Coube aos Alexander Search fazer as honras da casa. A banda liderada por Júlio Resende foi a primeira a subir ao palco nesta 25ª edição do Super Bock Super Rock. Eram 17h30 e, por incrível que pareça, o palco em frente à pala de Siza Vieira estava repleto de espectadores curiosos. Seria tudo por causa de Salvador Sobral, homem que dá a voz ao projeto que tem como ponto de partida o mais famoso heterónimo inglês de Fernando Pessoa?

Antes de irmos ao concerto, talvez valha a pena contar um pouco da história da banda: “Alexander Search é uma banda de língua inglesa que cresceu na África do Sul, mas que está radicada na Europa, mais concretamente Portugal”, diz a biografia do grupo no Facebook. A sua história é, assim, uma ficção, tal como era o heterónimo de Pessoa (criado quando este vivia na África do Sul). Os quatro membros da banda também são uma espécie de personagens ficcionais, com nomes de heterónimos pessoanos e uma vida “inventada” a condizer.

Em palco com os Alexander Search, Salvador Sobral não é Salvador Sobral, é Benjamin Cymbra — usa um fato preto, cabelo apanhado, gravata de borboleta e uns óculos redondos, tal como os de Fernando Pessoa. O guitarrista — Marvel K. — usa um chapéu de palha, à chinês. Os restantes, vestem-se como calha, mas usam nomes a rigor: Augustus Search, Mr. Tagus e Sgt. William Byng .

Benjamin Cymbra é o vocalista dos Alexander Search. Foram os primeiros a subir ao Palco EDP no primeiro dia do Super Bock Super Rock

Foi exatamente assim que se apresentaram esta quinta-feira no Palco EDP. Foram recebidos com assobios, palmas, e arrancaram com uma música lenta, onde o piano de Resende (desculpem, Augustus Search), compositor e mentor do projeto, soava mais alto. Misturando géneros sem preconceitos, seguiu-se um tema com guitarras puxadas. As reviews do álbum homónimo têm sido boas e não há dúvida quanto à qualidade do projeto. Mas em palco a estrela é Salvador — os seus saltos, as mãos cruzadas junto ao peito e os aaahhhhhhhhh prolongados que arrancam sempre — sempre — um grito ao público.

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Foi só ao terceiro tema que o vocalista disse o primeiro olá — um “obrigado”, com voz fininha. Apresentou os restantes membros da banda e apresentou-se a si próprio: “O meu nome é Benjamin Cymbra. Não vamos falar, não há tempo para falar, só para tocar. ‘Bora tocar!“. E tocaram. Não pararam durante cerca de uma hora, alternando música rápidas com temas mais lentos, não fosse a banda uma mistura de indie-pop, eletrónica e rock, um bolo onde cabe tudo, incluindo o jazz. E Salvador Sobral soube mostrar bem a sua versatilidade, adaptando-se como um camaleão a todos os géneros. Contando a história de um bebé de nariz direito na terra dos narizes tortos, o vocalista arranjou até espaço para rappar. E que bem que o fez.

Benjamin Cymbra usa um fato preto e óculos redondos como os de Fernando Pessoa. Marvel K. ficou-se pelo chapéu de palha

Mas o momento era, sobretudo, de tributo à poesia de Fernando Pessoa: “Vamos fazer uma experiência, manda folhas”. Voaram poemas, mas a experiência correu mal e os papéis mal saíram do Palco EDP. “Na minha cabeça isto era muito mais giro”, brincou Salvador. “Mas mandem uns para os outros! E viva a poesia de Fernando Pessoa!” Seguiu-se um rock “gingão”, a música que deveria servir de despedida. Os restantes já estavam a preparar-se para abandonar o palco, quando Salvador Sobral gritou: “Mais uma, mais uma!”. “Tivemos sorte”, disse ao público. “Temos mais uma!”

Para o adeus final, pediu que os presentes o ajudassem a entoar um “cântico tribal”. A seguir ao single, “A Day of Sun”, foi o tema que arrancou a melhor reação ao público. “Até à próxima! Alexander Search! Uhuuuuuuuu!”, foi assim a despedida, com direito a vénia conjunta e tudo.

Num dia em que os fãs dos Red Hot Chili Peppers estão em maioria (a quantidade de t-shirts que se passeiam pelo recinto falam por si), os Alexander Search, nome desconhecido para muitos, foram um bom aquecimento para este primeiro dia do Super Bock Super Rock. E não só por Salvador Sobral, cuja presença parece tantas vezes absorver tudo o resto (não são assim todos os bons vocalistas?) Vale a pena assistir a este heterónimo que, graças a Júlio Resende, se tornou música. E da boa.