Apesar de ter ter admitido a possibilidade de alterar a Constituição para que o Presidente da República passe a nomear o governador do Banco de Portugal, o PS considera que mesmo que venha a constituir Governo no próximo outono, a revisão da Constituição não é uma “prioridade” e que a lei fundamental em vigor “representa um equilíbrio razoável” para Portugal. Já o PSD, apesar de considerar que a Constituição “representa uma dificuldade significativa face aos desafios do país”, não acredita em qualquer entendimento com o PS.
Para aprovar alterações à Constituição é necessária uma maioria de dois terços dos deputados, um entendimento que implica consenso entre os dois maiores partidos, já que um único grupo parlamentar nunca é suficiente para mexer na lei fundamental. E esta necessidade de concertar posições é para o PSD a maior dificuldade para alterar a Constituição na próxima legislatura. Ao Observador, José Matos Correia, vice-presidente do PSD e professor universitário, afirma que a Constituição se tornou um problema devido às considerações aí inscritas sobre a organização económica do Estado e a afirmação de serviços públicos “tendencialmente gratuitos”.
“Como é que os serviços públicos podem ser igualmente gratuitos para uma pessoa que ganha 400 euros e para uma pessoa que ganha 400 mil?”, questiona o social-democrata, respondendo que o importante é proteger quem não pode pagar. A alteração desse ponto foi uma das propostas do PSD em 2010, quando a revisão foi terminada subitamente devido à realização de eleições. Agora, Matos Correia considera difícil retomar o diálogo após as legislativas deste ano. “A posição do PS é clara. Não há acordo para alterações à Constituição”, afirma o deputado. Matos Correia diz ainda que “não vale a pena abrir uma revisão constitucional se o resultado vai ser zero”, já que os deputados têm de acordar nas alterações e ter a maioria de dois terços em plenário.
Já o PS afirma que mudar a Constituição não é uma prioridade. “Não é a Constituição que o CDS e o PSD gostariam, mas tem um texto adequado”, garante o deputado socialista Vitalino Canas ao Observador, dizendo que numa “altura complicada” para o país, a Constituição provou ser um garante, fazendo com o Governo recuasse muitas vezes nos cortes e medidas previstas nos vários Orçamentos do Estado. A existirem, essas alterações têm de ser “cirúrgicas”, embora nem sequer constem num “horizonte próximo” de possível governação de António Costa.
Mudanças que tardam para a direita… e para a esquerda
O CDS, que se opõe ao texto da Constituição desde a sua aprovação em 1976, considera que a próxima legislatura é “um bom momento” para mudanças, caso a maioria continue a dominar o Parlamento. “A Constituição portuguesa deve ser a constituição europeia mais longa e das que está mais desatualizada”, afirmou o deputado e vice-presidente do CDS, Abel Batista, ao Observador, defendendo que a lei fundamental deve permitir que haja “liberdade de escolha em termos políticos”, enquanto o preâmbulo deste documento continua a defender o ” caminho para uma sociedade socialista”. “O momento histórico não é o mesmo, é preciso que haja uma limpeza dessa visão política e da visão geoestratégica patente na Constituição”, argumentou.
O deputado centrista justificou a falta de mexidas nesta legislatura com “a situação complicada do país”, mas afirma que caso a maioria ganhe e haja tranquilidade no país, deve apostar-se numa revisão. “Passada esta fase mais crítica, é um bom momento para se proceder a mudanças. Especialmente quando se tem como exemplo os últimos anos e as dificuldades que esta Constituição colocou ao Governo”, afirmou o dirigente centrista.
Também Paulo Teixeira Pinto, que em 2010 entregou a Pedro Passos Coelho um anteprojeto de revisão constituição, afirma que a Constituição não se pode manter nos atuais termos. “Sou defensor da estabilidade institucional. O problema é que não é por se ficar parado no tempo que o tempo pára”, disse o antigo secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros ao Observador.
No mesmo sentido, Carlos César, presidente do PS, disse esta semana que como cabeça de lista dos Açores e possível deputado na próxima legislatura, vai defender a posição favorável dos Açores na “revisão constitucional”, que poderá acontecer após as eleições. No entanto, Bacelar de Vasconcelos, membro do Secretariado Nacional do PS, garantiu ao Observador que “ainda não há neste momento qualquer discussão” sobre a revisão constitucional no Rato, assim como nada que aponte “concretamente” para esse objetivo.
Nota: Na versão anterior deste texto, Paulo Teixeira Pinto foi identificado como ministro, quando foi secretário de Estado.