O Orçamento do Estado (OE) para este ano chegou esta sexta-feira à Assembleia da República, mas ainda vai sofrer alterações, mesmo que pequenas, no Parlamento. Bloco de Esquerda e PCP vão apresentar propostas de alteração ao Orçamento do Estado quando este entrar na discussão na especialidade, na Comissão de Orçamento e Finanças. Os dois partidos esperam para ver que medidas do acordo que assinaram com António Costa estão no documento para depois decidirem o que vão apresentar, mas não vão desistir das principais bandeiras, quer aumentem a despesa, quer aumentem a receita, quer o PS as aprove ou não.
“O grosso do orçamento está no acordo que assinámos”, diz ao Observador a deputada do Bloco de Esquerda Mariana Mortágua, que acrescenta no entanto que isso não quer dizer que o partido não tenha “outras bandeiras” pelas quais se vai bater na especialidade, mesmo que sem a garantia de aprovação pelos socialistas. “Umas podem ser aprovadas, outras não”, mas a certeza é de que vai haver propostas na especialidade.
Aos jornalistas, falando no final da apresentação das linhas gerais do OE no ministério das Finanças, Mariana Mortágua concretizou que essas propostas vão ser ao nível dos serviços públicos e do apoio às famílias mais vulneráveis, nomeadamente no que diz respeito aos custos energéticos. “O processo orçamental não está terminado e o BE não desistiu de lutar pelas suas bandeiras”, disse.
Mas há uma certeza, a postura não será de confrontação com o PS, garante a deputada bloquista, sublinhando que o BE “respeita o compromisso que o Governo tem com Bruxelas”, mesmo não concordando com ele. “Vamos apresentar propostas honestas que não rompam com esse compromisso mas não nos peçam para não lutar pelas nossas bandeiras”, disse.
O mesmo do lado do PCP. O líder parlamentar João Oliveira começa por lembrar que ainda é cedo, uma vez que é preciso analisar primeiro o Orçamento do Estado proposto, mas que o partido vai propor “soluções” que considere importantes partindo do Orçamento e do acordo como base. “O grau de concretização que o Orçamento der à posição conjunta vai determinar o trabalho que vai ser feito na especialidade”, diz ao Observador.
No rescaldo da entrega do documento na Assembleia da República, esta sexta-feira, João Oliveira foi mais longe e considerou haver matérias que não estão plasmadas no documento e que o PCP espera poder vir a incluí-las em sede de especialidade. É o caso do congelamento do valor das propinas, da gratuitidade dos manuais escolares e da redução da taxa máxima de IMI, exemplificou o líder parlamentar comunista, adiantando já algumas das propostas que vai fazer ao PS na fase seguinte.
O que vale para BE e PCP, vale também para os Verdes. Falando aos jornalistas depois de Mário Centeno ter apresentado o Orçamento no ministério das Finanças, Heloísa Apolónia sublinhou que ainda há trabalho a fazer em sede de especialidade para “reverter a destruição que estava a ser feita pelo anterior Governo”. E deu exemplos de matérias sobre as quais vão incidir as propostas dos ecologistas: mobilidade e reforço dos transportes públicos, nomeadamente no setor ferroviário, conservação da natureza, reforço da área da Educação, investimento nos cuidados primários de saúde e ainda na cultura – “onde é possível criar muitos mais empregos”.
A questão coloca-se porque durante a última legislatura os orçamentos que saíam do Governo eram pouco retocados no Parlamento. PSD e CDS apresentavam propostas de alteração, mas grande parte delas pouco significativas ou quando o foram, mais não eram do que medidas que o Governo combinava com os dois partidos da maioria para que estes mostrassem serviço. Além disso chumbavam a esmagadora maioria das propostas da oposição, PS, PCP, BE e PEV, o que fazia com que a variação do impacto orçamental das novas medidas que eram depois aprovadas no Parlamento fosse reduzida. Acontece que agora o cenário mudou. PS tem de negociar com os partidos à esquerda a aprovação do Orçamento, mas nem todas as medidas entrarão nesta primeira fase. Contudo, e mesmo sem a garantia que os socialistas aprovem as reivindicações, PCP e BE irão insistir em algumas propostas, que podem ter impacto orçamental, positivo ou negativo, quer do lado da despesa quer do lado da receita.
A margem é estreita, admitem, uma vez que o principal já estará no Orçamento e também porque sabem que os socialistas não aceitarão medidas que mexam com os grandes números da receita e da despesa. Por isso, diz Mariana Mortágua, a ideia serão algumas medidas, algumas até “simbólicas”, que possam ter “algum impacto orçamental”, mas isso não é necessariamente negativo, porque esse impacto, diz, pode ser “um bocadinho de aumento da despesa ou até aumento da receita”. Caso disso foi, por exemplo, o fim da isenção de IMI para os fundos de investimento imobiliário – uma medida que tinha sido proposta ainda durante a negociação do acordo de governo pelos dois partidos, mas que os socialistas não tinham aceitado, e que integra agora o Orçamento depois das negociações da última semana com a Comissão Europeia.
O mesmo pode acontecer na fase na especialidade. Depois de o Orçamento ser entregue esta sexta-feira na Assembleia da República, será depois debatido na generalidade e depois passa para a Comissão de Orçamento e Finanças, onde será discutido em detalhe. É durante esse período que os partidos poderão apresentar propostas de alteração ao Orçamento. PCP e BE dizem que não vão abdicar desse direito. O CDS também não. Já o PSD tem uma estratégia diferente e diz que não irá apresentar qualquer proposta para mudar o Orçamento do Estado.