Este podia ser mais um texto sobre uma jovem empresa portuguesa com um conceito original: mostrar o melhor que o país tem para oferecer usando, para tal, a bicicleta como meio de transporte. Contava-se a história, falava-se com os responsáveis, ilustrava-se com algumas fotos e, melhor ou pior, a coisa ficava feita. Mas não. Este texto saiu tanto das mãos do jornalista que o escreveu como das respetivas pernas. E tudo começou com esta torta de Azeitão.

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O doping de quem já não pedalava há uns meses e tinha a Serra da Arrábida para subir.

O desafio foi lançado por Pedro Rocha e Ricardo Costa, responsáveis pela Live Love Ride – Portugal Bike Tours: uma volta de bicicleta na zona da Arrábida, com partida e chegada a Azeitão — sem esquecer, claro, a torta da praxe, para dar força antes da viagem. Afinal, dificilmente se arranjaria melhor forma de saber como é que a empresa executa aquilo a que se propõe no seu site.

Somos uma agência que realiza bike tours em Portugal, direcionada para todos os amantes das bicicletas que queiram descobrir o melhor do país. O nosso objetivo é desenhar viagens de bicicleta incríveis, dedicadas a explorar os trilhos e estradas portuguesas. Acompanhados por guias ciclistas locais, você irá conhecer a riqueza cultural e histórica do país, saborear a gastronomia e os vinhos portugueses e relaxar em hotéis de charme e SPAs.

Pedro e Ricardo não escolheram, propriamente, um percurso meigo para as pernas. Diriam, mais tarde, que teve tudo a ver com a impressão que queriam causar. “Quando a viagem é fácil a pessoa diverte-se mas aquilo não lhe fica gravado na memória da mesma forma do que quando faz um percurso mais exigente”. É um facto. Quem sofre para pedalar até ao topo do Miradouro das Antenas, em plena Serra da Arrábida, nunca mais vai olhar para a vista sobre as praias da região da mesma forma. Mas já lá chegaremos, desta vez sem suar a camisola.

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O percurso proposto e a respetiva altimetria. Tudo somado, cerca de 1000 metros a subir. Meia Serra da Estrela, portanto.

Nesta, como em qualquer outra viagem organizada pela Live Love Ride, o ciclista de ocasião só teve de levar pernas e pulmões (minimamente) funcionais. Tudo o resto — equipamento, alimentação, GPS e, não menos importante, uma bicicleta topo de gama (Scott Addict 20, neste caso) — a empresa assegurou e assegura sempre, para que 1) o material não sirva de desculpa; 2) o cliente possa concentrar-se naquilo que interessa, pedalar e descobrir o melhor do país.

Às nove da manhã de uma terça-feira primaveril, depois de uma torta, um café e um breve período de adaptação aos pedais de encaixe, o micro pelotão de três ciclistas — um jornalista e os dois sócios da empresa –, partiu do centro de Azeitão em direção à Serra da Arrábida. Os primeiros cinco quilómetros, praticamente planos, serviram para ganhar confiança, testar os sistema de mudanças da bicicleta e ir conversando sobre o conceito da Live Love Ride, que organiza tours com formatos e durações variáveis, de um a dez dias, em estrada ou por trilhos de BTT, em regiões tão díspares como o Douro Vinhateiro ou a Costa Alentejana. Pouco depois, a estrada inclinou e as perguntas do jornalista foram dando lugar a uma respiração cada vez mais ofegante.

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A estrada parece menos inclinada na fotografia do que é na realidade. Palavra de jornalista.

Quem normalmente opta por este tipo de atividade não só gosta muito de ciclismo como tem alguma experiência na matéria. Há, inclusive, quem tenha por objetivo pedalar a um ritmo forte, deixando as vistas para segundo plano. Mas os guias da Live Love Ride (que podem ser Pedro e Ricardo ou guias locais) conseguem adaptar o seu ritmo a qualquer grupo ou viajante, quer se trate de um ciclista amador interessado em fazer quilómetros ou um jornalista interessado em sobreviver às agruras do terreno e, de caminho, fazer uma reportagem. Nunca a máxima “devagar se vai ao longe” se revelou tão verdadeira como nesta ocasião. Mudança mais leve possível, olhos na estrada e chegada ao Convento da Arrábida para a primeira paragem do dia.

