Cavaco Silva esteve bem nalguma da substância, mas esteve mal na forma. Esta é, em resumo, a opinião de Luís Marques Mendes sobre a intervenção do ex-Presidente da República durante a universidade de verão organizada pelo PSD. No espaço de comentário semanal na SIC, o antigo líder social-democrata disse, neste domingo, que Cavaco “não foi feliz” nos termos que usou para criticar a atual solução de Governo e de maioria parlamentar, considerando que as expressões “perder o pio, piar baixo, piar alto” não são linguagem adequada a um ex-Chefe de Estado.

Marques Mendes também avaliou negativamente os reparos que o ex-PR dirigiu a Marcelo Rebelo de Sousa, ao afirmar que as críticas ao seu sucessor na Presidência não foram um ato “bonito, nem justo”. Concluiu que se tratou de um “mau precedente” no quadro de uma “boa prática” que é a de, em Portugal, o “Presidente que sai não critica o seu sucessor”. Para o comentador, Cavaco Silva precisa de seguir dois conselhos: evitar intervenções públicas que possam ser interpretadas como ajustes de contas e falar mais do futuro e menos do passado.

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Apesar desta avaliação, Marques Mendes declarou que o antigo Presidente da República teve “carradas de razão” em muito daquilo que disse na universidade de verão do PSD. Sobre François Hollande e Alexis Tsipras, Marques Mendes subscreveu as declarações de Cavaco Silva ao considerar que os políticos francês e grego iniciaram os respetivos mandatos com a promessa de acabar com a austeridade para acabarem a praticá-la.

No plano nacional, o comentador afirmou que o ex-PR teve razão ao referir que, com mais impostos e mais despesa pública, a economia não poderá ser competitiva. Idêntica avaliação positiva foi dada à declaração de Cavaco de que o Governo liderado por António Costa prometeu uma estratégia económica e está a executar uma estratégia contrária. Luís Marques Mendes disse que o PS tinha garantido que o crescimento seria alcançado através do aumento do investimento público e do consumo, quando aquilo que está a sustentar o aumento do ritmo da atividade económica é o investimento privado, bem como as exportações.

Na opinião do comentador, o que Cavaco Silva disse são apenas verdades “inconvenientes”. O antigo presidente do PSD acrescentou outro ponto. Antes de chegar ao poder, o PS garantia que não seria possível reduzir o défice público e promover o crescimento em simultâneo. Este “mito caiu”, afirmou Marques Mendes: “estamos a cumprir as regras e a crescer como poucas vezes sucedeu”.

O Orçamento do Estado mais difícil

O Orçamento do Estado para 2018 será o mais difícil de fazer para o atual Governo, declarou Marques Mendes, pois considera que o ambiente na coligação “já não é o que era” e as pressões do PCP e do Bloco de Esquerda são agora mais elevadas. Neste quadro, o comentador prevê que as negociações se prolonguem para além da data das eleições autárquicas, agendadas para 1 de outubro.

O documento, antecipa Marques Mendes, será o “mais eleitoralista” entre aqueles que já foram elaborados pelo Governo de António Costa, não só por causa da proximidade de um ato eleitoral, mas porque “todos acham que há folga suficiente para abrir os cordões à bolsa”. Falta saber, disse o comentador, “se no final vamos ter um Orçamento de eleitoralismo moderado ou um Orçamento de eleitoralismo pesado”. Por estes motivos, o antigo líder do PSD considera que o Orçamento para o próximo ano será o “mais perigoso de todos”, adiantando que o “maior perigo” é o de “voltarmos a ter um grande aumento de despesa pública”.

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Luís Marques Mendes criticou aquela que considera ser a perspetiva atual do Governo e da maioria: o “crescimento da economia dá para tudo”, incluindo o alívio fiscal, a redução do défice e o aumento da despesa pública. Porém, alertou, o crescimento é “muito ilusório e pouco sustentado”, fruto de uma conjuntura externa favorável que se reflete na boa saúde do turismo e das exportações. “Basta que passe o tempo de vacas gordas para voltarmos ao ciclo vicioso de sempre: a economia arrefece, a receita baixa, a despesa fica e temos de aumentar impostos”, avisou o comentador.

O risco político “enorme” é o de o primeiro-ministro ceder “em demasia” às reivindicações dos parceiros da maioria, o que considera “muito provável”, por causa do PCP. Marques Mendes acredita, no entanto, que, quando “chegar o momento da verdade”, a proposta de Orçamento do Estado para 2018 acabará por ser aprovada, mesmo que entretanto os comunistas ameacem com a possibilidade de optarem pela abstenção.