A Fundação Bial anunciou esta quarta-feira que o Grande Prémio Bial de Medicina, no valor de 200 mil euros, foi entregue à equipa coordenada por Miguel Seabra, que se demitiu na terça-feira de presidente da Fundação para a Ciência e Tecnologia.

Miguel Seabra demitiu-se invocando razões pessoais, tendo o seu pedido sido aceite pelo Ministério da Educação e Ciência. O Observador sabe que essas razões pessoais se prendem com problemas de saúde.

O trabalho premiado “Da descoberta do gene à terapia genética em 20 anos: o caso da coroideremia, uma degeneração hereditária da retina” é o resultado da investigação a uma doença genética rara, que afeta a retina e leva à cegueira de indivíduos do sexo masculino, sendo responsável por cerca de 4% dos casos de cegueira no mundo.

Miguel Seabra e a sua equipa descobriram que “doentes com coroideremia não têm a proteína REP-1, produzida a partir do gene CHM, cujas mutações causam a patologia”. Baseados em terapia génica, realizaram um ensaio clínico que envolveu a injeção de um pequeno vírus que transporta o gene CHM nas células da retina dos doentes. O vírus produz a proteína REP-1 em falta nessas células e assim impede o avanço da degeneração da retina.

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Os autores do trabalho referem que “os primeiros resultados publicados em 2014 são muito positivos: vários doentes mostraram melhorias reais na sua visão. É expectável que nos próximos cinco anos a terapia génica venha a ser um tratamento curativo generalizado para doentes com coroideremia. Se assim for, esta doença genética será uma das primeiras a nível mundial a poder ser tratada de forma curativa e não apenas sintomática, abrindo caminhos para a cura de outras doenças genéticas do foro ocular”.

A equipa de Miguel Seabra, que é também professor catedrático da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de Lisboa e um dos principais cientistas internacionais na área de medicina molecular e celular, é composta pelas investigadoras Tatiana Tolmacheva, Sara Maia e Cristiana Pires.

Portugueses consomem sal a mais

De acordo com a Fundação, o Prémio Bial de Medicina Clínica 2014 distinguiu um trabalho de investigação coordenado por Jorge Polónia, professor da Faculdade Medicina da Universidade do Porto, em colaboração com os médicos Luís Martins, Jorge Cotter, Fernando Pinto e José Nazaré.

“A problemática do sal em Portugal na última década: Avaliação do consumo de sal, das fontes alimentares, da relação com doença cardiovascular, das políticas de saúde e dos benefícios obtidos em 10 anos” é o resultado de uma década de trabalhos pioneiros que aliam a investigação científica a estratégias de intervenção de saúde pública.

O trabalho premiado confirma o elevado consumo e os riscos cardiovasculares do excesso de ingestão de sal em Portugal, algo que para os autores pode ser visto como um problema de verdadeira toxicodependência.

O real consumo de sal dos adultos (10,7 gramas de sal por dia) e das crianças 10-12 anos (7,9 gramas diárias de sal) é cerca do dobro do recomendado pela Organização Mundial de Saúde que, recentemente, no Global Status Report — 2014 reivindicou uma redução de 30% do consumo de sal, sendo este um dos nove objetivos para a prevenção e controlo das doenças não transmissíveis em todo o mundo.

O consumo excessivo de sal está associado a doenças como a hipertensão, o endurecimento dos vasos, a perda de albumina no rim e hipertrofia do coração, diabetes e obesidade e a uma redução do efeito dos medicamentos que tratam a hipertensão. Este consumo excessivo aumenta em 3,4 vezes o risco da principal causa de morte em Portugal, o acidente vascular cerebral (AVC).

A redução do consumo de sal (-1,2 gramas por dia) observada na última década pode ter contribuído (para além do melhor controlo da hipertensão) para a diminuição de 43% da mortalidade por AVC verificada em Portugal neste intervalo. Tal está de acordo com as estimativas internacionais que apontam que a redução da ingestão salina de três gramas diárias permitiria evitar anualmente em Portugal 2.035 mortes cardiovasculares.

A edição de 2014 do Prémio BIAL distinguiu ainda duas obras com menções honrosas, no valor de 10 mil euros cada.

“Beyond glutamate antagonists: new therapeutic strategy against glutamate excitotoxicity based on blood glutamate grabbing” é o título do trabalho de José Castillo, Francisco Campos e Tomas Sobrino do Laboratório de Investigação em Neurociências Clínicas do Hospital Clínico e Universitário de Santiago de Compostela, Espanha.

A segunda Menção Honrosa do Prémio BIAL 2014 foi atribuída ao trabalho “Embolização das artérias prostáticas no alívio dos Sintomas do Trato Urinário Inferior em doentes com Hiperplasia Benigna da Próstata “, de Tiago Bilhim, professor de Radiologia na Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de Lisboa e Radiologista no Centro Hospitalar de Lisboa Central e João Bexiga Pisco, professor jubilado da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de Lisboa.

Os prémios serão entregues numa cerimónia a realizar esta quarta-feira no Polo das Ciências da Saúde da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra, presidida pelo Presidente da República.