Uma final, já se sabe, é coisa para fazer tremer joelhos, colocar umas moedas na máquina que faz a cabeça pensar e despertar uns nervos em quem a vai jogar. Salvo uns raros monstros que têm a sorte de jogar à bola em clubes que, ano sim, ano sim, sempre arranjam maneira de levantar canecos, não é todos os dias que se joga uma final. Muito menos se essa final servir para dar cor a uma época que foi assim-assim. É aí que os nervos podem encontrar a nesga que precisam para entrarem cabeça dentro e colocarem os jogadores a matutar.

Talvez tenha sido isto que leões e bracarenses tenham sentido. Talvez. Mas, por muito que tanto o Sporting como o Braga precisassem da Taça de Portugal para saciar a fome de uma época, até ali, sem títulos, nem se notaram os nervos. Porque o jogo começou bom, rasgadinho, com a bola a rolar mais em pés verdes-e-brancos, sim, mas com as duas equipas raçudas o suficiente para ninguém conseguir dizer olá às balizas durante um quarto de hora. Foi esse o tempo que os leões duraram até se desconcentrarem.

Só pode ter sido, pois não num canto a favor não deixaram ninguém à entrada da área a servir de bombeiro para apagar (ou aproveitar) um ressalto que ali fosse parar. O ressalto apareceu mesmo, mas só lá estava Ruben Micael para, à vontade, apanhar a bola e atirá-la para a frente do sprint que Djavan já disparara. O brasileiro montou-se na mota, fintou dois adversários só com a velocidade até que, já na área, o primeiro que ultrapassara o parar em falta. Apito, penálti, expulsão de Cédric Soares e 1-0 para o Braga. Não houve nervos que entrassem na cabeça de Éder, que não tremeu.

The referee Marco Ferreira show the red card to Sporting CP player Cedric (3-L) during the Portuguese Cup Final match against SC Braga held at Jamor Stadium in Oeiras, outskirts of Lisbon, Portugal, 31 May 2015. MIGUEL A. LOPES/LUSA

Os leões jogaram com menos um no relvado durante 100 minutos, até Mauro, do Braga, também ser expulso, já no prolongamento.

Os leões depois fizeram o contrário do que a cautela mandava — em vez de acalmarem e terem mais tino para precaver qualquer susto, os jogadores quiserem apertar o Braga. Mas a concentração voltou a não aparecer noutro canto, aos 23’, quando a entrada da área voltou a ser apenas de jurisdição bracarense e um ressalto acabou transformado num contra-ataque à boleia do pé direito de Rafa. O pequeno foi, correu, esperou pela saída de Patrício e fez, com calma, o 2-0. Daí até ao intervalo é que se notaram os nervos — no Sporting, que falhou passes, arruinou jogadas e desentendeu-se até mais não.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

A segunda parte parecia mais do mesmo e, durante muito tempo, foi mesmo. Os leões iam ficando sem energia para reagirem e o Braga com pilhas de sobra para trocar a bola com calma. O Sporting corria e corria, mas parecia não haver inspiração para mais do que levar a bola até Nani, Carrillo ou Mané (quando entrou) e pedir-lhes que inventassem cruzamentos para Slimani. Mas nada resultava, nada mesmo. Só resultou mesmo o disparate de Baiano, que quis tirar a bola da área de qualquer maneira e arranjou forma de colocar a bola direitinha no pé direito do argelino. O Sporting reduzia e, do nada, parecia cair um pózinho de perlimpimpim em cima dos jogadores.

Porque faltam seis minutos para os 90’ e, aí, todos começaram a ter mais corda para dar às pernas. Porque a adrenalina funciona da mesma maneira que os nervos e, quando chega à cabeça, dá para muita coisa — e deu para atacar muito e de todas as maneiras. Uma delas foi bombardear bolas para a área, na esperança que uma delas calhasse em pé amigo. Aos 92’ calhou no de Fredy Monteiro, o colombiano que teve cola no pé para a matar, a fazer passar por cima de Aderlan e a rematar para Kritciuk ainda defender e só deixar que fosse golo à segunda. Foi mesmo. Era o 2-2 e um lado do Jamor ficava maluco.

Sporting CP President Bruno de Carvalho reacts after his team scored the second goal Against SC Braga during the Portuguese Cup Final match at Jamor Stadium in Oeiras, outskirts of Lisbon, Portugal, 31 May 2015. MIGUEL A. LOPES/LUSA

O presidente Bruno de Carvalho deixou-se contagiar pela loucura quando o Sporting empatou a final.

E, de repente, ficava também uma senhora final: já não havia um prolongamento no Jamor desde 2008, no ano em que o Sporting de Paulo Bento agradecera duas vezes a Rodrigo Tiuí. A meia hora de jogo que se seguiu foi animada e cada equipa puxou por uma das partes — a primeira foi toda do Sporting, que dominou e viu Nani a quase marcar um golaço; a segunda assentou no volante do Braga, que só não teve Salvador Agra como o herói da final porque Rui Patrício esticou uma perna para lhe defender um remate. E, por azar, para se lesionar. Foi assim, a sentir uma dorzinha que o fez coxear, que o guarda-redes foi para a baliza. Estava na hora dos penáltis.

Nunca uma final se decidira assim e, assim, os nervos tinham mais do que uma nesga para espreitarem — tinham uma porta escancarada para irem chatear a cabeça dos jogadores. Tiveram pelo menos três, as tais que encontraram em Éder, Salvador Agra e André Pinto, os minhotos que falhariam três dos quatro pontapés do Braga (os dois primeiros nem acertaram na baliza, o restante viu Rui Patrício defender-lhe o remate). E foi assim, nos penáltis, aquele gatilho que rebenta sempre uma bomba de festejos, que os leões acabaram a fazer a festa. Foi a 16.ª Taça de Portugal conquistada pelo Sporting, que assim igualou o FC Porto no número destes canecos que guarda no museu.

E nervos foi coisa que não houve no abraço, dos fortes e valentes, que presidente e treinador trocaram no relvado. Bruno de Carvalho e Marco Silva trocaram pancadas nas costas e gritos de euforia, por fim livres da preocupação que tanto nervosismo foi causando durante a época — a de o Sporting correu o risco de dizer “adeus, e até para o ano” sem um título conquistado. Lá se foram os nervos, então, graças a uma senhora final.