita.

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Com isto, e com um Nacional, pelo meio, fechado na sua metade do campo e à espera do que os portistas fizessem, o perigo demorou a aparecer. Casemiro e Herrera acertavam quase todos os passes, mas não os tornavam rápidos. O brasileiro, aos 12’, acelerou um remate num livre que bateu, mas não acertou na baliza. Tello esticava de um lado, quase sempre à direita, onde sprintava e fintava com bola, mas de remates, nada. Brahimi, do outro lado, foi o primeiro a perceber que Evandro, ao meio, pouco se mexia e raramente tocava na bola. Por isso lá foi o argelino, jogada atrás de jogada, a pedir a bola para, com ela, fazer muitos toca-e-vai à frente da área e inventar tabelas, sobretudo, com Aboubakar ou Herrera.

O argelino da ginga com a bola colada ao pé, contudo, abusava. Perdia bolas e, nos remates, não acertava na baliza, como o mostrou aos 35’. O Nacional, pelo meio, mantinha-se preocupado em defender e as bolas que recuperava raramente eram protegidas por Lucas João o corpanzudo avançado luso-angolano a quem, lá na frente, os madeirenses confiavam a bola quando altura era para contra atacar.

Até que, pelas próprias cabeças, ou pelas instruções que, desde o banco, Julen Lopetegui não parava de gritar, os dragões perceberam que pouco uso estavam a dar às motas que tinham nas laterais. Tello e Brahimi, por tanto, passaram a pedir a bola uns metros mais dentro, à frente da área, para ali esperaram pelas correrias de Danilo ou Alex Sandro. Foi este, o canhoto, a tabelar com Evandro, aos 38’, e rematar já perto da linha de fundo para Gottardi defender a custo.

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Depois, do outro lado, Tello também esperou pelo sprint de Danilo, aos 45’. Mas ignorou-o: após receber um passe de Herrera, deu uma pedalada, apontou a bicicleta para a esquerda, colocou a bola a jeito do pé canhoto e, à entrada da área, rematou em jeito e marcou. Um golo, o sétimo do espanhol no campeonato, e, sobretudo, um senhor golaço. 1-0 para o FC Porto e o Benfica, ao intervalo, já parecia estar mais perto. Na cabeça dos dragões, as que iam matutando essa hipótese, os encarnados terão ficado mesmo ao tal ponto de distância que perseguiam na Madeira. E quando voltaram do descanso, os portistas pareciam querer garantir isto mesmo

Porque logo aos 48’ houve uma falta, bem perto da área do Nacional, e Maicon fez cara séria, ajeitou a bola, recuou uns metros e concentrou-se. O que dali saiu foi uma bomba que só a barra da baliza de Gottardi não deixou explodir nas redes. Os dragões entravam fortes, ainda mais donos da redonda, que agora tinham à volta de 70% do tempo. Mesmo ao gosto de Lopetegui, que quis reforçar essa tendência quando trocou Casemiro pelo acerto dos pés de 18 anos de Rúben Neves.

Em teoria, fazia sentido.

Mas a teoria é mais vezes inimiga do que amiga da prática e, logo a seguir, aos 56’, outro livre, este para o Nacional, viu a canhota de Christian bater numa bola que só não deu golo porque Helton ganhou asas para a desviar da baliza. E foi, neste remate e nesta ameaça, que um despertador tocou nas cabeças dos madeirenses montados por Manuel Machado — começou-se a ver o Nacional que fizera “um grande jogo na Taça” e “merecia mais” contra o Sporting, tal como Lopetegui o dissera, antes da partida.

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Os passes tornaram-se atinados, os contra ataques passaram a acertar nos passes e a velocidade apareceu nas jogadas que, aos poucos, foram partindo a equipa do FC Porto, cujo meio campo encostava na área adversária a confiar que ali recuperaria logo as bolas que fosse perdendo. Em suma, o Nacional acelerou o jogo que, como todos os outros, os dragões queriam manter a seu gosto, ao seu ritmo. Mais bolas, porém, iam escapando aos dragões à medida que o relógio caminhava e, Saleh Gomaa, egípcio que tem cola no pé direito, tratava de as remetar para ataques rápidos. Uma delas, aos 62’, correu-lhe mal. Porque foi parar ao pé esquerdo de Sequeira, que a cruzou tensa para a área e viu Maicon ficar parado a vê-la, Marcano a não esticar a perna para a cortar e Wagner Borges, perto do segundo poste, a rematá-la para a baliza. Empate, 1-1 e, ao fim de sete partidas, os dragões voltavam a sofrer um golo.

O ponto, o tal que, no final do jogo, poderia ser o único a se intrometer entre o FC Porto e o Benfica, passava a ter a companhia de mais dois. O alarme tocou na cabeça dos dragões e da de Danilo, que aos 66’ disparou uma arrancada que Tello viu e à qual lhe juntou a bola. O brasileiro, na passada e de primeira, rematou-a ao poste direito da baliza de Gottardi. No minuto seguinte foi Aboubakar, o camaronês que faz do colombiano Jackson, a rematar para o guarda-redes defeder. O jogo, agora sim, partia-se e o Nacional, por isso, aproveitava.

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E um contra ataque, aos 72’, levado à boleia de Gomaa só não deu maior proveito porque, depois do egípcio soltar em Wyllian e de o brasileiro cruzar a bola rasteira e bem redonda para a área, Lucas João, sozinho e a dois metros da baliza, chutou-a por cima. Os dragões iam deixando de ser intensos e, com a fome de vitória, cada vez menos tranquilos no momento de pensar o que fazer à bola e quais os melhores caminhos para ela ser rematada contra a baliza do Nacional. Só os raides de Ricardo Quaresma, que com fintas se ia livrando de Sequeira, davam cruzamentos que nunca fizeram a bola chegar a Aboubakar.

O FC Porto caçava o ponto ao qual tanto queria reduzir a perseguição à liderança e o Nacional, sentido a entrar no bolso um ponto vindo do empate, foi juntando os jogadores e deliberando mais sobre as jogadas em que escolhia contra atacar. Até ao fim só Rúben Neves, aos 90’, disparou um remate para as mãos de Gottardi. E pronto, acabava. Os dragões, que tinham começado esta hora e meia de bola a rolar a quatro pontos do Benfica, passaram, a meio, a estar a um e, no final, estavam a três — dois pontos além da distância a que os jogadores jogaram para estar. A equipa, portanto, não aproveitou como podia o tropeção que os encarnados deram em Rio Ave.

Mas Julen Lopetegui, no final, bem o lembrou: “Pela primeira vez em quatro meses dependemos de nós.” E tem razão — daqui a três jornadas (24 de abril) há um Benfica-Porto onde, se a distância se mantiver até lá, os dragões passarão a liderar o campeonato caso vençam por mais de dois golos de diferença. Será isto que o treinador quererá colocar na cabeça dos jogadores. E talvez outra coisa, como também o disse: “Uma equipa que pretende ser campeã tem de superar a ansiedade.”