Conhecem a internet como a palma das mãos e movem-se nela como ninguém. Não são um grupo. São um coletivo descentralizado de grupos, cada um com ideais e objetivos muito específicos. Não há, por isso, uma estrutura hierárquica ou um líder, como indica o jornal espanhol ABC. São anónimos. Ninguém os conhece e, provavelmente, nem se conhecem entre si. Mas têm objetivos comuns e o último é a luta contra o terrorismo, em concreto o Estado Islâmico.
Mas já lá vamos.
O grupo ganhou fama em 2008 quando se debateu contra a Igreja da Cientologia na internet, bem como em protestos no terreno. Nessas manifestações popularizaram-se as máscaras de Guy Fawkes, inspiradas em V for Vendetta de Alan Moore, que se tornaram um símbolo globalmente associado aos Anonymous. Já colaboraram com a Wikileaks e até fizeram ataques informáticos contra grandes companhias como o PayPal, Visa e MasterCard, uma “operação” que resultou na detenção de vários membros do coletivo.
É essa descentralização que faz com que os Anonymous tenham um portefólio de ativismo extremamente vasto e diversificado. Envolveram-se no combate à pedofilia e à pornografia infantil, protestaram contra leis que ameaçavam a liberdade na rede e até deram cartas na Primavera Árabe. Tudo isto à margem da lei e usando métodos pouco ortodoxos, o que lhes tem valido críticas por parte de quem não concorda com os seus ideais ou com a justiça que fazem pelas próprias mãos.
Ironia. Em março de 2012, o site Mashable começava um artigo com a pergunta “Pode o grupo Anonymous ser a próxima al-Qaeda?” Em causa, as declarações de Robert Mueller, diretor do FBI, que defendia que os ataques informáticos iriam substituir o terrorismo como “a principal ameaça aos Estados Unidos da América” (citação do Mashable). Claro que as palavras de Mueller devem ser vistas à luz dos acontecimentos da altura: todas as semanas a imprensa enchia-se de histórias sobre ataques informáticos, grande parte deles perpetrados por hackers ligados ao coletivo Anonymous.
No passado dia 13 de novembro, o autoproclamado Estado Islâmico voltou a espalhar o terror em Paris. As notícias dos atentados correram (e revoltaram) o mundo. Como resposta, os hackers fizeram uma declaração de guerra: “Os Anonymous de todo o mundo vão apanhar-vos”. “Vamos lançar a maior operação de sempre contra vocês. Esperem muitos ataques informáticos.”
A reação dos jihadistas surgiu poucos dias depois. Num vídeo divulgado através da aplicação Telegram, um membro do grupo terrorista apelidava os hackers de “idiotas”: “O que é que vão hackear?” E a resposta dos Anonymous não tardou em chegar. Em menos de uma semana conseguiram eliminar, direta ou indiretamente, cerca de 5.500 contas nas redes sociais, ligadas aos terroristas.
Mas as ações do coletivo Anonymous contra o Estado Islâmico não são novas. Remontam ao pós atentado contra a redação do jornal satírico Charlie Hebdo em janeiro deste ano. De acordo com a revista Foreign Policy, o hackers já ‘derrubaram’, desde essa altura, 149 sites ligados ao grupo terrorista, mais de 101 mil contas no Twitter e 5.900 vídeos de propaganda jihadista.
O coletivo Anonymous parece, assim, estar a aliar-se ao ocidente na luta contra o terrorismo. O espanhol ABC avança mesmo que há membros dos Anonymous a colaborarem com as autoridades norte-americanas, e o britânico The Independent garante que já se deparou com pelo menos um tweet a indicar o endereço físico de alguém que se diz recrutador do Estado Islâmico na Europa.
No entanto — e como já é habitual — as ações do coletivo Anonymous não são unanimemente aceites. Citado pela agência France-Presse, Oliver Laurelli, um blogger francês que escreve sobre segurança, defendeu que “encerrar essas contas é deixar a polícia surda e cega”, pois elas fornecem dados importantes às autoridades: “Se conseguirmos ver que alguém que está ligado aos ataques tem ligações com outra pessoa qualquer, [essa informação] é importante para a polícia”.
Inimigos ou aliados? É difícil prever, dada a dimensão atual do coletivo. Porém, os hackers parecem não estar dispostos a dar tréguas e o Estado Islâmico, que tem também um braço informático — o CyberCaliphate –, vai por certo continuar a ser um dos principais alvos.
Editado por Filomena Martins.