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A (primeira) recompensa depois de vários quilómetros a subir.

“Este tipo de turismo, feito em bicicleta, tem uma grande expressão em países como França e Itália, muito por causa de provas como o Tour e o Giro. A Volta a Portugal não tem o mesmo mediatismo mas não ficamos nada atrás desses países, tanto em termos de qualidade das estradas como das paisagens. Por exemplo, poucas subidas na Europa têm as condições da Serra da Estrela.”

Já no topo da Arrábida, depois de uma subida feita num alcatrão quase imaculado e com vista para um mar mais azul que em muitos postais de ilhas caribenhas, é fácil acreditar na explicação de Pedro Rocha, citada acima. Segundo o responsável, cada vez que a Live Love Ride leva um grupo de turistas a pedalar naquele tipo de cenário a reação não se faz esperar. “Quando chegam cá acima ficam de boca aberta”. E não é de cansaço.

A descida até à Praia da Figueirinha fez-se depressa e bem. Aquela história de que para baixo todos os santos ajudam tem alguma razão de ser, principalmente quando a estrada é larga e o vento sopra a favor. Depois de uma breve paragem junto ao areal, para reabastecer, a viagem prosseguiu em direção ao Portinho da Arrábida. Aí, novo interlúdio, desta vez para almoçar no Farol. As refeições estão sempre incluídas nas viagens e não são mero protocolo: Pedro e Ricardo fazem questão que o que se come seja tão inesquecível como o que se vê e pedala. Neste caso, tendo em conta a frescura do choco que chegou à mesa e a tarte de amêndoa caseira que se lhe seguiu, esse objetivo foi alcançado.

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Não é todos os dias que se comem chocos à beira-mar, apanhados nessa mesma madrugada. Mas também não é todos os dias que se fazem 50 quilómetros na Arrábida.

Desde o início do ano, altura em que foi criada, a Live Love Ride tem servido sobretudo turistas estrangeiros, entre norte-americanos, brasileiros ou franceses. Os objetivos variam. “Há quem esteja cá por razões profissionais e queira fazer este programa de apenas um dia, na zona de Lisboa, mas também há quem queira fazer tours maiores, noutras regiões”, explicam. A oferta da empresa é versátil a esse ponto. Um programa em Sintra ou na Arrábida de um dia pode custar 90€ por pessoa, com descontos para grupos. Já uma bike tour de nove dias entre o Porto e o Douro Vinhateiro, com direito a pedalar naquela que foi considerada a melhor estrada do mundo, provas de vinho, viagens de barco no rio, refeições nos melhores restaurantes da região e estadia em hotéis vínicos de charme tem um preço de tabela de 3599€ por pessoa, com tudo isso (e muito mais) incluído. E há outras possibilidades, entre elas participar com a Live Love Ride no Granfondo da Serra da Estrela ou da Lousã, duas das maiores provas nacionais abertas a amadores.

E por falar em serras, a subida do Portinho da Arrábida rumo à estrada de Azeitão, feita de estômago cheio, revelou-se um obstáculo bem duro de ultrapassar. Mais uma vez, e à falta de público na beira da estrada a incitar o redator-ciclista à superação, a paciência dos guias foi fundamental. Vencido o declive, o resto do percurso foi cumprido em velocidade de cruzeiro, já em descompressão. No final, já com a Casa das Tortas à vista, não houve braços no ar a festejar a vitória na etapa mas antes uma enorme sensação de satisfação e dever cumprido. Mais ou menos a mesma de quando se acaba um texto.

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Pedro e Ricardo, os criadores da Live Love Ride, fotografados no final da etapa, em Azeitão.