Inevitavelmente, este atelier tem papel e cartão por todo o lado. Há restos de recortes, pedaços inutilizados e a impossibilidade de manter a bancada de trabalho permanentemente limpa. No centro do Porto, o estúdio Oupas! (que é como quem diz “borá lá” em portuense) transforma a matéria plana em objetos tridimensionais. Estes podem não ser os recursos mais nobres do mundo, mas foi com eles que Joana Croft, Sofia Farinha Gomes e Cidália Abreu construíram uma linguagem própria. “Nunca planeámos propriamente fazer coisas de papel e cartão, simplesmente queríamos juntar-nos para desenvolver algo. Quando saímos da faculdade, falámos com professores para ter alguma ajuda e encubar o projeto. Não tínhamos muito dinheiro e estes eram materiais fáceis de trabalhar e baratos”, conta Sofia, designer e uma das fundadoras do estúdio.

Estávamos em 2010 e as três amigas tinham terminado o curso de Design na Escola Superior de Estudos Industriais e Gestão, em Vila do Conde. Mais do que projetar à frente de um computador, a faculdade tinha-lhes ensinado a usar as mãos. Os primeiros tempos foram passados a trabalhar nas instalações da escola e as primeiras produções sobretudo cartazes e flyers, bem menos espetaculares do que as peças que vemos hoje. Mas caso mudou de figura quando foram convidadas a fazer uma montra artística no Centro Comercial Bombarda. “Alguns artistas expõem lá e foi aí que nos apresentámos à cidade. Foi um trabalho mais tridimensional, uma espécie de manifesto com letras grandes. Pensávamos que ia ser pontual, mas muita gente viu e achou graça precisamente por ser diferente”, relata Joana, outras das fundadoras do estúdio Oupas!.

Da esquerda para a direita, Sofia, Joana e Cidália, as fundadoras do estúdio Oupas!. No centro, o gato Tobias © Daniel Sommer

E quando pensavam que a intervenção no Bombarda District tinha sido aquele momento realmente life-changing, pediram-lhes que construissem um palco para a TEDx Porto. Depois, veio uma cidade de cartão à escala real feita só com desperdícios, uma cozinha, também em tamanho de gente grande, e os cogumelos gigantes, com o video mapping do Grandpa’s Lab à mistura, para a Thought For Food Gobal Summit. “Não foi planeado, simplesmente fomo-nos apaixonando e hoje 90% do que fazemos é em papel e cartão”, afirmam.

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Joana, Sofia e Cidália trabalham juntas há oito anos. Hoje, estão à beira dos 30 e dizem que, dentro do atelier, os feitos encaixam na perfeição. Na hora das apresentações, Joana é descrita como a mais tímida, contudo é também a que sobe ao palco quando é preciso falar sobre o atelier. As amigas dizem que chega a ser filosófica, logo, faz sempre um brilharete. Sofia é o elemento bem disposto e Cidália a que menos viaja na maionese. Mesmo num negócio que vive na criatividade, convém que haja quem mantenha os pés bem assentes na terra. Ah, depois há um gato. Tobias é o quarto elemento da equipa, pachorrento e, volta e meia, requisitado na condição de mascote para sessões fotográficas e apresentações de projetos a clientes.

No ano passado, o Oupas! fez estes cavalinhos de papel para a relojoaria Marcolino, no Porto © Divulgação

Entretanto, mudaram-se todos para um espaço com áreas bem mais generosas. Alguns trabalhos, cada vez mais megalómanos, já nem passavam nas portas, mas no novo atelier a equipa até aumentou. O Oupas! ganhou mais um par de mãos para ajudar a fazer face às encomendas. As ideias, essas continuam a vir das mesmas três cabeças pensadoras. “No início fazíamos tudo mais ou menos olho, depois fomos melhorando. Agora, olhamos para os primeiros projetos e achamos que está tudo mal. Mas, principalmente as peças de escala maior permitiram-nos criar um estilo próprio. Seja no que for, mesmo nos projetos mais pequenos, a parte criativa tem sempre de passar por todas”, admite Joana.

Dentro de um atelier de design, a ecologia não podia ficar de parte. Quando Joana, Sofia e Cidália começaram a usar papel e cartão nos primeiros trabalhos, pensaram também na possibilidade de utilizar material reciclado ou simplesmente na facilidade em reciclar as peças que criavam para eventos e que perdiam a função em poucos dias.

Em 2015, o Studio Astolfi bateu-lhes à porta. O atelier lisboeta procurava quem fosse capaz de construir frutos em papel e o coletivo portuense excedeu as expetativas. Depois de grandes cenários para conferências e eventos corporativos, o Oupas! entrava noutro campeonato, no da moda. “A partir da montra de Hermès, chegámos a outros públicos”, explica Sofia. O resultado deste trabalho conjunto veio a público na primavera desse mesmo ano, altura em que a loja de Lisboa, se vestiu de cores quentes e espécies tropicais. No ano passado, o trio voltou às montras do Chiado, desta vez com um livro-instalação para a Claus Porto. A marca histórica portuguesa fez a encomenda para celebrar o lançamento do seu primeiro perfume. O obra-prima não ficou exposta só em Lisboa, viajou para Paris e teve lugar de destaque no Le Bon Marché. Os altos voos continuaram. Também em 2017, o atelier fez uma montra para a loja da Josefinas, em Nova Iorque. O resultado deu nas vistas e pôs o estúdio de design na boca de bloggers e influencers.

Dividido entre duas escalas, o atelier faz sucesso no Instagram, onde é possível algumas peças em movimento. Através das redes sociais, são cada vez mais os seguidores a querer comprar pequenas obras de artes em papel, o que deixou as três amigas com vontade de dar um passo em frente no negócio. O atelier, na Rua dos Bragas, já tem uma montra virada para quem passa e mesmo sem mãos a medir, a equipa arranja sempre maneira de dar forma a algumas ideias próprias. Agora, é começar a levar a coisa mais a sério e criar uma espécie de loja, paredes meias com o espaço de trabalho. A primeira leva de peças vendidas ao público chega dentro de poucos dias, mesmo a tempo do Dia dos Namorados. Não sabemos se são corações ou morangos podres. Sabemos que, invariavelmente, serão feitos de papel. Venham eles.

Nome: Oupas!
Data: 2010
Ponto de venda: Rua dos Bragas, 85, Porto

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