O diretor da FCSH, Francisco Caramelo, explicou esta segunda-feira, através de um e-mail endereçado a todos os docentes, investigadores, trabalhadores não docentes e alunos, a sua visão em torno do cancelamento da conferência de Jaime Nogueira Pinto sobre “Populismo ou Democracia? O Brexit, Trump e Le Pen em debate”. “Observámos e vivemos todos uma sucessão perturbadora de notícias que, fundadas em afirmações erróneas e até mentirosas, repetidamente reproduzidas, constituíram um fortíssimo ataque à FCSH e à sua essência, ao seu diretor e direção e à Universidade Nova de Lisboa”, resume no início da missiva.
Salientando que “a liberdade de expressão faz parte da identidade genética e da história da FCSH, um espaço de liberdade, pensamento crítico e livre discussão”, Francisco Caramelo explica que “a Nova Portugalidade, em contactos telefónicos com a Faculdade, no dia 6 de março, exigiu a presença da Polícia antes e durante a conferência. Aquela organização anunciou então que traria dez homens, que estariam na sala durante a conferência, e que garantiriam a segurança do evento. Isso era inaceitável (…) Aquela organização anunciou então que traria dez homens, que estariam na sala durante a conferência, e que garantiriam a segurança do evento. A direção da Faculdade não poderia pactuar com essas exigências. A probabilidade de violência era muito elevada e o perigo considerável”.
Citando (e confirmando) as declarações iniciais de Jaime Nogueira Pinto ao Observador logo a 6 de março, o diretor da FCSH explica que falou com o orador no dia. “Nunca se tratou de uma anulação definitiva, tratou-se de adiar a conferência para uma data próxima em que a mesma pudesse ter lugar em ambiente sereno. Nunca se tratou de ceder a quem quer que fosse nem de limitar a liberdade de expressão”, assegura. “Foi um ato pensado e debatido coletivamente. Hoje, tomaria, em consciência, a mesma decisão”, complementa.
Jaime Nogueira Pinto diz que cancelamento da conferência merece esclarecimento
“Jaime Nogueira Pinto, com quem reuni na passada sexta-feira de manhã, foi convidado a vir à FCSH proferir uma conferência. Aceitou o convite e a conferência será marcada em função das disponibilidades do conferencista”, acrescenta, finalizando com a garantia que “a FCSH continuará a ser o que tem sido nos últimos quase 40 anos”.
A mensagem do diretor da FCSH na íntegra
Nos últimos dias, observámos e vivemos todos uma sucessão perturbadora de notícias que, fundadas em afirmações erróneas e até mentirosas, repetidamente reproduzidas, constituíram um fortíssimo e torpe ataque à FCSH, e à sua essência, ao seu Diretor e Direção e à Universidade Nova de Lisboa.
Dirijo-me a vós, depois de o Conselho de Faculdade e de o Conselho Científico terem demonstrado e expressado a sua solidariedade e apoio ao Diretor da FCSH. Agradeço penhoradamente essas posições, as quais me trazem ainda mais convicção. Agradeço também as inúmeras mensagens de apoio enviadas por docentes, investigadores, trabalhadores não docentes, alunos e antigos alunos desta casa.
Cumpre-me esclarecer o seguinte:
1. A liberdade de expressão faz parte da identidade genética e da história da FCSH. Nunca esteve em causa nem nunca estará. A Faculdade sempre foi um espaço de liberdade, de pensamento crítico e de livre discussão. A FCSH sempre acolheu e promoveu o debate, levado a cabo por individualidades, políticos e intelectuais, oriundas das mais diversas famílias de opinião. Assim continua e continuará a ser. Estamos vinculados à nossa história de sempre e à nossa essência.
2. Jaime Nogueira Pinto era o conferencista convidado pela Nova Portugalidade, organização exterior à Faculdade, e vinha falar sobre “Populismo ou Democracia? O Brexit, Trump e Le Pen em debate”, temática atual, cujas reflexão e discussão são necessárias. A reserva da sala foi solicitada por um aluno da FCSH, membro da referida organização, à Associação de Estudantes. O Conselho Pedagógico reservou a sala, correspondendo ao pedido de reserva da Associação de Estudantes.
