Um documento de trabalho do Conselho Económico e Social (CES), datado de 1 de junho, lança diversas críticas ao Plano Nacional de Reformas (PNR), já apresentado pelo Governo a Bruxelas, incluindo aquilo que considera ser “falta de rigor” na linguagem, nos números citados e na justificação de alguns objetivos. As situações identificadas levam o CES a referir que “um documento desta natureza e relevância merecia um calendário de discussão mais alargado e justificava um outro cuidado na sua própria elaboração“.

Uma das queixas do Conselho, atualmente presidido por António Correia de Campos, ministro da Saúde no primeiro governo de José Sócrates, tem a ver com o calendário adotado pelo Governo e que impediu emissão do parecer do CES antes do envio do PNR para a Comissão Europeia. “A consulta a este órgão constitucional dever-se-ia ter iniciado numa fase anterior de preparação do PNR pois, desse modo, poderia ter havido uma contribuição para a própria estrutura do documento, para as orientações nele contidas e para o desenho e avaliação das medidas contempladas no Programa”, escreve-se no documento de trabalho em causa, a quinta versão elaborada pelo CES.

O CES afirma que “o documento apresenta fortes limitações, não definindo claramente as opções e as prioridades necessárias à definição da forma de enfrentar as grandes mudanças na economia à escala global“. E, adiantam os relatores, “há um défice de tratamento de alguns pontos relevantes da vida económica e social“, de que são exemplos a “precariedade, igualdade de género, demografia, Regiões Autónomas, habitação, combate à pobreza, papel da cultura, política de distribuição de rendimentos e sector empresarial do Estado”.

O olhar crítico do CES sobre o PNR estende-se aos vários pilares do plano, entre os quais se inclui a avaliação da respetiva “adequação às metas da estratégia da Europa 2020”. O Conselho questiona “a própria validade de muitas” daquelas metas e regista, por exemplo, “a insistência em atingir um rácio de despesas em investigação e desenvolvimento (I&D) sobre o PIB de 2,7%” no final da atual década. Para o Conselho, o objetivo “não só é dificilmente alcançável, como a insistência em manter esta meta tende a introduzir distorções indesejáveis e dispendiosas” em Portugal.

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O documento de trabalho explica o ponto de vista. “O nível de despesas em I&D sobre o PIB está fortemente correlacionado com a estrutura produtiva de cada país, em particular com o peso relativo de sectores (por exemplo, farmacêutica, aeronáutica e eletrónica)”. Devido à sua estrutura produtiva, prossegue o CES, “Portugal tem já um nível de despesas em I&D sobre o PIB que é superior ao expectável” e, “a partir de certo nível, as despesas em I&D constituem essencialmente um desperdício“, já que “acarretam um custo financeiro sem que a sociedade portuguesa e o tecido económico nacional estejam em condições de beneficiar dos retornos desse esforço”. Essencialmente, acrescenta o documento de trabalho, “Portugal estará a incorrer em despesas cujos principais beneficiários serão empresas de outros países“.

Sobre o contributo dos fundos europeus para o PNR, o veredito do CES contido no documento de trabalho é o de que “considera ajustada a forma como se apresenta (…) a articulação” daqueles instrumentos comunitários “com sete objetivos nacionais, traduzidos a partir dos Pilares Estratégicos do PNR”. Mas a apreciação não termina aqui. O Conselho refere que a informação incluída no PNR acerca deste tema “é, manifestamente, insuficiente e não nos permite avaliar qual o real impacto” dos fundos “sobre os diversos pilares”.

Na opinião do CES a análise que “importa fazer sobre os diversos programas que constituem o Portugal 2020 não se pode circunscrever aos seus aspetos quantitativos“, porque “tão ou mais relevante do que saber quanto estamos a gastar ou qual o número de projetos/operações que iremos apoiar, importa avaliar o benefício que resulta dos mesmos, seja do ponto de vista económico, através do real ou potencial valor criado, seja do ponto de vista social, pela melhoria das condições e qualidade de vida dos cidadãos” que residem em Portugal.

Ainda em matéria de aplicação de fundos europeus, o CES recorda que até ao final do primeiro trimestre de 2017 “os incentivos aprovados atingiam os 11,8 mil milhões de euros (dos cerca de 25 mil milhões dos fundos europeus estruturais e de investimento). Contudo, diz o CES, “a taxa de execução global do Portugal 2020 está nos 13% subindo, um pouco mais, no caso específico do POCI [Programa Competitividade e Internacionalização] em que a taxa de execução atinge os 21%, números relativos ao final de Março de 2017, ou seja, quando formalmente já estamos a percorrer o quarto ano do período a que o Portugal 2020 reporta“.

Análise semelhante é aquela que é feita ao programa de desenvolvimento rural. “Esta aparente contradição entre a insuficiência de verbas alocadas aos programas e a sua pobre execução até à data estende-se, também, ao PDR 2020“, onde se assiste “a uma elevada vontade de investir, com uma quantidade apreciável de candidaturas apresentadas mas, em simultâneo, com muito poucos projetos de investimento atualmente em execução“.

O documento, assinado pelos relatores Adriano Pimpão e Alberto de Castro e que servirá de base ao parecer que o CES tem de emitir sobre o plano, será discutido nesta sexta-feira durante uma reunião da Comissão Especializada Permanente de Política Económica e Social.