O embaixador de Angola em Portugal disse, em Luanda, que as relações entre os dois países lusófonos “estão neste momento numa frieza”, como “de resto publicamente já se fez sentir”.
Marcos Barrica falava à imprensa à margem da IV sessão ordinária do Comité Central do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), partido no poder, do qual é membro.
“Há razões que sustentam esse estado de coisas, mas há um esforço continuado entre as autoridades de um lado e do outro, para que os fatores que sustentam esta situação, que espero seja transitória, possam ser ultrapassados, para o bem dos nossos povos, dos nossos governos e dos nossos países”, disse Marcos Barrica.
O diplomata angolano apontou o caso judicial que envolve o ex-vice-Presidente angolano, Manuel Vicente, como um dos fatores de baixa nas relações entre Angola e Portugal.
“Essa questão judicial, que impende sobre um dirigente do nosso país, é um dos [fatores] que sustenta essa situação. Vamos lá ver se isso se ultrapassa”, referiu o embaixador de Angola em Portugal.
O procurador-geral da República de Angola disse este mês que as autoridades portuguesas chegaram a equacionar o envio do processo com a investigação ao ex-vice-Presidente angolano para Luanda, mas que recuaram após a publicação de uma Lei de Amnistia.
A informação foi transmitida por João Maria de Sousa, em Luanda, referindo-se aos contactos daquela Procuradoria com as autoridades portuguesas, sobre o processo ao agora ex-vice-Presidente de Angola, acusado na Operação Fizz, em Portugal, de corrupção ativa mas que alega que não foi notificado e que continua a gozar de imunidade.
“Já tivemos várias abordagens. Numa primeira fase, o processo esteve quase a ser transmitido para as autoridades angolanas, as autoridades portuguesas depois fizeram um recuo, quando souberam que tinha sido publicada uma Lei da Amnistia em Angola. Daí para cá tem havido contactos, não só ao nível do Ministério Público, mas também ao nível do Estado, através do ministro da Justiça e dos Direitos Humanos”, explicou o procurador, questionado pela Lusa.
Sob proposta do então chefe de Estado, José Eduardo dos Santos, o parlamento angolano aprovou em 2016 uma Lei da Amnistia, que entrou em vigor a 12 de agosto do mesmo ano, abrangendo todos os crimes comuns puníveis com pena de prisão até 12 anos cometidos por cidadãos nacionais ou estrangeiros até 11 de novembro de 2015, excetuando os de sangue.
Entretanto, José Eduardo dos Santos e Manuel Vicente cessaram funções a 26 de setembro, com a posse de João Lourenço e Bornito de Sousa, respetivamente como Presidente e vice-Presidente da República.
Contudo, o novo estatuto dos antigos Presidentes da República, que se aplica igualmente aos vice-presidentes, mantém a imunidade, sendo que no caso de Manuel Vicente, após cessar funções assumiu, a 28 de setembro, o cargo de deputado à Assembleia Nacional.
As autoridades angolanas chegaram a pedir um parecer ao Tribunal Constitucional, sobre o levantamento da imunidade a Manuel Vicente, mas, perante a indignação do Governo angolano, a justiça portuguesa avançou com o processo para julgamento.
Este processo tem motivado um agravamento da tensão nas relações entre os dois países, com críticas por parte das autoridades angolanas.
“Não pode deixar de ser sensível. Estamos perante um vice-Presidente da República que, na altura, podia até substituir o Presidente da República, não só nas situações de ausência ou de impedimento, mas até em situação de vacatura tem competência para levar o mandato de Presidente da República até ao final”, explicou o procurador-geral angolano.