Menos de três anos depois de ter sido lançada para os céus, a missão Gaia da Agência Espacial Europeia começa a dar frutos. Esta quarta-feira foram revelados os primeiros dados que vão permitir construir o mapa mais preciso alguma vez construído da galáxia onde se situa o sistema solar, a Via Láctea. É com uma precisão nunca antes vista que se poderá agora saber onde estão e como se comportam alguns dos milhões e milhões de corpos celestes que coabitam connosco nesta pequena espiral no meio do universo.
Acontece que este mapa tem muito de português nos seus genes: foi produzida em Portugal pela equipa coordenada por André Moitinho de Almeida, Professor da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, investigador do CENTRA e coordenador da participação portuguesa na missão Gaia da ESA.
Os cientistas do Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço (IA) não vão ficar por aqui. O mapa divulgado esta manhã mostra apenas um por cento de todas as estrelas da Via Láctea, mas é vinte vezes mais completo do que os que “desenhámos” com os pés assentes na Terra, baseados unicamente nas observações do céu noturno. Este é um passo importante: primeiro, porque não sabemos de facto como é a nossa galáxia (estimamos que tenha 100 mil milhões de estrelas, mas pode ter muitas mais); depois, porque as técnicas usadas para criar este mapa podem ser adotadas para deteção de exoplanetas. De acordo com Vardan Adubekyan, um cientista do IA e da Universidade do Porto, “espera-se que com os dados do Gaia se consigam descobrir milhares de novos mundos e perceber melhor a sua formação e evolução”.
Agora, os cientistas europeus vão juntar-se para transformar os dados da missão Gaia em modelos tridimensionais da Via Láctea que se assemelhem a uma versão cósmica do Google Maps. Mas como conseguiram tudo isto? Primeiro, o satélite da missão apontou as posições de objetos como estrelas, exoplanetas, meteoritos e galáxias vizinhas. Mais do que isso, mediu as variações das posições desses corpos celestes ao longo do tempo. Isso foi possível porque usaram pontos de referência: são os quasares, centenas milhares deles, que “têm um aspeto quase pontual e estão suficientemente afastados para que não se detetem movimentos próprios”, como explica Sonia Antón, também ela do IA e da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto. Trocado por miúdos: os quasares são galáxias extremamente distantes, mas com um brilho muito forte, que têm no seu centro buracos negros muito grandes. O que o satélite Gaia fez foi mapear a posição exata dos pontos de luz do céu tendo por referência a posição desses quasares.
Este é um grande avanço das áreas da astronomia e da astrofísica.