Era preciso acontecer algo verdadeiramente excecional para não fazermos o título, o lead e a entrada deste texto a falar de Katie Ledecky. Mas aquela cara quando se aproximou do pódio e não foi para subir ao seu lugar mais alto dizia tudo: para a americana, uma prata é quase uma derrota (e curiosamente partilhando esse lugar com a australiana Emma McKeon, que acabou com o mesmo tempo). E foi isso que aconteceu na final de 200 metros livres, “caindo” perante quem menos se esperava à partida e olhando para o que se passou nos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro, no ano passado: Federica Pellegrini, a mulher das sete vidas.

Comecemos já por aqui: porquê sete vidas? Podíamos estar a falar dos altos e baixos da sua vida, sobretudo por motivos extra natação. Mas vamos ser mais diretos: com este ouro em Budapeste, a transalpina tornou-se a primeira nadadora de sempre (no setor masculino e feminino) a conseguir ganhar medalhas em sete Mundiais de natação de piscina longa consecutivos (uma prata em Montreal 2005; um bronze em Melbourne 2007; dois ouros em Roma 2009; dois ouros em Shangai 2011; uma prata em Barcelona 2013; duas pratas em Kazan 2015; e um ouro em Budapeste 2017).

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Tudo começou quando, com apenas 16 anos e uma cara de menina a comparar com as adversárias, encantou tudo e todos na prova dos 200 metros livres dos Jogos Olímpicos de Atenas. Acabou por não ganhar o ouro, perdendo apenas para a romena Camelia Potec, mas conseguiu tirar do pódio nomes grandes da especialidade como a alemã Franziska van Almsick ou a americana Dana Vollmer. Era o início de uma era que ainda hoje se mantém com 28 (faz 29 anos na próxima semana).

Mas nem tudo foram rosas e a carreira desportiva de Federica acabou por ser um carrossel a subir (soma um total de 36 medalhas entre Jogos, Mundiais e Europeus de piscina longa e piscina curta, 22 de ouro) e a descer (não conseguiu subir ao pódio nas últimas duas edições dos Jogos Olímpicos, que são sempre o maior objetivo, e somou algumas notícias menos abonatórias para a sua imagem ao longo do tempo).

Pelo meio, houve um pouco de tudo: incursões quase mensais no mundo da moda (a sua grande paixão depois da natação), produções fotográficas que fizeram dezenas de capas (a mais famosa quando pousou nua para a Vanity Fair, em 2009), problemas de controlo de ansiedade e stress antes das provas, triângulos amorosos que lhe valeram muitas críticas. E por duas vezes.

Quando tinha 23 anos, terá começado a encontrar-se com Luca Marin, companheiro de equipa na seleção italiana, quando o nadador ainda namorava com Laure Manaudou, francesa com quem manteve a maior rivalidade dentro das piscinas nos 100 e 200 metros livres; mais tarde, quatro anos depois, trocou Marin, de quem chegou a estar noiva, por outro companheiro transalpino, Filippo Magnini. “Itália só se transformou num país feminino há pouco tempo, nem todos permitem a uma mulher ser vencedora e uma personagem fora da sua ‘casa’, do seu núcleo familiar. Quando se é uma mulher determinada, isso é muitas vezes interpretado como arrogância”, argumentou numa entrevista sobre os ‘ódios’ que tem em Itália.

A ‘Leoa de Verona’, como também é conhecida, tem por hábito colocar alguns artigos seus no eBay para doar as receitas para instituições de caridade e nutre um especial gosto por tatuagens, algo que lhe acentuou a imagem de rebelde: começou ainda antes dos Jogos Olímpicos de 2004 e já tem mais de dez. Mas se é verdade que pode atrair alguns ódios, a personalidade e os resultados também faz com que seja adorada. Até porque se trata, sem qualquer dúvida, da melhor nadadora e de uma das mais vencedoras desportistas italianas.

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Mas o quarto dia de finais nos Mundiais de natação teve muitos outros pontos de interesse e até um gesto comovente: o sul-africano Chad le Clos, que há anos mantém uma grande rivalidade com o húngaro Laszlo Cseh na mariposa, venceu a final dos 200 metros em território magiar mas nem por isso deixou de ser abraçado após a prova pelo adversário, com quem mantém uma forte relação de amizade.

Nas outras finais, o italiano Gabrielle Detti conseguiu ganhar a medalha de ouro nos 800 metros livres com o tempo de 7.40,77, numa prova onde conseguiu passar na ponta final para a frente do polaco Wojciech Wojdak (7.41,73) e do também transalpino Gregorio Paltinieri (7.42,44). O favorito Sun Yang ficou-se pelo quinto lugar. Já Adam Peaty confirmou o grande momento nos 50 metros bruços, vencendo com a segunda melhor marca de sempre (25,99) o brasileiro João Gomes Júnior (26,52) e o sul-africano Cameron Van Der Burgh (26,60).

Por fim, a estafeta mista dos Estados Unidos (Matt Grevers, Lilly King, Caeleb Remel Dressel e Simone Manuel) de 4×100 metros estilos conseguiu bater o recorde do Mundo outra vez (3.38,56), vencendo na final a Austrália, a China e o Canadá, que dividiram a medalha de bronze.

Alexis Santos foi o único português em ação esta quarta-feira, acabando as meias-finais dos 200 metros estilos com o 12.º melhor tempo, 1.59,22, a sua segunda melhor marca de sempre apenas superado pelo recorde nacional absoluto estabelecido também este ano em Coimbra (1.58,88). O nadador olímpico terminou a primeira série no quinto lugar, mas a segunda meia-final acabou por ser bem mais rápida, deitando por terra a esperança de garantir apuramento para a derradeira prova.