Muitos acreditavam que nunca seria possível. Pelo menos não nesta vida. Até que, para o espanto de todos, surgiu a notícia de que Axl, Slash e Duff McKagan se tinham reunido para um concerto nos Estados Unidos. A data era para ter sido isso mesmo, apenas uma data, mas depressa se transformou numa tour norte-americana e numa esperança para os fãs europeus. Até que surgiu o tão esperado anúncio: a formação (praticamente) original dos Guns N’ Roses ia fazer uma digressão na Europa. E ia passar por Portugal.
Para muitos significou o fim de uma longa espera. A última vez que estes Guns N’ Roses passaram por Portugal foi em 1992. Para outros, a possibilidade de ver pela primeira vez ao vivo, em carne e osso, alguns dos melhores músicos da história do rock. Juntos, no mesmo palco. Foi com a sensação de que estavam prestes a assistir a um momento histórico que milhares de fãs se deslocaram esta sexta-feira ao Passeio Marítimo de Algés (onde se realiza todos os anos o NOS Alive). Os bilhetes, postos à venda ainda em 2016, esgotaram há poucos meses. De acordo com números avançados pela revista Blitz, até às 22h, entraram no recinto 57.800 pessoas. Um número impressionante para um concerto não menos impressionante. É que há uma coisa que podemos garantir: esta sexta-feira, ninguém saiu desiludido de Algés.
As portas abriram às 16h mas, antes disso, já havia quem aguardasse pacientemente à entrada. Lá dentro, o cenário era o de um verdadeiro festival: várias tendas de merchadising espalhadas pelo recinto (que ao final da noite estavam praticamente vazias), comida e (muita) bebida. Não faltava nada — o dia prometia ser de rock. E do bom.
Por volta das 19h, subiu ao palco a primeira banda: os Tyler Bryant & The Shakedown. O grupo já não é novo nestas andanças — já abriram para bandas como Lynyrd Skynyrd, Aerosmith e AC/DC. Foi, aliás, com a banda de Angus Young que os texanos visitaram Portugal pela última vez, há exatamente um ano. E o vocalista fez questão de lembrar isso. “É a nossa segunda vez na vossa bela cidade. Só que desta vez o sol está a brilhar“, disse Bryant, recordando que a primeira vez que tocou “para tanta gente” foi quando abriu para AC/DC.
A vinda dos australianos a Algés, em maio de 2016, com Axl Rose na voz e uma perna engessada, ficou marcada por um forte temporal que obrigou os milhares de fãs a vestirem impermeáveis coloridos para se protegerem da chuva. Felizmente, este ano os deuses estavam do lado de Axl e o sol brilhou durante todo o dia.
A seguir aos Tyler Bryant, foi a vez da voz grave de Mark Lanegan encher o recinto. O músico — o segundo grande nome do cartaz — viu-se obrigado a tocar antes do previsto graças a uma ligeira mudança de horários (o concerto do norte-americano foi antecipado para as 19h45 e o de Guns N’ Roses para as 20h45). A atuação foi curta (com pouco mais de 45 minutos), mas foi boa e serviu de apresentação ao seu mais recente álbum, Gargoyle, editado no final de abril.
O concerto dos Guns N’ Roses estava marcado para as 20h45 e, por volta dessa hora, ainda havia quem lutasse para conseguir entrar no interior do recinto devido à grande afluência. Lá dentro, o público ia aguardando impaciente o início do espetáculo, que já ia atrasado. Até que finalmente começaram a soar os primeiros tiros de pistola e todos souberam o que vinha a seguir: o tema dos Looney Tunes. Mas a primeira música a valer foi outra — “It’s So Easy”, uma das mais famosas do mítico (tão mítico) Appetite for Destruction. E realmente parecia tão simples. Apesar da longa separação (e muitas chatices à mistura), foi possível perceber logo aos primeiros minutos que a química que fez o sucesso dos Guns N’ Roses continua lá. A máquina ainda funciona.
Mas o melhor ainda estava para vir. Depois de um simples “boa noite” de Axl Rose, Slash pegou na Les Paul e tocou os primeiros acordes de “Welcome to the Jungle”. O público ainda não tinha parado de gritar, mas fez-se ouvir ainda mais alto. A multidão desatou aos pulos e era quase impossível ficar quieto. O melhor era mesmo pular e deixar-se ir. Depois de “Double Talkin’ Jive”, foi tempo da mais recente “Better”, do Chinese Democracy, de 2008, com um solo a soar diferente do original. “Estranged” foi um dos melhores momentos da noite e talvez o primeiro em que se notou verdadeiramente a presença de Dizzy Reed, teclista da banda desde os anos 90.
A boa forma do grupo foi, sem dúvida, o mais surpreendente de tudo. Na última passagem por Portugal com AC/DC, Axl Rose já tinha mostrado estar à altura do desafio. Dúvidas houvessem, esta sexta-feira mostrou que ainda tem jogo de anca e que a voz não lhe falha, e até rodopiou agarrado ao microfone como nos velhos tempos. Já Slash, com a icónica cartola no cimo da cabeça, fez questão de não parar um segundo — a solar e a correr de um lado ao outro do palco. Duff McKagan, Richard Fortus e Dizzy Reed não lhes ficaram atrás, sólidos, coesos. As novas aquisições, a teclista Melissa Reese e o baterista Frank Ferrer, estiveram à altura.
Já perto do final, Axl sentou-se para a balada mais famosa da banda, “November Rain”, um dos muitos clássicos que desfilaram ao longo do concerto de bem mais de três horas. Na verdade, a setlist teve tudo o que um fã podia desejar: percorreu praticamente todos os álbuns, incluiu todos os clássicos, as covers costume (como “Knockin’ on Heaven’s Door”), e ainda algumas novidades, como uma versão de”New Rose”, dos The Damned, de “Wish You Were Here”, dos Pink Floyd (como mais solos do que seria desejável) e um tributo a Soundgarden, com “Black Hole Sun”.
Depois de “Nightrain” e de três horas sem pestanejar, os Guns N’ Roses voltaram para um encore, que incluiu uma versão acústica de “Patience” e a muito aguardada “Paradise City”. O concerto terminou com fogo de artifício e uma chuva de confetti. O público queria mais, mas a banda voltou apenas ao palco para uma vénia conjunta. Em resposta, os fãs reuniram todas as forças para uma última salva de palmas e um último grito, mais do que merecidos.