O secretário-geral do Serviço de Informações da República Portuguesa (SIRP), Júlio Pereira, admitiu esta quinta-feira que o SIS (Serviço de Informações e Segurança) só teve conhecimento do roubo de armamento de Tancos através das notícias. Em audição na Comissão de Defesa, Júlio Pereira diz que foi informado pelo SIS, que também só soube do roubo quando este foi divulgado pela imprensa no dia seguinte ao assalto.
Júlio Pereira considerou depois que ter uma informação de que houve um assalto “pouco ou nada significa” se não se souber o conteúdo do que foi roubado. Se o furto ocorreu de 28 para 29 de junho, considerou, “não é excessivo” o tempo que levou até a informação sobre o furto ter sido divulgada.
A audição acontece a pedido do PSD para esclarecer “sucessivas intervenções contraditórias” sobre eventuais ligações do furto de material militar dos paióis nacionais de Tancos a redes terroristas. Na terça-feira, os deputados da comissão de Defesa Nacional já ouviram o chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas (CEMGFA), general Pina Monteiro, e a secretária-geral do Sistema de Segurança Interna, Helena Fazenda.
Para 12 de setembro está prevista mais uma audição do ministro da Defesa Nacional, Azeredo Lopes. Perante os deputados, na terça-feira, o CEMGFA garantiu que nunca chegou ao Centro de Informações e Segurança Militares (CISMIL) qualquer informação ou rumor sobre uma potencial ameaça em relação aos paióis de Tancos.
Pina Monteiro esclareceu, contudo, que o seu papel no “caso de Tancos” foi “muito reduzido”, mas recusou qualquer desvalorização do que aconteceu, mantendo que sempre considerou o caso “grave”. A secretária-geral do Sistema de Segurança Interna adiantou, por outro lado, que não recebeu qualquer informação sobre a eventual ameaça ou preparação de um furto de armamento em Tancos e admitiu ter sabido do que aconteceu pelos jornais.
Porém, Helena Fazenda desdramatizou esse facto, sublinhando que quer a Polícia Judiciária, quer a Polícia Judiciária Militar iniciaram rapidamente as investigações ao caso. O Ministério Público abriu um inquérito ao desaparecimento daquele armamento militar, estando em causa suspeitas da prática dos crimes de associação criminosa, tráfico de armas internacional e terrorismo internacional.
O deputado do PSD Matos Correia justificou a necessidade de mais esclarecimentos sobre esta matéria afirmando que depois da reunião do dia 11 de julho entre o primeiro-ministro, António Costa, os chefes militares dos três ramos e o general Pina Monteiro, “factos que tinham sido considerados graves passaram a ser considerados de menor relevância”.
A comissão de Defesa Nacional solicitou ainda ao Ministério da Defesa “informação acerca do andamento” do processo e das averiguações determinadas para apurar as circunstâncias e condições em que ocorreu o furto.
O furto de material de guerra nos paióis nacionais de Tancos, Vila Nova da Barquinha, Santarém, foi divulgado pelo Exército no dia 29 de junho. Granadas de mão, granadas foguete anticarro, de gás lacrimogéneo e explosivos estavam entre o material de guerra furtado.
Foi equacionado o cenário de terrorismo
O relatório equacionou como “cenário plausível” o envolvimento de estruturas criminosas organizadas, “portuguesas ou estrangeiras, terroristas ou extremistas”.
“O relatório de informações equacionou cenários plausíveis, tendo em consideração a intenção dos eventuais agentes da ameaça, designadamente o possível envolvimento na ação criminosa, de estruturas criminosas organizadas, designadamente portuguesas ou estrangeiras, terroristas ou extremistas”, revelou esta quinta-feira o secretário-geral do Sistema de Informações da República Portuguesa (SIRP), Júlio Pereira.
Ouvido na comissão parlamentar de Defesa Nacional, a requerimento do PSD, Júlio Pereira considerou “especialmente preocupante” a “intenção e capacidade de grupos criminosos” de infiltrar “estruturas estatais”. E, “neste contexto”, acrescentou, “gostaria de mencionar o risco associado à saída das Forças Armadas de indivíduos que aí prestaram serviço, em especial nas forças especiais, e que posteriormente, sem qualificações que não sejam militares, se veem integrados na vida civil sem grandes perspetivas de futuro”.
O chefe das secretas referiu, como exemplo, que no relatório de segurança interna de 2014 o SIS fez referência à posse de armas de fogo de calibre de guerra por parte de grupos criminosos”.
O fenómeno deveria ser objeto de acompanhamento pelas entidades competentes”, defendeu.
No que toca ao furto de material militar, nos Paióis de Tancos, divulgado a 29 de junho, e questionado pelo BE, Júlio Pereira considerou “razoáveis” os argumentos de que o assalto exigiria “cumplicidade interna”.
“Os argumentos de que este assalto exigiria algum grau de cumplicidade interno são razoáveis, designadamente se conjugarmos estes factos com outros factos que aconteceram anteriormente”, afirmou, sem adiantar a que factos se referia. Na sua intervenção inicial, o secretário-geral do SIRP disse ainda que “não tem sido referenciada, pelo menos recentemente, a utilização do tipo de material de guerra furtado em Tancos” por parte de grupos criminosos organizados.
O comércio ilícito de armas de fogo em Portugal “continua a constituir uma preocupação securitária” e “deve ser combatida”.