Uma final, já se sabe, é coisa para fazer tremer joelhos, colocar umas moedas na máquina que faz a cabeça pensar e despertar uns nervos em quem a vai jogar. Salvo uns raros monstros que têm a sorte de jogar à bola em clubes que, ano sim, ano sim, sempre arranjam maneira de levantar canecos, não é todos os dias que se joga uma final. Muito menos se essa final servir para dar cor a uma época que foi assim-assim. É aí que os nervos podem encontrar a nesga que precisam para entrarem cabeça dentro e colocarem os jogadores a matutar.
Talvez tenha sido isto que leões e bracarenses tenham sentido. Talvez. Mas, por muito que tanto o Sporting como o Braga precisassem da Taça de Portugal para saciar a fome de uma época, até ali, sem títulos, nem se notaram os nervos. Porque o jogo começou bom, rasgadinho, com a bola a rolar mais em pés verdes-e-brancos, sim, mas com as duas equipas raçudas o suficiente para ninguém conseguir dizer olá às balizas durante um quarto de hora. Foi esse o tempo que os leões duraram até se desconcentrarem.
Só pode ter sido, pois não num canto a favor não deixaram ninguém à entrada da área a servir de bombeiro para apagar (ou aproveitar) um ressalto que ali fosse parar. O ressalto apareceu mesmo, mas só lá estava Ruben Micael para, à vontade, apanhar a bola e atirá-la para a frente do sprint que Djavan já disparara. O brasileiro montou-se na mota, fintou dois adversários só com a velocidade até que, já na área, o primeiro que ultrapassara o parar em falta. Apito, penálti, expulsão de Cédric Soares e 1-0 para o Braga. Não houve nervos que entrassem na cabeça de Éder, que não tremeu.
Os leões depois fizeram o contrário do que a cautela mandava — em vez de acalmarem e terem mais tino para precaver qualquer susto, os jogadores quiserem apertar o Braga. Mas a concentração voltou a não aparecer noutro canto, aos 23’, quando a entrada da área voltou a ser apenas de jurisdição bracarense e um ressalto acabou transformado num contra-ataque à boleia do pé direito de Rafa. O pequeno foi, correu, esperou pela saída de Patrício e fez, com calma, o 2-0. Daí até ao intervalo é que se notaram os nervos — no Sporting, que falhou passes, arruinou jogadas e desentendeu-se até mais não.
A segunda parte parecia mais do mesmo e, durante muito tempo, foi mesmo. Os leões iam ficando sem energia para reagirem e o Braga com pilhas de sobra para trocar a bola com calma. O Sporting corria e corria, mas parecia não haver inspiração para mais do que levar a bola até Nani, Carrillo ou Mané (quando entrou) e pedir-lhes que inventassem cruzamentos para Slimani. Mas nada resultava, nada mesmo. Só resultou mesmo o disparate de Baiano, que quis tirar a bola da área de qualquer maneira e arranjou forma de colocar a bola direitinha no pé direito do argelino. O Sporting reduzia e, do nada, parecia cair um pózinho de perlimpimpim em cima dos jogadores.
Porque faltam seis minutos para os 90’ e, aí, todos começaram a ter mais corda para dar às pernas. Porque a adrenalina funciona da mesma maneira que os nervos e, quando chega à cabeça, dá para muita coisa — e deu para atacar muito e de todas as maneiras. Uma delas foi bombardear bolas para a área, na esperança que uma delas calhasse em pé amigo. Aos 92’ calhou no de Fredy Monteiro, o colombiano que teve cola no pé para a matar, a fazer passar por cima de Aderlan e a rematar para Kritciuk ainda defender e só deixar que fosse golo à segunda. Foi mesmo. Era o 2-2 e um lado do Jamor ficava maluco.
E, de repente, ficava também uma senhora final: já não havia um prolongamento no Jamor desde 2008, no ano em que o Sporting de Paulo Bento agradecera duas vezes a Rodrigo Tiuí. A meia hora de jogo que se seguiu foi animada e cada equipa puxou por uma das partes — a primeira foi toda do Sporting, que dominou e viu Nani a quase marcar um golaço; a segunda assentou no volante do Braga, que só não teve Salvador Agra como o herói da final porque Rui Patrício esticou uma perna para lhe defender um remate. E, por azar, para se lesionar. Foi assim, a sentir uma dorzinha que o fez coxear, que o guarda-redes foi para a baliza. Estava na hora dos penáltis.
Nunca uma final se decidira assim e, assim, os nervos tinham mais do que uma nesga para espreitarem — tinham uma porta escancarada para irem chatear a cabeça dos jogadores. Tiveram pelo menos três, as tais que encontraram em Éder, Salvador Agra e André Pinto, os minhotos que falhariam três dos quatro pontapés do Braga (os dois primeiros nem acertaram na baliza, o restante viu Rui Patrício defender-lhe o remate). E foi assim, nos penáltis, aquele gatilho que rebenta sempre uma bomba de festejos, que os leões acabaram a fazer a festa. Foi a 16.ª Taça de Portugal conquistada pelo Sporting, que assim igualou o FC Porto no número destes canecos que guarda no museu.
E nervos foi coisa que não houve no abraço, dos fortes e valentes, que presidente e treinador trocaram no relvado. Bruno de Carvalho e Marco Silva trocaram pancadas nas costas e gritos de euforia, por fim livres da preocupação que tanto nervosismo foi causando durante a época — a de o Sporting correu o risco de dizer “adeus, e até para o ano” sem um título conquistado. Lá se foram os nervos, então, graças a uma senhora final.