Nos últimos anos vimos um aumento da atenção dada às Artes Marciais Mistas (MMA), um desporto de combate que une diversas artes marciais numa só. O mediatismo que a Ultimate Fighting Championship (UFC), uma das organizações norte-americanas da modalidade, conseguiu em todo o mundo tornou alguns atletas reconhecíveis por praticamente toda a gente. São os casos de Conor McGregor e Ronda Rousey cujas histórias, vitórias e derrotas preencheram quilómetros de texto nos últimos anos.
Como desporto foi uma óbvia escolha para adaptações a videojogos, ainda que, a par das restantes modalidades, o sucesso comercial destes dependam muito do quão abrangentes são em termos de seguidores. O primeiro jogo baseado na UFC foi lançado em 2000, e a sua expressão tímida do ponto de vista comercial enquadrava-se com os “primeiros passos” da organização desportiva.
Tendo em conta que negócio atrai negócio e os muitos milhões que já circundam a UFC, não foi de espantar que a gigante Electronic Arts, através da sua chancela EA Sports, decidisse criar uma parceria com a organização e lançasse, em 2015, o primeiro jogo da série, o EA Sport UFC. O terceiro já se encontra disponível.
Adaptar um desporto a videojogo não é certamente uma tarefa fácil. Com o futebol, por exemplo, é fácil sentirmos que o nível de rigor técnico e desportivo que os videojogos têm hoje são fruto de décadas de evolução. Os dois jogos de EA Sports UFC que saíram antes deste UFC 3 foram adaptações medianas pela falta de “conhecimento” de como adaptar este desporto especifico a este meio. Mas o EA Sports UFC 3 mudou tudo isso.
Desde os primeiros minutos dentro dos seus octógonos virtuais de combate que percebemos que se trata de um bom jogo, para além de uma boa tradução em game design das particularidades do MMA. É divertido e interessante, até para quem não conhece ou nem tem proximidade com este desporto de combate, e praticamente todos os lutadores e lutadoras que competem nos dias de hoje na UFC.
Há muitas criticas que podemos fazer à Electronic Artes, em que a ganância desmedida é a mais óbvia, mas ninguém os pode acusar de amadorismo. A qualidade técnica das suas produções é indiscutível e os anos de representação da anatomia humana e do atletismo, dotou-os com uma capacidade única neste campo. O realismo das animações e modelações dos atletas, como os músculos que se contraem ou as expressões faciais que demonstram o que cada lutador está a pensar, não é portanto de surpreender.
Realismo é, aliás, a palavra certa para descrever este jogo e é isso que justifica a sua definição para maiores de 16 anos. O sangue que jorra depois de um murro certeiro, os inchaços nas caras martirizadas, a violência do impacto de um pontapé na cabeça que deixa o adversário cambaleante e que apesar de fiéis a um combate real, não são de todo apropriados aos mais novos.
Dos diversos modos disponíveis, como os habituais multiplayer locais e online e um sistema semelhante ao de FIFA Ultimate Team com micro-transações, a estrela do jogo é mesmo o modo carreira. À semelhança de outros jogos de desporto, existe a possibilidade de criar uma personagem que tem como objectivo ascender na carreira, desde amador até campeão. A inclusão de atletas e filmagens reais da UFC, permite uma maior imersão na “nossa história” de lutadores. A criação de rivalidades com atletas reais e troca de “galhardetes” pelas redes sociais presentes neste jogo, recriam na perfeição o ambiente que circunda as lutas na “vida real”.
Mecanicamente existem decisões interessantes num jogo (e numa modalidade) que compreende diversas artes marciais distintas. Entre combates, podemos treinar em ginásios reais com atletas conhecidos e, aproveitando as suas especialidades de luta, aprender defesas e movimentos novos. A gestão que fazemos da vida do nosso atleta entre combates tem grande impacto na sua carreira, como o tipo de postura que temos nas redes sociais e o esforço dos treinos que podem melhorar a nossa forma física mas também levar-nos à exaustão.
Talvez a grande fraqueza do EA Sports 3 se prenda com o sistema de submissões e combate no chão, tão típico nas MMA e em especial nos atletas de jiu-jitsu. Se o combate “em pé”, que envolve murros e pontapés, é compreensível por muito complexo que se vá tornando, o sistema de submissões não é devidamente explicado pelo jogo e é demasiado difícil de se compreender por nós próprios. Podemos treinar em alguns ginásios de brazilian jiu-jitsu para conhecer melhor esta faceta, mas a luta no chão e as submissões parecem mecanicamente desequilibradas comparando com o restante jogo.
EA Sports UFC 3 é uma estrondosa surpresa. Depois de dois títulos medianos que serviam apenas de consumo para os fãs da modalidade, esta terceira iteração demonstrou uma maturação da série. Tudo neste jogo é realista e entusiasmante, e não é preciso muito tempo para percebermos a verosimilhança que existe entre o mundo, a modalidade e os atletas reais e esta contraparte digital. Apesar de os habituais jogos anuais de desporto serem só lançados perto do último trimestre do ano, é muito difícil que algum consiga bater este EA Sports UFC 3 como aquele que mais evoluiu, tornando-se a melhor adaptação de sempre desta modalidade.
Ricardo Correia, Rubber Chicken