A Autoridade Tributária iniciou nove processos de contraordenação contra cinco instituições financeiras por infrações na apresentação das declarações do modelo 38, que comunicam as transferências feitas para paraísos fiscais. Em causa estão infrações por omissões e inexatidão na declaração dos valores cometidas por cinco entidades obrigadas que são acompanhadas permanentemente. Esta iniciativa foi desencadeada pela Unidade de Grandes Contribuintes e já foi remetida para os serviços das finanças competentes para a respetiva instrução, podendo dar origem a coimas. Para já, foram levantados os autos de notícia que constituem o primeiro passo para um processo por infração.
A informação consta da auditoria realizada pela Inspeção Geral de Finanças (IGF) ao chamado apagão no registo de milhares de operações para offshores que excluiu do radar do fisco mais de dez mil milhões de euros entre 2011 e 2015. A auditoria, divulgada esta terça-feira à noite, detetou pelo menos 46 infrações relativas ao atraso nas comunicações de transferências transfronteiriças ou omissões naquela comunicação, mas só em 2017 é que foram levantados os autos de contraordenação.
Apagão nas offshores. Peritos concluíram que ação humana deliberada é extremamente improvável
Das 46 declarações entregues fora do prazo, com um atraso superior a um mês face ao prazo legal, existiam primeiras declarações e declarações de substituição e em cinco destas o atraso foi superior a dois anos, “situação que naturalmente prejudica o controlo, quer pela disponibilização tardia de alguma informação, quer pela sua instabilidade”. A auditoria apurou que quatro declarações de substituição eliminaram 2.483 linhas (operações), o que corresponde a 79% das linhas da declaração inicial, que representavam 257,3 milhões de euros, mais de 80% do valor reportado nas declarações iniciais.
A auditoria confirma ainda a elevada concentração de declarações que ficaram fora do sistema em duas instituições financeiras, com destaque para uma entidade que representa 78% do valor das operações — 7,9 mil milhões de euros — que não ficaram registadas no sistema. Sabe-se que essa instituição, cuja identificação é rasurada, foi o Banco Espírito Santo. O ano em que ocorreram maiores discrepâncias, 2004, foi o ano de queda do BES.
Os peritos contratados pela IGF, alguns internacionais, concluíram que as falhas foram desencadeadas por uma atualização de software realizada em maio de 2013, mas não conseguiram detetar indícios de que tenha resultado de uma intervenção humana deliberada.
Deteção automática de infrações pedida em 2014, mas não foi prioridade
Aliás, a auditoria realça que não estava implementada a deteção automática das infrações relacionadas com o cumprimento desta obrigação de declaração no sistema de contraordenações do fisco (SCO). Aliás, só no dia 2 de maio é que se deu início ao processo de integração no SCO de infrações resultantes da declaração modelo 38. Esta integração só está a ser feita agora, apesar de um pedido nesse sentido remetido em meados de 2014 à justiça tributária pela inspeção tributária.
No entanto, conclui a auditoria da IGF a integração destas infrações no sistema só foi incluída nos projetos informáticos no final de 2015 e que, “considerando a normal gestão de prioridades, apenas em 2017, a área da justiça teve oportunidade de dar início aos trabalhos por insistência da ITA (Inspeção Tributária e Aduaneira).
No entanto, o controlo destas obrigações por parte dos bancos está limitado. A Autoridade Tributária diz que só é possível automatizar “as infrações relativas à apresentação da declaração fora de prazo e às infrações por omissões e inexatidões na declaração.” Isto porque a deteção de infrações por falta de entrega não pode ser automatizada enquanto o universo de obrigados (as instituições financeiras) não estiver delimitado”.
Nesta auditoria, a IGF alerta ainda para outra limitação da atual obrigação de declarar estes valores que só se aplica a operações acima dos 12.500 euros, o que “poderá conduzir ao desdobramento das operações por parte dos ordenantes com o objetivo de evitar o controlo fiscal”. Daí que seja recomendado a ponderação da definição de um limite mínimo no aperfeiçoamento futuro do modelo de declaração 38.