O voto dos emigrantes sempre foi um problema nas eleições. Melhor dizendo, o não voto dos emigrantes sempre foi um problema nas eleições. E será ainda maior em outubro, depois de terem emigrado de forma permanente mais de 200 mil pessoas nos últimos quatro anos. O número de emigrantes recenseados fora de Portugal até aumentou, mas é uma gota no oceano de trabalhadores portugueses fora do país. A maioria continua recenseada por cá e não virá votar no dia 4. A principal consequência é o aumento da abstenção, que já é das mais altas da Europa.

Vamos ter uma “abstenção ainda maior do que em outras eleições, mesmo que haja uma boa afluência dos eleitores que cá vivem, esse impacto não se traduzirá numa redução da abstenção. A abstenção não vai reduzir-se porque uma parte destas pessoas estão fora”, diz ao Observador o diretor-geral da Administração Interna, responsável pelo recenseamento eleitoral, Jorge Miguéis.

Se a emigração sempre foi um dado a ter em conta nas eleições porque os “emigrantes nunca se recensearam”, como lembra ao Observador o diretor da empresa de sondagens Eurosondagem Rui Oliveira e Costa, o fenómeno agravou-se nos últimos quatro anos. “Os novos emigrantes não se recenseiam no sítio para onde vão. Os que estão recenseados são os que já lá estão há 30 ou 40 anos”, acrescenta.

Contudo, apesar desta realidade, houve um aumento do número de recenseados no estrangeiro, mas longe do número de novos emigrantes. Para este ano estão registados novos 47.344 emigrantes, nem chegam a um quarto dos portugueses que partiram nos últimos quatro anos. De acordo com dados do Instituto Nacional de Estatística, saíram de Portugal desde 2011, como emigrantes permanentes (com residência fora do país superior a um ano) quase 200 mil pessoas. Para além disso há que considerar uma parte dos imigrantes temporários (com residência inferior a um ano), aqueles que ainda continuem fora do país. Mas destes, poucos serão os que vão votar no próximo dia 4 de outubro. Para as eleições deste ano, estão recenseados nos círculos do estrangeiro 242.526 pessoas: 164.273 fora da Europa e 78.253 na Europa. Serão cerca de 10% dos emigrantes e luso-descendentes espalhados pelo mundo. A maioria continua registada nos círculos do continente e não deverá comparecer (nem votar por correspondência) para as legislativas.

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Este dado é ainda mais importante quando se percebe que em Portugal estão registados 9,7 milhões de eleitores e o INE contabiliza 10,4 milhões de habitantes. Como o número de crianças até aos 15 anos é superior a um milhão e meio, isto mostra que há cerca de um milhão de portugueses que continuam registados em Portugal, mas estão fora do país.

Se a abstenção final vai ser de certeza elevada, a primeira a sofrer os danos é a abstenção técnica. “A abstenção técnica (eleitores que estão nos cadernos, mas não vivem cá) já é das mais elevadas da Europa. Será de perto de um milhão de eleitores”, acrescenta Oliveira e Costa que salienta que em qualquer país a abstenção técnica é de 3% e por cá é de 10%.

O número de novos emigrantes, apesar de elevado, não vai influenciar os estudos de opinião, mas poderá influenciar o resultado das eleições. É uma preposição mais difícil de fazer, porque não é conhecida a intenção de voto daqueles que não estão cá e por isso não votam. Mas há uma conta que é possível dar: “Vamos imaginar que esse milhão de pessoas ia votar. É mais gente do que os votos que separam o primeiro e o segundo partido mais votado”, diz Jorge Miguéis. Ou seja, se votassem, poderiam ser determinantes para a votação final.

Mas a maioria irá ficar de fora da participação política. Isto porque há uma percentagem residual que vota antecipadamente por correspondência e outros tantos que se recensearam no sítio onde vão estar no dia 4 de outubro. Como muitos deles já estarão a trabalhar em outubro, não irão ao círculo onde estão registados pôr a cruz no boletim de voto.