3. Depois disso, observou-se uma intensa crispação e posições políticas antagónicas e extremadas decorrentes da realização da conferência. Na sequência de moção aprovada em RGA, foi solicitado à Direção da Faculdade o cancelamento da conferência. Apesar disso, a Direção da Faculdade não aceitou o cancelamento do evento, mantendo a sua realização. Fica assim claro que nunca esteve em causa a liberdade de expressão.
4. Na sequência desta posição, a Direção da Faculdade começou a receber sucessivas informações e indicações relativas a possíveis confrontos e insegurança à volta da conferência.
5. A Nova Portugalidade, em contactos telefónicos com a Faculdade, no dia 6 de Março, exigiu a presença da Polícia antes e durante a conferência. Isso era inaceitável. Não só não faz parte da cultura da nossa instituição como não seria um contexto digno de discussão de uma temática que deveria ser debatida serenamente. Aquela organização anunciou então que traria dez homens, que estariam na sala durante a conferência, e que garantiriam a segurança do evento.
6. A Direção da Faculdade não poderia pactuar com essas exigências. A probabilidade de violência era muito elevada e o perigo considerável.
7. Contactei pessoalmente, nesse mesmo dia, Jaime Nogueira Pinto, a quem disse não existirem condições de segurança para se realizar a conferência no ambiente sereno e normal que o conferencista e a temática da conferência deviam naturalmente implicar.
8. Durante a mesma conversa ao telefone, convidei Jaime Nogueira Pinto a voltar à FCSH para proferir a sua conferência. Jaime Nogueira Pinto, ele próprio, confirma esse meu convite nas suas primeiras declarações ao Observador, ainda no dia 6 de Março. Nunca se tratou de uma anulação definitiva da sua conferência. Tratou-se de adiar a conferência para uma data próxima em que a mesma pudesse ter lugar em ambiente sereno. Nunca se tratou de ceder a quem quer que fosse, nem de limitar a liberdade de expressão. Como seria isso plausível numa instituição como a FCSH, bastião da liberdade de pensamento e de livre discussão com quase quarenta anos de idade? Como seria isso possível numa instituição fundada por intelectuais e académicos que sempre pugnaram pela diversidade de opinião, pelo pensamento crítico e pelo debate em liberdade? Eu, como vários dos que ensinamos e investigamos hoje nesta casa, sou o produto dessa cultura que constitui o material genético da FCSH.
9. A decisão de adiar a conferência foi um ato pensado e debatido coletivamente pela Direção da Faculdade, que eu assumo, no entanto, pessoalmente. Pensámos na FCSH, pensámos nos nossos alunos, pensámos na segurança dos nossos alunos, pensámos na liberdade académica e recusámos uma liberdade condicionada. Garantimos a liberdade de expressão, resgatando-a de uma envolvência de perigo e da probabilidade de violência.
10. Hoje, tomaria, em consciência, a mesma decisão. Ainda com mais convicção depois dos acontecimentos que se tornaram públicos nos últimos dias, nomeadamente a entrada de dezenas de pessoas, identificadas como pertencentes à extrema-direita, com atitudes intimidatórias sobre os nossos alunos, e a concentração promovida pelo PNR, prevista para a entrada da FCSH, com o propósito de reivindicar a “liberdade de pensamento, opinião e expressão”.
11. Jaime Nogueira Pinto, com quem reuni na passada sexta-feira de manhã, foi convidado a vir à FCSH proferir uma conferência. Aceitou o convite e a conferência será marcada em função das disponibilidades do conferencista.
12. A FCSH continuará a ser o que tem sido nos últimos quase quarenta anos. Um bastião das liberdades académicas e intelectuais, do pensamento e do debate. Desiludam-se todos aqueles que pensaram que nos poderíamos desviar desse caminho, traçado pelos nossos fundadores. Enquanto Diretor da FCSH, aqui estarei e aqui continuarei, procurando, ao lado de todos vós e em nome de todos vós, ser sempre o garante dessas liberdades.