Foi uma promessa saída das jornadas parlamentares e agora já passada para o papel. O PCP deu entrada esta sexta-feira com um projeto de resolução que prevê a criação de um calendário com vista à realização de um novo referendo à regionalização já no início de 2019. Sem ainda ter auscultado o Governo sobre a eventual recetividade à ideia, os comunistas falam na necessidade de haver um “amplo consenso” nesta matéria e deixam um recado ao Presidente da República, única pessoa que pode legalmente convocar um referendo em Portugal: “É um referendo constitucionalmente obrigatório”. Ou seja, Marcelo não pode ser obstáculo.
No fundo, é apenas a formalização daquilo que o líder parlamentar comunista já tinha anunciado há duas semanas nas jornadas, em Coimbra. Mas é, sobretudo, a certeza de que o PCP quer mesmo pôr o tema na agenda e pressionar o Governo para concretizar esta reforma administrativa até ao fim da legislatura. Caso não o faça, e caso haja uma reedição da “geringonça” no pós-legislativas, esta deverá pelo menos ser uma das condições dos comunistas.
Para já, o calendário proposto pelo PCP é este: primeiro, ouvir as 308 assembleias municipais, que se devem pronunciar sobre dois mapas possíveis de criação das Regiões Administrativas, um assente no mapa aprovado e submetido a referendo em 1998 [e chumbado], e um outro correspondente às cinco regiões-plano hoje coincidentes com as áreas das Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR); depois, definir um prazo até junho de 2018 para as assembleias municipais enviarem as suas conclusões; depois, pôr o Parlamento a aprovar no segundo semestre de 2018 a lei da criação das regiões e a proposta de convocação do referendo. O referendo viria a realizar-se, segundo a proposta dos comunistas, até março de 2019, de maneira que, uma vez aprovado, se poder convocar as primeiras eleições para os órgãos das regiões administrativas na segunda metade de 2019.
Mas, para este calendário se cumprir é preciso haver acordo na maioria parlamentar. E, por isso, o PCP pede “amplo consenso”. Em declarações aos jornalistas, o deputado António Filipe admitiu que o tema “ainda não foi motivo de conversa” com os parceiros da esquerda parlamentar — esse processo começará agora após a formalização do diploma –, mas a ideia não é “impor o debate” a ninguém. “Sendo uma reforma administrativa, é preciso que seja seriamente debatida entre todos e que sejam procurados amplos consensos”, disse.
Para o PCP, esse acordo será agora mais fácil de alcançar do que foi em 1998, altura em que o tema foi referendado mas ganhou o “não”. “Em 1998 houve proposta para 8 regiões e o resultado foi negativo, mas desde 1998 já passou muito tempo e o ambiente político é diferente, há vários quadrantes da política que consideram que deve haver regiões administrativas”, afirmou o deputado aos jornalistas.
Questionado sobre o facto de o Governo evitar falar em regionalização, procurando antes falar na necessidade de descentralização, António Filipe lembrou que o tema pode não constar do atual programa de Governo mas “a criação de regiões administrativas é uma obrigação constitucional”. Pode ler-se no projeto de resolução dos comunistas: “Poucos negarão que uma efetiva e sustentada descentralização é inseparável da instituição das regiões administrativas. E a sua concretização é, desde logo, um imperativo constitucional”.
Um recado que vale tanto para o Governo como para o Presidente da República, que tem o poder de convocar efetivamente o referendo depois de a proposta ser aprovada pela Assembleia da República. Com o argumento de que “a regionalização constitui uma daquelas reformas estruturais indispensáveis ao cabal cumprimento da Constituição”, o PCP rejeita a hipótese de vir a ser obstaculizado por Marcelo.
Para o PCP, regionalização e descentralização são duas coisas diferentes, porque uma não invalida a outra. “A regionalização é o terceiro patamar do poder local”, havendo competências que devem ser atribuídas aos municípios mas outras áreas que são de gestão “supra-municipal” mas não devem ser geridas pela administração central. É o caso, por exemplo, dos transportes urbanos.