Fechado o congresso, a eleição de Fernando Negrão para a bancada parlamentar do PSD na quinta-feira é mais um momento decisivo para a afirmação da liderança de Rui Rio. Com os deputados divididos e com o risco de haver muitos votos em branco, Pedro Santana Lopes — que tinha o apoio da maior parte da bancada — diz ao Observador que a unidade do grupo é fundamental para o partido: “Espero que o grupo parlamentar dê força suficiente a Fernando Negrão. Acho que vai ser candidato único e espero que o resultado corresponda ao espírito de unidade que julgo ter havido no congresso, mesmo pela parte de quem o disputou”.
O candidato derrotado nas diretas, mas que fundiu as suas listas com as de Rui Rio em sinal de unidade no congresso, não quer “estabelecer fasquias”, mas sublinha que será Negrão ” a bater-se contra António Costa e a frente de esquerda no Parlamento”:
Quero sublinhar esse apelo: espero que Fernando Negrão tenha uma votação expressiva”.
Sobre o tema mais polémico do pós-congresso, Pedro Santana Lopes não acredita que a inclusão de Elina Fraga — ex-bastonária dos advogados — no núcleo duro do líder altere as posições fundamentais do PSD em relação à justiça, sobretudo no que diz respeito à independência do Ministério Público: “Tenho a certeza de que Rui Rio não quer pôr em causa o acquis da evolução da Justiça Portuguesa nos últimos anos”. No seu primeiro discurso ao congresso, Rui Rio chegou a falar em “melhorar o escrutínio democrático” da justiça — o que poderia indiciar alguma perda de independência do Procurador-Geral da República (PGR), mas o líder não explicou. Rio também pediu mais “transparência” para o setor, embora não tenha especificado o que queria dizer. Este já tinha sido um tema da campanha interna, com Rio a recusar defender a atuação da PGR Joana Marques Vidal, e com Santana a fazer elogios.
Espero que não sejam questionados os resultados da ação do Ministério Público e dos resultados que tem tido”, acrescenta Santana ao Observador.
Quanto ao posicionamento face ao PS, Santana Lopes diz que “cabe ao Governo a iniciativa de apresentar as propostas”. O ex-adversário de Rio considera importantes acordos de regime como nas obras públicas, que não precisam de mexidas na constituição, mas coloca o ónus do outro lado da barricada: “Rio apresenta disponibilidade para dialogar, é natural que seja o Governo a dizer as propostas que tem prontas”.
Um caldo que não se entorna se Rio mantiver o que disse do Bloco Central
Para Santana, Rio não conseguiu desfazer as dúvidas no Congresso sobre um eventual apoio do PSD a um governo minoritário do PS no pós-legislativas de 2019. E se o novo líder do PSD estiver tentado a dar a mão a António Costa, aí tomará uma posição. “Se ele for ali ao dr. Costa e disser que vai para um governo do PS, temos o caldo entornado“, avisou o ex-presidente do partido em declarações ao Diário de Notícias. Ao Observador, justifica que “o caldo não se entornará porque Rui Rio já disse que não haverá Governo com o PS”.
O ex-provedor da Santa Casa da Misericórdia não retira a pressão, mesmo que vá dizendo que “não acredita” que Rui Rio esteja disposto a integrar um governo do PS. Pedro Santana Lopes considera positivo o facto de o novo líder do PSD estar disposto a procurar reformas estruturais com o PS, mas não esconde o ceticismo. “É genuíno ele querer fazer reformas e é nisso que insiste para os consensos de regime. Eu sou o mais cético que seja possível, mas se for acho magnífico“, notou ao DN.
Assumindo, mais uma vez, que não partilha o plano de Rio de aproximação aos socialistas, Santana mantém a fasquia para as próximas legislativas: as eleições são para ganhar e o PSD tem de estar à altura. “Estamos numa situação única de frente de esquerda e todas as decisões que o PSD tomar no próximo ano são delicadíssimas“, avisa.
No congresso de aclamação de Rui Rio, Pedro Santana Lopes subiu ao púlpito para apelar à “unidade”, à “convergência” e, sobretudo, ao “sentido de responsabilidade” dos sociais-democratas. O ex-primeiro-ministro foi mais longe e censurou todos aqueles que, mesmo depois das eleições internas, não largaram as trincheiras da conspiração e tentaram condicionar Rui Rio — Miguel Relvas e Miguel Pinto Luz, leia-se. Dos candidatos à sucessão do recém-eleito Rui Rio, só Luís Montenegro foi ao Congresso do PSD dizer realmente onde está e para onde quer ir. Ao DN, Santana não o julga, mas considera que o seu papel deve ser outro.
“Acho que é sempre uma janela para respirar. Montenegro fez o que já outros fizeram. Eu também já fiz, quem sou eu para julgar? [Neste momento] deve ajudar a juntar, mas salvaguardando sempre a legitimidade que defendi. Se foi difícil para Pedro Passos Coelho, e procurei ajudar, para Rui Rio também vai ser difícil ganhar as eleições, porque o PSD tem estado num processo de erosão eleitoral, a acreditarmos nas sondagens. Chamem-me senador ou o que quiserem, mas também combato como se viu por estas diretas. Só que sei distinguir os tempos“, explicou.
Quanto ao futuro, e fiel ao seu estilo “vou andar por aí”, Pedro Santana Lopes garantiu que tenciona “estar presente” e a “contribuir para o trabalho do partido” e não fecha a porta a uma eventual candidatura como cabeça de lista do PSD nas próximas eleições europeias, em maio de 2019 — numa altura em que se fala de um possível convite de Rio a Santana nesse sentido.
“É extemporâneo. É muito cedo mesmo para falar disso…“, diz. E acrescenta ao Observador que “se fosse líder nem estava a pensar nisso agora”. Resta saber o que pensará Paulo Rangel, eurodeputado e cabeça de lista do partido nas europeias de 2014, que pareceu aproveitar o Congresso do PSD para se retirar de eventual corrida à sucessão de Rio e para assumir a pole position para próximas europeias.
“A sombra só incomoda os fracos”, disse Montenegro a Rio (e outras cinco sombras do líder)