O Fundo Monetário Internacional (FMI) espera que a economia portuguesa cresça 1,3% em 2017, aquém dos 1,5% esperados pelo Governo, e que abrande nos anos seguintes até 1% em 2021, resultado dos constrangimentos estruturais da economia, do elevado endividamento das empresas e consequentes problemas para os bancos com o crédito malparado que têm nos seus balanços.
Os riscos estão mais equilibrados, o investimento e as exportações até podem acabar por ter um desempenho melhor, mas tal pode não trazer grande consolo no médio prazo, avisam os técnicos do FMI no relatório da quinta missão de monitorização pós-programa, porque os principais constrangimentos mantêm-se e podem trazer dissabores no futuro.
O Fundo volta a apontar os holofotes para o problema do excessivo endividamento da economia – público e privado -, que está a limitar a capacidade da economia de crescer de forma mais robusta. As empresas continuam excessivamente endividadas e o crédito malparado na carteira de empréstimos a empresas está a pesar no balanço dos bancos. Juntamente com a baixa rentabilidade e os elevados custos operacionais, a capacidade dos bancos de financiarem novos investimentos está limitada diz o Fundo (o Governo acrescenta que os bancos também estão mais avessos a riscos).
Os empréstimos às empresas estão a cair, os bancos tinham cerca de 49 mil milhões de euros em créditos de cobrança duvidosa nos seus balanços no final de 2015, e, no final do terceiro trimestre do ano passado, o setor bancário português tinha o segundo rácio Common Equity Tier 1 mais baixo da União Europeia, lembra ainda o Fundo.
Aliás, segundo o FMI, o valor do capital dos bancos portugueses que atualmente está acima dos mínimos exigidos não deve chegar para acomodar as perdas potenciais com uma eventual provisão que vai ter de ser feita nas contas dos bancos sobre o malparado.
A incapacidade dos bancos de financiar novos investimentos tem consequências no crescimento da economia. Por sua vez, o baixo crescimento dificulta a tarefa dos bancos na gestão do crédito malparado e melhorar a sua rentabilidade, o que pode colocar em causa os esforços de consolidação orçamental.
Para evitar este círculo vicioso entre bancos fragilizados, crédito malparado e crescimento económico baixo, o FMI defende que tem de ser feita uma limpeza mais abrangente dos balanços dos bancos. Essa solução deveria passar por tirar do balanço dos bancos o malparado, mas a solução não deve passar por um bad bank financiado pelo Estado, algo que a missão liderada por Subir Lall não considera possível devido às contas públicas portuguesas. “O elevado nível de dívida pública não deixa margem que permita o financiamento público a um bad bank”, diz o FMI.
Reembolso antecipado ao FMI compensa cada vez menos
A elevada dívida pública continua a ser uma preocupação para o FMI, que nas suas previsões aponta para que tenha crescido, em 2016, para o seu nível mais alto de sempre (em percentagem do PIB). Para que a dívida entre finalmente numa trajetória descendente e de forma consistente, o Governo tem de implementar mais medidas de consolidação orçamental, defendem os técnicos.
Segundo o Fundo, devido aos níveis da dívida e à trajetória dos juros que estão a ser exigidos pelo mercado pelos investidores para emprestarem ao Estado português, a dívida pública está vulnerável a riscos significativos. O FMI aponta a eventuais apoios ao setor financeiro e à necessidade de assumir as responsabilidades com parcerias público-privadas como alguns dos riscos que podem colocar a dívida pública numa trajetória ascendente.
A missão considera, ainda, que as condições de financiamento no mercado se tornaram mais restritivas, o que significa que Portugal pode ficar vulnerável a mudanças súbitas nos mercados de forma mais pronunciada.
Na resposta ao FMI, o Governo admite que o pagamento antecipado do empréstimo ao Fundo está a gerar cada vez menos poupanças devido ao aumento dos custos da dívida que o Estado contrai nos mercados para poder pagar antecipadamente parcelas do empréstimo – esta semana anunciou mais um pagamento, fazendo com que Portugal já tivesse pago mais de metade do empréstimo -, mas ainda compensa, em parte, também porque é cada vez mais caro para o Estado manter a sua almofada de liquidez.
Reformas estruturais praticamente paradas
É um dos pontos mais focados pelas instituições internacionais desde sempre e o FMI não fugiu à regra. De acordo com a missão, as reformas estão praticamente paradas e isso está a amplificar o impacto do investimento baixo e da redução da força de trabalho no crescimento potencial.
O Fundo defende que Portugal tem de fazer um novo esforço para dar um impulso a reformas no mercado de trabalho, que levassem no sentido da indexação do salário mínimo a aumentos da produtividade e a uma aproximação entre os contratos temporários e permanentes.
Mas o Governo não está de acordo e é isso que faz saber neste relatório. Na resposta às críticas do Fundo, o Executivo diz que está empenhado em levar por diante as reformas estruturais já implementadas durante o programa, mas não pretende mexer nos direitos dos trabalhadores com contratos permanentes e que as mudanças que pretende fazer se destinam a corrigir injustiças sociais.