Podem viver entre 500 a mil anos, ter até 40 metros de altura e não são dados a doenças. Os carvalhos-alvarinho são uma espécie comum em Portugal, sobretudo no Minho, e terão sido levados para a Madeira no início da colonização da ilha. Um deles, com cerca de 200 anos, matou esta terça-feira 13 pessoas, ferindo mais 49.
Esta quarta-feira, especialistas do Instituto Superior de Agronomia e da Câmara do Funchal estão no local a fazer uma peritagem para apurar as causas e responsabilidades do acidente.
Características do carvalho-alvarinho
O carvalho-alvarinho, também conhecido como carvalho-roble (Quercus robur), é uma árvore de folha caduca e que pode atingir entre 30 a 40 metros de altura, explica João Branco, presidente da Quercus – Associação Nacional de Conservação da Natureza.
É uma árvore que “requer muita humidade” e que existe essencialmente no “centro e litoral de Portugal” a “baixa altitude”. “Acima dos 600 metros começa a desaparecer e a ser substituído para carvalho-negral [Quercus pyrenaica]”, refere o engenheiro florestal ao Observador.
O “solar da espécie” — local em que a árvore “melhor se adapta” e onde está “mais presente” — é o Minho, em particular no Parque Nacional da Peneda-Gerês. “O Minho é o sítio onde mais chove no país e é a única região onde o clima é predominantemente atlântico e não mediterrâneo”, acrescenta o especialista.
O carvalho-alvarinho não é uma espécie originária da Madeira, onde o “clima é subtropical”, e terá sido levada para a ilha no século XV, durante a sua povoação.
Era muito comum os colonos levarem plantas que já conheciam para as plantarem nas ilhas e uma delas foi o carvalho-alvarinho”.
Ou seja, “não está nas suas condições ecológicas normais“, o que pode “influenciar o crescimento e o tipo de podridões e fungos que podem atacar estas árvores”.
Provavelmente porque o clima é subtropical terá outras condições para o desenvolvimento de fungos”, acrescenta o presidente da Quercus.
Apesar de não ser uma espécie em extinção, atualmente existem poucos bosques de carvalhos-alvarinho, uma vez que foram sendo substituídos ao longo dos anos com a agricultura e pela pastorícia. Mais tarde a reflorestação foi feita sobretudo através da “plantação de pinhais e eucaliptais”. A relativa raridade da espécie levou mesmo a Quercus a lançar uma petição pública para a “proteção legal dos carvalhos de folha caduca”, uma vez que estas árvores continuam a ser cortadas para lenha.
Carvalho de 200 anos é velho?
Para João Branco, um carvalho-alvarinho com cerca de 200 anos — idade estimada da árvore que caiu esta terça-feira no Funchal — “não é uma árvore velha”, referindo que esta árvore pode chegar até aos mil anos.
Já Luís Martins, engenheiro florestal doutorado em patologia vegetal, considera que se trata de uma árvore com uma “idade respeitável”, o que requer uma análise mais cuidada. Este técnico refere que estas árvores podem ter centenas de anos, mas deu como referência máxima um valor mais baixo, 500 anos.
É normal o carvalho-alvarinho ter doenças?
Não se sabe ao certo o que provocou a queda da árvore na Madeira, cujas raízes foram arrancadas da terra e o tronco se partiu, pelo que várias hipóteses estão ainda em cima da mesa.
A possibilidade de doença é uma delas. Para Luís Martins, já que se trata de uma “árvore velha”, deveria ter “menos defesas” e estar mais exposta a doenças.
“Uma árvore mais velha vai tendo menos resiliência e defende-se menos dos fungos e insetos”, explica o professor da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD) ao Observador.
Já de acordo com o presidente da Quercus não há nenhuma doença específica deste tipo de árvores e é “muito raro” aparecerem podridões que levem à queda da árvore. “Pelo contrário, é uma madeira muito resistente e não tem doenças que destruam o seu tronco”, acrescenta.
Ainda assim João Branco não descarta totalmente esta possibilidade. “Tudo pode acontecer. Pode haver uma podridão aleatória em qualquer lugar”, refere. Há, por exemplo, fungos que podem afetar as raízes das árvores, provocando posteriormente a sua queda pela base. Ainda assim, isto é uma “situação rara” nos carvalhos.
Outra das hipóteses é uma “ferida na casca” — seja porque “um trator bateu na árvore ou porque houve um choque qualquer” — que se tenha tornado numa “porta de entrada a fungos e bactérias” e que acabou por ir apodrecendo o lenho.
O presidente da Quercus pinta ainda outro cenário: a queda da árvore por inteiro estar relacionada com a “falta de sustentabilidade”. Isto é, a árvore estar num “sítio com pouca terra”, “em que as raízes estão muito à superfície”, e como têm uma “copa muito grande”, a força que o vento exerce na árvore pode levar à sua queda porque não tem sustentabilidade suficiente para aguentar a força do vento.
Quais são os sinais a que se deve estar atento?
Tanto João Branco como Luís Martins sublinham a importância de monitorizar as árvores — em particular se se encontrarem em jardins ou arruamentos — para perceber se há “risco de queda ou de queda de ramos”.
“Um dos critérios de avaliação é a presença de pragas e doenças“, adianta o presidente da Quercus, acrescentando que a associação tem um protocolo com a câmara de Viseu para fazer a “monitorização anual das árvores dos jardins e das ruas para evitar acidentes”.
“Tem de ser feita uma avaliação para perceber os riscos e a necessidade de intervenção, e para isso é preciso um diagnóstico”, acrescenta o professora da UTAD.
E há sintomas que denunciam os problemas de saúde de uma árvore, como por exemplo, “feridas ou buracos nos troncos”, “alteração da cor da folhagem [mais amarela]”, “folhas mais secas”, “um ramo a morrer no meio da copa”, “um número anormal de insetos na árvore”, “manchas nas cascas”, entre outros sinais.
“Normalmente, a podridão do tronco que faça cair a árvore tem sinais visíveis”, diz João Branco, acrescentando que uma árvore pode ter sinais de podridão e não estar em risco de queda.
Mas faz uma ressalva: “Não há podridões fulminantes em árvores de 200 anos. Este tipo de podridão demora sempre algum tempo, até anos, a desenvolver-se.”
Ainda assim, há doenças nas árvores que são assintomáticas (não apresentam sintomas). “Há situações em que não se consegue detetar o problema”, explica Luís Martins.
A Quercus espera, contudo, que a tragédia na Madeira não “sirva de desculpa” para os autarcas começarem a cortar as árvores. “Isso não é solução. É preciso fazer monitorização.”