Dezembro de 1914. Frederick James Davies, inglês, estava no campo de batalha, no norte de França, para combater na Primeira Guerra. E foi pouco depois do dia de natal que o soldado do 2º Batalhão dos Fuzileiros Royal Welsh (ingleses) decidiu escrever à família para contar como o tinha passado. Os relatos dessas cartas, doadas pela neta do autor ao Imperial War Museum, em Londres, são enternecedores. Em pleno campo de combate, no dia de natal, os soldados alemães abandonaram as trincheiras, apresentaram-se aos ingleses, trocaram prendas e jogaram à bola.
Nas cartas, diz o The Guardian, lê-se que o batalhão inglês trocou ” cigarros, fiambre e carne” com os soldados da linha da frente alemã durante o cessar-fogo improvisado do dia de natal: “Eles estavam a apenas 50 metros de nós, nas trincheiras. Saíram e fomos conhecê-los. Apertamos a mão”, escreveu.
Numa das que escreveu à mãe, Davies contou como os soldados alemães e ingleses treparam as trincheiras para trocar prendas e mensagens de boas festas. E escreveu ainda que tiveram “uma boa conversa com os alemães no dia de natal”.
“Também nos deram cigarros e não tinham muita comida. Estava a ser difícil para eles, estavam fartos da guerra”. Por isso, conta, descansaram durante uns dias: “Estou feliz com tudo isto. Não serve de nada estar de outra forma. Não te preocupes comigo. Anima-te até eu chegar a casa”, pediu à mãe.
As cartas foram encontradas pela neta de Davies, Jane Oliver, depois da morte da sua mãe, a filha primogénita de Davies. Nesse cessar-fogo de natal, todos os soldados, ingleses e alemães, cantaram músicas em conjunto e tiraram fotografias.
Entreajudaram-se até: arranjaram trincheiras, enterraram os mortos. Mas o espírito natalício que não chegou a todas as frentes de combate: no dia de natal de 1914 morreram, pelo menos, 81 soldados. Numa outra carta, agora também exposta naquele museu, Davies falou sobre as batalhas: “É uma grande vista ver as cápsulas [das balas] a saltarem durante a noite, é como fogo-de-artifício”.
Davies morreu aos 61 anos, em 1959, no Hospital de Cardiff. Em 1915 foi atingido por um tiro vindo da trincheira inimiga e partiu a coluna. Voltou ao Reino Unido e passou o resto da vida numa cadeira de rodas. Mais tarde casou-se com Hannah Isaacs, com quem teve três filhas, em Porthcawl.
Audrey Trenchard, a filha mais nova (hoje com 86 anos), tinha apenas 17 quando o pai morreu. Audrey diz que nunca ouviu as histórias de guerra do pai: “Sendo a mais nova nunca o ouvi falar sobre isto. Mas seria delicioso para mim saber mais histórias, disse ao jornal inglês: “Os alemães não eram todos maus, eram homens de família como os nossos eram. É muito importante manter este tipo de coisas vivas”.